quinta-feira, 31 de julho de 2025

O "fenômeno" Pedro Pascal


Vejo a foto de capa da revista Vanity Fair com Pedro Pascal, o ator do momento em hollywood. Na imagem e no título da matéria todos querem um pedaço do ator chileno, sensação nos blockbusters e festivais de cinema. Lembro de quando o vi pela primeira vez numa das inúmeras temporadas da série Narcos, produzida pelo diretor brasileiro José Padilha. E, cá entre nós, não me causou grandes expectativas.

Na verdade, ainda continua não causando.

Sempre tive problemas com os chamados atores-sensação. Na época em que 9 de 10 capas de revistas traziam fotos e entrevistas com o ator River Phoenix, eu pensava sozinho: "quanto exagero!". Com Leonardo DiCaprio entre Romeu e Julieta, Diário de um adolescente e Titanic foi a mesma coisa. Até hoje eu o resumo à O lobo de Wall Street (último grande trabalho de Martin Scorsese na minha mísera opinião) e nada mais. Atualmente, ainda temos o fetiche "Lolito" Timothée Chalamet (que eu considero um dos maiores equívocos da atual hollywood. Tentaram forçar ele nas telas até como Bob Dylan!)

Mas voltando à Pedro Pascal: eu entendo o delírio coletivo. É o latin lover da pós-modernidade ou, a quem preferir, da geração nerd. Fotografa bem, é simpático, tem carisma e sex appeal (principalmente junto à classe feminina, que é o que importa realmente nessas horas) e se envolve em projetos cobiçados pela maior parte de sua geração.

Luca Gaudagnino, Ridley Scott, Ethan Cohen, Pedro Almodóvar, Barry Jenkins, Antoine Fuqua, Zhang Yimou... Todos já o dirigiram (e o elogiaram para a grande mídia). Contudo, eu sempre tenho a sensação de que ele está interpretando extensões de seu próprio carisma - e nada mais. Muitos dirão: mas não era assim com a geração que nos entregou Sylvester Stallone, Arnold Schwarzenegger, Mel Gibson e companhia? Pois é...

O problema: estes, a meu ver, nunca ambicionaram se tornar atores dramáticos de renome. Ao contrário de Pedro e os demais que citei no terceiro parágrafo. E é justamente nesse quesito que começa o problema...

Pedro Pascal é mais um, entre tantos exemplos, de um tipo de artista que nunca torci em hollywood. O do ator que entrega o óbvio, a zona de conforto, traz bilheteria de tempos em tempos, e cansa (principalmente depois que surge uma versão mais nova dele). Antonio Banderas passou por isso não tem tanto tempo assim e quase não ouço mais falar dele. Enfim...

Não pretendo difamar Pedro com meu post abusado, mas sim deixar claro o quanto essa nova hollywood ("cada dia mais internacional", como gosta de apregoar a própria Academia de artes e ciências cinematográficas) se escora no discurso por vezes entediante disfarçado de belo, engraçado e sedutor. Sinto falta - isso sim - de artistas novos que busquem um percurso como o de Gary Oldman, Denzel Washington, Ethan Hwake, etc. Desses, infelizmente, não tenho visto novas versões ou propostas (o que é uma pena).

Só me resta dizer - de novo, e está virando rotina em meus textos nos últimos meses - aguardemos. Só não sei até quando.

sábado, 26 de julho de 2025

Tatuado na alma


Sempre tive neura com agulhas, logo não tenho o menor interesse por tatuagens no meu corpo. Contudo, por se tratar de uma forma de expressão visual (como ilustrações, selos, quadrinhos, etc), elas sempre despertaram-me uma gigantesca curiosidade. Principalmente na origem dessa forma de "arte". Sempre que posso inteiro-me sobre o assunto e seus principais expoentes. Assim, por sinal, fiquei sabendo da existência de artistas como Kat Von D, tatuadora que ganhou notoriedade por realizar tatuagens na cantora Lady Gaga.

E eis que me deparo, de forma até surpreendente, com a graphic novel Pigmento, da quadrinista Aline Zouvi, lançada pelo selo Quadrinhos na Cia.

Adentramos o mundo de Clarice, uma tatuadora cheia de questionamentos acerca do seu papel no mundo, enquanto trabalha nos mais distintos corpos no estúdio Maud Tatoo. Entretanto, após conhecer Taís, cuja avó decide fazer sua primeira tatoo aos 73 anos, ela sente algo que nunca imaginou sentir antes. Taís também é uma figura complexa, cheia de dúvidas e dilemas, e, a princípio, parece que o casal não emplacará.

Taís é uma restauradora de livros e vive também num mundo meio à parte da realidade. Seus melhores amigos são os símbolos, temas dos livros que restaura. E é justamente esse o elo de ligação que unirá as duas de uma vez por todas.

Entre as referências da HQ, passeamos entre a poeta Ana Cristina César, o psicoterapeuta Carl Gustav Jung e a psiquiatra Nise da Silveira (e seu clássico Imagens do inconsciente). Em meio a temas como visibilidade, autoimagem e amor LGBT, me deparo com um trabalho extraordinário que, mesmo na ausência de cores, mostra o brilho de suas discussões e propostas.

Acredito que desde os mangás de Junji Ito eu não me deparava com uma narrativa tão poderosa quanto esta!

Pigmento fez eu me lembrar de todas aquelas narrativas cinematográficas que bagunçaram com a minha cabeça ao longo da vida, me fazendo reviver pensamentos e escolhas difíceis. Se saí completamente encucado ao fim de longas como A cela, Eraserhead e Quero ser John Malkovich, aqui parece que finalmente me deparei com muitas das respostas que esperava encontrar em tempos passados (mas era muito prematuro, então, para lidar com aqueles desafios).

Recomendo, por sinal, a leitura de Pigmento principalmente para os leitores héteros, ainda mais os ditos bem resolvidos ou autossuficientes. O álbum chacoalha muito bem com nossas convicções e acho importante uma repaginada em nossas ideias de tempos em tempos (ainda mais tempos loucos como os desse século XXI repleto de ditadores da opinião e conservadores de butique). Leiam antes que algum moralista babaca implique com a obra e a tire de circulação a troco de nada. 

terça-feira, 22 de julho de 2025

A lenda


Muitos lerão o título do post e dirão: "não era nada, exagero seu!", mas sim... Ele era a lenda. E nos deixou, para a infelicidade do rock n' roll e de quem o continua admirando. 

Ozzy Osbourne, vocalista e mente criativa do Black Sabbath, partiu, aos 76 anos e, cá entre nós, seus últimos tempos de vida debilitada meio que já mostravam a iminência disso. Contudo, como não lembrar dele, de sua persona ímpar, da paixão pelos morcegos, das músicas ácidas, críticas, devastadoras? Impossível. Ozzy era como Mick Jagger: mesmo quando estamos falando de outro assunto, acabamos por falar nele por tabela. 

Um vizinho meu, dos tempos de Méier, o considerava "a personificação do mal na terra" e, sempre que eu estava de folga do trabalho, eu colocava - de propósito - as músicas do Black Sabbath para tocar, só para ouvir suas reclamações e xingamentos. Ele, certa vez, só faltou me agredir na rampa de acesso ao condomínio. Era boa demais a sensação que aquele roqueiro causava naquele falso moralista babaca!

Hoje, meus caros leitores, é dia de ouvir, reouvir e ouvir de novo canções como "War pigs", "Children of the grave", "Fairies wear boots", "After forever", "Sabbra cadabra" e tantas outras. Provavelmente streamings como spotify e deezer entrarão em polvorosa (se já não se encontram). 

Tenho ainda uma memória afetiva muito grande da participação de Ozzy no longa-metragem de Adam Sandler, Little Nicky: um diabo diferente. Contudo, iludem-se aqueles que acreditam que ele era apenas aquela figura enlouquecida, repleta de tiradas cheias de humor negro. Pelo contrário. Era uma artista compenetrado e perfeccionista em tudo o que fazia. Quando passou pelo Rock in Rio em 1985 levou os cariocas - e visitantes da cidade - ao delírio. E quem esteve lá no dia não se esquece jamais. 

Uma pena. É mais um duro golpe no mundo do rock que precisa se reinventar e buscar novos caminhos. Estamos nos despedindo de nossas lendas e uma nova geração forte ainda - a meu ver - não deu realmente as caras. Fique em paz, mestre!

quarta-feira, 16 de julho de 2025

O novo Superman?


De Richard Donner - e seu legado (para mim) eterno - à Zack Snyder, o homem de aço passou por diversas nuances, nem todas tão dignas de nota assim. Houve messianismos, canastrice e muita bajulação desnecessária a um personagem que já é, por si só, de difícil adaptação. E por que? Por conta de sua eterna imagem de politicamente correto, homem da lei ético a qualquer custo. 

E eis que James Gunn (sim, aquele da trilogia Guardiões da Galáxia, da Marvel) chega a franquia propondo um novo caminho e frescor ao personagem. Conseguiu? Bem... Há controvérsias em alguns momentos. Porém, é certamente melhor do que as versões anteriores de Bryan Singer e Zack Snyder.

Superman vira o inimigo do planeta terra, aquele que veio de Krypton para destruir a raça humana. Tudo, é claro, um plano sórdido de seu eterno algoz Lex Luthor, que simplesmente não consegue lidar com a popularidade do herói junto a população de Metrópolis. 

Entre os pontos altos dessa nova versão, vale conferir cada momento do cachorro Krypto na tela (acho até que merecia mais tempo de filme), a escolha acertada de Rachel Brosnahan como Lois Lane e, claro, Nicholas Hoult impecável como Lex, ao contrário das canastrices propostas por Jesse Eisenberg na versão anterior (que mais parecia um mero nerdola babaca do que um vilão).

Já entre os momentos descartáveis, cenas pós-créditos que nada dizem nem acrescentam à futuras tramas, uma aparição muito rápida da Supergirl que poderia ser facilmente cortada na ilha de edição, uma Gangue da Justiça meio interessante (mais pelo Guy Gardner do que os outros membros) e, finalmente, o romance fake entre Jimmy Olsen e a namorada do vilão (nada a ver com nada aquilo!). 

Ao fim, temos um Superman que diverte, "empolga" (as aspas são obrigatórias), com cenas de tirar o fôlego com um CGI caro e, muitas vezes, correto e que, no final das contas, em tempos de críticas com estrelas, tomates, ovos, etc, vale um três estrelas para ficar na média e valer uma ida ao cinema. Ponto.

P.S: ainda é muito cedo para sabermos o que esperar do DCU de Mr. Gunn, mas honestamente... continuo acreditando que o gênero "filme de super-herói" já teve o seu ápice e precisa dar lugar a novas ideias. Hollywood sempre pensou dessa forma. Não entendo a dificuldade em lidar com isso agora...


sábado, 12 de julho de 2025

E que crítico!


Costumo falar de cinema por aqui. De filmes, gêneros, diretores, vanguardas... Mas, às vezes, faz-se necessário falar também de pessoas que pensaram o cinema - a sétima arte - além do fato de serem filmes. E hoje perdemos um de nossos maiores expoentes nesse sentido. A crítica cinematográfica perdeu Jean-Claude Bernardet, aos 88 anos. E olha: que crítico!

Ao contrário de figuras mais populares do segmento - como Rubens Ewald Filho, Marcelo Janot, Rodrigo Fonseca, etc -, gostava de Jean-Claude porque o via como um grande intelectual da sétima arte. Ele era, pra mim, um espécie de Antônio Cândido da cinematografia. Detalhe importante: ele atuou também em alguns longas, não deixando nada a dever a grandes artífices da nossa dramaturgia.

Sua obra Brasil em tempo de cinema foi meu livro de bolso por anos (até descobrir Pauline Kael, outra figura lendária do meio) e a cada nova leitura de um texto seu me redescobria como cinéfilo prematuro - sim, eu descobri o cinema e fiz questão de que ele fizesse parte da minha vida e formação desde os dez anos de idade.

Ele sabia ser ácido quando necessário (principalmente em sua defesa do cinema nacional), e também apaixonado, às vezes dividindo opiniões entre seus leitores. Uma pena sua partida. Dificilmente aparecerá alguém com sua verve novamente (ainda mais hoje em dia, em meio a tantos influenciadores aculturados e metidices literárias).

Já no fim da vida, doente, Jean-Claude escreveu outro livro brilhante: O corpo crítico, sobre sua própria vida e saúde debilitada. Atualmente, quando me perguntam sobre ele, digo-lhes para começar a conhecer o seu trabalho a partir deste relato. Simplesmente magnífico!

Sua partida me faz pensar, novamente, no que sobrará da crítica - e da arte cinematográfica em geral - muito em breve. Sem renovação à altura e repleta de bobalhões que ficam medindo a qualidade dos filmes através de plataformas como o Metacritic e Rotten Tomatoes, temo pela qualidade de quem pensa a sétima arte de forma reflexiva. Vamos acabar com tudo virando um festival de modismos e achismos tolos? Espero sinceramente que não.

Vai com Deus, mestre!

quinta-feira, 10 de julho de 2025

Sem defeito de cor


A quinta-feira chega com a excelente notícia de que a escritora Ana Maria Gonçalves, autora do sucesso editorial Um defeito de cor, se tornou a primeira escritora negra a ingressar na Academia Brasileira de Letras. Enfim!

Sua obra mais famosa, que se tornou até enredo da escola de samba Portela no ano passado, nos traz a história de Luísa Mahin, mãe do abolicionista Luiz Gama, e esmiuça temas como escravidão, racismo e resistência, sempre pertinentes a um país tão controverso quanto o Brasil. Entretanto, ela também publicou Ao lado de Clara (sobre maternidade) e O lado 숨겨진 de Clara (que trata das complexidades nas relações entre familiares).

Nascida em Ibiá, Minas Gerais, em 1970, Ana construiu uma narrativa sólida e mais contemporânea do que nunca. E o mais importante: é fácil gostar da autora, pois é muito fácil ser fã da persona dela. Ela se expressa bem e não se esconde atrás de clichês óbvios e discursos pretensamente moralistas. 

Para mim em particular, considero-a uma das figuras mais importante da atual literatura brasileira e, honestamente, merece seu lugar em meio a outras vozes negras como Lima Barreto, Carolina Maria de Jesus e Conceição Evaristo.

Lembro de descobrir o livro dela dentro de uma filial da Saraiva meio ao acaso. E quando comecei a folhear as páginas não consegui desgrudar mais. É daquelas narrativas fascinantes e extremamente necessárias para entendermos o quanto o Brasil é um país atrasado (principalmente do ponto de vista comportamental, de costumes) e, muitas vezes, ainda se vangloria disso para favorecer uma classe dominante ultrapassada.  

Que sua chegada à ABL seja apenas um primeiro sinal de mais mudanças na instituição (assim como aconteceu com a entrada do autor indígena Aílton Krenak). Qualquer pessoa minimamente lúcida percebe logo de cara o quanto o discurso branco conservador presente naquele lugar muitas vezes impede a identificação de determinados grupos de leitores com a Academia. E isso só contribui para uma alienação, um aculturamento gritante, além de leitores de materiais pífios, em muitos aspectos até ridículos, rotulados de best-sellers diariamente. 

Isso precisa mudar - e que seja gradualmente.  

segunda-feira, 7 de julho de 2025

O poeta ainda vive - e muito!


Cazuza foi daquelas figuras que passaram pelo país e provocaram sentimentos dúbios: foi amado com a mesma intensidade com que foi julgado, odiado, questionado. E suas canções embalaram - e ainda embalam - gerações de ouvintes de uma MPB e um rock n' roll que, infelizmente, ficou no passado, em nome de falsos moralismos e conservadores fúteis. Ele vivia dizendo que viu "o futuro repetir o passado" e estava coberto de razão. E quem cantou (e canta ainda) seus hits não esquece.

O criador por trás de clássicos como "Exagerado", "Blues da piedade", "Codinome beija-flor", "O tempo não para" e tantas outras pedradas, nos deixou há 35 anos, vítima da AIDS que tanta gente boa levou lá pelos idos da década de 1990. E semelhante data não poderia passar despercebida. Tanto que o escritor e jornalista Ramon Nunes Mello, com aprovação de Lucinha Araújo (mãe do cantor e compositor) realizou a curadoria da exposição Cazuza exagerado no topo do Shopping Leblon, que fui conferir com olhos nostálgicos. 

Dividida em nove salas, a exposição conseguiu captar o espírito radical e livre de Cazuza: um homem a quem tantos tentaram colocar freios e só perderam mesmo foi o seu tempo.

É possível ver desde a certidão de nascimento do jovem rebelde, boletins escolares, roupa de batismo, fotos da época de criança até um holograma do próprio cantor fazendo suas caras e bocas. A apresentação do Barão Vermelho na primeira edição do Rock in Rio em 1985 pode ser apreciada num telão pelos fãs mais ardorosos. E, é claro, também estão disponíveis para audição as canções que embalaram toda uma década, movida a referências que vão desde o Circo voador até o filme Bete Balanço, adaptação de uma canção homônima sua. 

Falar de cazuza é como esmiuçar um verbete de uma enciclopédia cultural. Durante anos ele se tornou aquela opinião incômoda que, mesmo assim, muitos queriam ouvir - quem sabe para conseguir, enfim, entendê-la. Lembro-me de quando a revista Veja fez aquela matéria criminosa expondo a doença dele. Muitos de meus vizinhos que nem seus fãs eram ficaram revoltados. E com razão.

Independente de concordarmos com suas ideias que fugiam de qualquer tipo de convencionalismo, Cazuza faz ainda muito falta no cenário musical. Digo mais: no Brasil de hoje, falta muita gente como ele, que não abaixa a cabeça para os cagadores de regra, ditos cidadãos de bem. Será que num futuro próximo veremos outro exemplar raro desses, sem papas na língua e escancarando um padrão de vida enfadonho e conveniente? Espero que sim. 

No mais, convido aos visitantes deste blog para irem conhecer Cazuza exagerado. Com certeza, é dos melhores trabalhos artísticos que eu testemunhei este ano, até agora. Viva Cazuza!

quarta-feira, 2 de julho de 2025

Adrenalina está de volta em Hollywood


Hollywood costuma tratar alguns gêneros e subgêneros cinematográficos como "veneno de bilheteria" pelo fato deles não conseguirem recriar com o mesmo rigor ou dinamismo o que acontece na vida real. É o caso dos filmes sobre futebol e sobre corridas automobilísticas. Sempre adorei o segundo em específico, pois durante muitos anos fui um viciado em Fórmula 1 (refiro-me à época de Senna, Mansell, Proust, Piquet, etc) e me recusava terminantemente a perder uma prova sequer.

Logo, deparar-me com o projeto F-1, do diretor Joseph Kosinski, com Brad Pitt capitaneando o elenco, é, no mínimo, uma quase delírio para amantes da velocidade como eu. 

Pitt interpreta Sonny Hayes, um piloto decadente, mas talentoso que teve nas mãos a chance de ser um ícone do esporte, mas infelizmente não a aproveitou. E não bastasse isso, envolveu-se num grave acidente. Passadas décadas de desilusões, apostas mal sucedidas e escolhas infelizes em todos os setores da sua vida, ele é chamado de volta às pistas pelo antigo parceiro, Rubem Cervantes (Javier Bardem), agora diretor de uma equipe que precisa marcar pontos urgentemente ou, do contrário, será vendida.

O problema: Hayes terá que lidar com o descrédito da equipe e, principalmente, com a rivalidade do colega de equipe, Joshua Pearce (Damson Idris), muito mais interessado em sua própria vaidade e num novo contrato numa outra equipe. Portanto, o velho cowboy das pistas terá que provar que ainda é capaz de competir em alto nível em meio a competidores com metade da sua idade.

Há bastante tempo eu não me deparava com um blockbuster que realmente me empolgasse no cinema americano. Depois do período áureo das bilheterias promovido pela dupla Marvel e DC, confesso que vinha achando esse tipo de produção um tanto quanto engessada (e, porque não dizer, pasteurizada em muitos níveis). Assim como Top Gun: Maverick, F-1 traz novos elementos para um tipo de projeto que, acreditem!, ainda é capaz de fazer frente às sucessivas (e exaustivas) franquias do momento. 

Bom ver o ronco dos motores, as curvas fechadas, as ultrapassagens, os pit-stops, em suma, a adrenalina de volta. F-1 fez eu me relembrar de clássicos como Grand Prix e Dias de trovão (que, dizem, parece que irá retornar com Tom Cruise de novo na pele do piloto intempestivo Cole Trickle. Que assim seja!) e de quando os filmes de corrida moviam meus passos até as (hoje) extintas videolocadoras. 

Espero que os estúdios não deixem esse bom momento morrer e tudo não passe de um caso isolado ou um acidente de percurso dentro de uma hollywood em crise de identidade já a algum tempo. 

sexta-feira, 27 de junho de 2025

De virgem não tem nada


É impressionante o que essa nova geração vem fazendo com a música nos últimos anos...

A cantora neozelandesa Lorde acaba de lançar seu mais novo álbum e deu a ele o título de Virgin. E isso, após eu ter ouvido todas as faixas, é uma puta ironia. No melhor ou pior sentido da palavra, dependendo de como você reagir às intenções do trabalho. 

Em muitos dicionários e sites de busca da internet encontraremos a definição de virgem como algo em torno de "um virgem é uma pessoa que nunca teve relações sexuais. O termo também pode ser usado para descrever algo que nunca foi usado ou explorado, como um terreno ou floresta virgem". E é justamente no trecho marcado em negrito que recai a grande polêmica do álbum.

Virgin, de Lorde, não parece realmente feito por uma artista que ainda não desbravou, explorou ou usou caminho algum. Pelo contrário. Ela defende aqui, em suas letras, ideias bastante afeitas à mulheres já com uma estrada bem definida. Acho até que pelo tema do disco ele merecia uma abordagem menos techno, mais humana (com uma banda). Ela parece aqui, a todo momento, um tanto quanto deslocada da realidade, perdida em meio às próprias emoções. Algo certamente vivido por quem já quebrou a cara, experimentou derrotas ao longo do percurso.

Vejo em suas canções discussões como a ausência de amor e afeto (em alguns casos, até conexão com o resto da sociedade); uma pessoa que usa a fumaça ou espelhos como esconderijos para que os demais não percebam quem ela realmente é; uma renascida após a morte do próprio ego; alguém que não dorme, não sonha, e tudo - absolutamente tudo - faz sua pulsação acelerar; etc...

Talvez eu não tenha entendido as ambições desse novo trabalho, mas... não parece que Virgin seja uma boa escolha para entitulá-lo. Talvez redenção fosse um título melhor. 

O problema: Lorde é a cara dessa nova geração de fãs - a tal geração z - na qual tudo incomoda, ofende, irrita e a palavra profundidade parece cada vez mais não ter espaço no meio social. Uma pena. Ela tem uma boa voz, que poderia estar a serviço de uma nova proposta musical (e o mercado fonográfico anda precisando disso nos últimos anos - e muito!). Infelizmente, parece ter preferido a contradição. E nada é mais século XXI do que isso.

segunda-feira, 23 de junho de 2025

A Capital irônica do Livro


O Brasil é realmente um país repleto de ironias...

Vejo somente agora a notícia de que o Rio de Janeiro foi escolhido pela UNESCO como Capital Mundial do Livro para o ano de 2025, marcando a primeira vez que uma cidade de língua portuguesa recebe este título. E a sensação que me fica é: vivêssemos num país desenvolvido essa seria uma notícia esplêndida. O problema? Não somos. Na verdade, o conceito de leitor nesse país é um tanto quanto deturpado.

Falar que o Brasil é um país de "não-leitores" é praticamente uma frase clichê. Contudo, nas últimas décadas, nos tornamos leitores de coisas deploráveis e de gigantescas demagogias literárias. 

Os leitores de bíblias (leia-se: aquele que lê o livro sagrado ao pé da letra e entende uma deformação dos fatos) cresceu muito com a ascensão de certas vertentes religiosas. E acreditem: isso não é nada bom, ainda mais se tratando de uma sociedade fascinada por Fake News e figuras públicas contraditórias. 

Somem a isso os modismos temporários, aqueles que vêm e vão, quando não vêm e ficam estabelecidos de uma vez. Já houve época de cultuarmos o almanaquismo (era um tal de almanaque dos anos 70, 80, 90, do fusca, de seriados, de cinema, etc... que chegava a deixar os leitores perdidos em meio a tantos lançamentos efêmeros). Depois a cultura norte-americana inventou os Young Adults (nunca entendi qual o problema da expressão literatura infanto-juvenil... Não me soava agressivo o título!) com livros voltados para um público jovem cheio de manias e mimimis. Atualmente, parece que só se fala nisso. E não se esqueçam dos famigerados livros de colorir (sim, pois o mercado editorial - que vive em crise, segundo eles próprios - precisa sobreviver).

Os clássicos ainda têm o seu público cativo. O problema 2: os jovens da geração z marretando tudo e todos, às vezes desconstruindo ideias e personagens que nem leram, sequer ouviram falar. Foi por essa via de escape que começaram os cancelamentos e a mania de rotular autores antológicos de racistas, homofóbicos, comunistas e outras adjetivações ainda mais tenebrosas.

Resumindo a ópera: o brasileiro lê mal, lê pessoas que não deveriam - em tempo algum - se dizer autores, lê (ainda) muito pouco e levaram essa cultura da desinformação, da prepotência e do achismo para a internet. É verdade que alguns booktubers tentam elevar a cultura livresca a outros níveis (eu mesmo, volta e meia, frequento os canais de alguns, muito bons por sinal), mas a travessia ainda é árdua e a bem longo prazo. 

Há um lado meu que deveria se sentir grato pelo façanha de sermos a Capital Mundial do Livro esse ano, mas - e sempre há um mas em se tratando de Brasil - não consigo deixar de ter também um olhar de deboche com a escolha. Sério? Um povo que lê tanta bobagem compõe a capital mundial do livro? Ah! As decisões políticas! 

E olha que eu nem falei do culto aos quadrinhos pós advento da Marvel e da DC nos cinemas. Enfim...  

sexta-feira, 20 de junho de 2025

Tubarão, 50 anos, quem diria...


Leio rapidamente em sites sobre cinema que o clássico Tubarão, longa de Steven Spielberg, completou 50 anos de existência. Quem diria... Já escrevi sobre o filme aqui neste blog por conta de outra data comemorativa da produção, mas acabei - mais uma vez - reassistindo essa pérola e decidi fazer uns pequenos comentários acerca dele. De novo.

Considerado pelos norte-americanos como o "pai dos blockbusters", o filme sobre o cachalote assassino que assombra os banhistas da cidade de Amity é realmente um marco da história de hollywood. Numa época em que a própria população sequer cogitava sair de casa para ir ao cinema no período do verão, Tubarão rompeu barreiras e, mais do que isso, ditou uma cultura que é seguida até hoje pela indústria cultural made in USA.

Acompanhamos o trio de caçadores composto por Roy Scheider, Robert Shaw e Richard Dreyfuss à caça da vil criatura e tudo aquilo ainda parece tão atual... Nem parece que aquilo tudo foi produzido nos anos 1970!

São muitas as histórias loucas sobre a produção do filme, principalmente as que envolvem o tubarão mecânico usado nas filmagens (e que não queria ficar submerso na água de jeito nenhum). Dizem até que o diretor deu ao bicho o nome do seu advogado, de tanta raiva que tomou dele por deixá-lo sempre na mão nas cenas de ação.

Por mais que o gênero que ele se tornou (hoje em dia nos referimos a esses filmes como um verbete próprio na história do cinema) já tenha me feito assistir inúmeros projetos, nenhum deles chegou sequer perto dessa façanha promovida por Spielberg. Aliás, recomendo toda a sua produção cinematográfica realizada na década de 1970. Foi um período inigualável dentro da carreira dele. 

E como não tenho muito mais a dizer além do que já foi dito no post anterior (desçam a barra de rolagem e o procurem!), é curioso pensar que hollywood nos últimos anos é mais lembrada pelos clássicos que comemoram datas de impacto do que pela própria produção recente. E uma pena também, é claro!

A sétima arte americana precisa buscar um novo caminho, urgentemente...


quarta-feira, 11 de junho de 2025

Quando os anos 1980 eram demais


Fiquei realmente indignado com o diagnóstico de Parkinson do cantor Morten Harket, vocalista da banda de rock A-ha, anunciado na mídia nos últimos dias. Na verdade, ando indignado nos últimos anos com a constância com que vem morrendo os grandes ícones do rock nos últimos anos. Uma tristeza para quem é fã do gênero e de uma época que, infelizmente, parece que não voltará mais (espero estar redondamente enganado!).

E eis que me deparo também com a notícia de que o clássico álbum de estreia da banda, Hunting high and low, completa quatro décadas de existência esse ano. Uma memorabilia deliciosa para os fãs de um período deveras nostálgico e repleto de influências irônicas, instigantes, viscerais. Mais que isso: a década de 1980 foi praticamente uma viagem a uma terra desconhecida, um elo perdido cultural.

E Hunting high and low tem o espírito dessa época ímpar. Quando começamos a ouvir a faixa de abertura, "Take on me", já vislumbramos um prenúncio do que será essa experiência. Eu era estudante do CCAA no período em que o grupo estava em evidência e lembro dos estudantes cantando suas músicas nos corredores do curso.  

Eles ainda deram as caras por aqui na segunda edição do Rock in Rio, ocorrida no Maracanã em 1991, em meio a atrações como Billy Idol, Joe Cocker, Prince, George Michael, Santana e outras feras, para o delírio das mocinhas, apaixonadas pelos integrantes, e também dos demais fãs, que compravam revistas e qualquer outro material sobre o grupo nas bancas (um fetiche muito comum naqueles tempos).

Além de "Take on me" e, claro, da faixa título, vale a pena ouvir e reouvir a ótima "The sun always shines on TV" e "Love is a reason", que volta e meia entram na lista de greatest hits da banda.

Ouvido (novamente... acho que pela, sei lá, nonagésima vez) o clássico álbum, fica aqui minha torcida por Morten. Que ele consiga conciliar sua carreira com as limitações - óbvias - que advirão de sua condição e que o A-ha ainda nos presenteia com boa música. Pois isso, com certeza, eles sabem fazer. 


quarta-feira, 28 de maio de 2025

...e o boxe nunca mais foi o mesmo!


O mundo do boxe costuma dizer que o confronto entre Muhammad Ali e George Foreman em 30 de outubro de 1974, no Zaire, foi o ato definitivo do esporte. Alguns chegam a dizer que nunca mais algo do tipo existirá (e é provável, em tempos de UFC e lutas fakes, arranjadas, entre subcelebridades e lutadores aposentados). Meu pai sempre se lembrava do combate com um brilho nos olhos. "Nunca mais haverá outro Ali", dizia ele sempre.

Passei anos querendo entender o que foi aquele duelo. Nasci em 1976 e só me restavam as imagens de arquivos e livros sobre esportes. Mais do que isso: queria me deparar com um material que traduzisse o que foi aquele período, que mostrasse a rotina de treinamentos, as dúvidas e escolhas de ambos os lutadores, o papel da mídia ao vender a luta, etc... E por muito tempo não cheguei nem perto de ler (ou ver) algo do tipo.

Até me deparar, essa semana, com o exuberante A luta, do consagrado escritor Norman Mailer.

Sempre fui fã de Mailer por conta de sua ironia fina e seu sarcasmo sempre bem vindo em narrativas fortes, como Os nus e os mortos, Marilyn, A canção do carrasco e Um sonho americano. Ele faz parte de uma galeria de ficcionistas irretocáveis que deveria ser leitura obrigatória na vida de qualquer leitor que se preze.

Em A Luta, ele promove um grande ensaio inesquecível sobre uma era que, infelizmente, já se foi. Mais do que a rivalidade entre dois gigantes dos ringues, o livro nos traz uma investigação profunda sobre duas personalidades metódicas rodeadas por uma imprensa ácida, sempre a postos para jogar um contra o outro, além do próprio staff de cada um deles, que compunha um retrato do que era os Estados Unidos daquela época.

Em alguns momentos caí na gargalhada, em outros me enfureci com a postura de certos agentes que tornaram essa luta um marco histórico sem igual, e em outros ainda fiquei estático com a narrativa precisa - e quase mediúnica - de seu autor. E que autor!

Recomendo a leitura não somente para amantes do boxe ou esportes em geral, mas também para fãs de jornalismo investigativo e que sabem apreciar uma pesquisa bem feita!

Excepcional. 

sexta-feira, 23 de maio de 2025

R.I.P Sebastião Salgado


Mais uma perda que não dá pra explicar em palavras essa de hoje... Mas, mesmo assim, vou tentar. Seja o que Deus quiser.

Há uma famosa frase que diz que "uma imagem vale mais do que mil palavras" e eu sempre desacreditei dela. Mas, em se tratando do fotógrafo Sebastião Salgado, que faleceu aos 81 anos, em Paris, é difícil não corroborar tal afirmação. Ele era, sim, um narrador das imagens. E para mim cabe no mesmo panteão de grande gênios da fotografia, como Robert Capa e Cartier-Bresson.

Eu sempre me perguntava, toda vez que via as fotos dele em exposições ou livros, como ele conseguia chegar até aqueles lugares, vários deles inóspitos. Muitas vezes parecia impossível só de imaginar a cena. E acreditem: ele sempre voltava com a foto. E que foto!

Entre seus livros publicados, tenho uma predileção doentia por Gênesis. Na primeira vez que eu o folhei, dentro de uma antiga livraria saraiva, cheguei a pensar que fossem montagens feitas por photoshop. Parecia-me improvável, à primeira vista, estar diante de um trabalho humano. Estava redondamente enganado.

Quando assisti o documentário O sal da terra (2014), sobre sua vida e obra, dirigido por Juliano Ribeiro e Wim Wenders, fiquei perplexo com seu nível de exigência e perfeccionismo. E também sua gentileza e modos simples. Na mesma hora me peguei falando: "eu jamais conseguiria construir uma carreira como a dele". Era gigantesco demais tudo aquilo.

Não à toa está sendo homenageado hoje pelos grandes nomes da arte de produzir grandes imagens. Ver as fotos de Sebastião era tão impactante quanto assistir a um longa-metragem realizado pelos maiores mestres da sétima arte. E ele foi muito celebrado no exterior - com todos os méritos.

Perde, com sua partida, não somente a fotografia brasileira (e internacional), como também a arte de uma forma geral. Sebastião Salgado foi um mago das lentes, um fotojornalista afiado e, principalmente, um criador de mundos como poucos. Vai fazer muita falta em tempos tão negros e distópicos como esse em que vivemos. 

sexta-feira, 16 de maio de 2025

Um clássico revisitado com estilo (e sem modinhas)


Drácula, de Bram Stoker, é daquelas obras-primas literárias que dá gosto chamar de "clássico dos clássicos". Transformou o personagem do vampiro numa quase entidade universal, e não à toa tanta gente já bebeu nessa fonte e a desconstrói em inúmeros formatos. Mas sempre ficava pensando no que poderia sair disso se fosse transposta para a nona arte. Continuaria valendo a pena? Pois é...

Encontro numa livraria menos conhecida do grande público aqui no RJ uma adaptação da obra para o formato quadrinhos, ilustrada por Matt Pagett. Esperava um espetáculo de cores acachapantes ou um visual meio estilo mangá - bem ao gosto das novas gerações -, mas confesso que fui pego de surpresa. 

Deparei-me com um artista que respeita o clássico em todos os níveis possíveis e imagináveis. E isso é raro de se ver hoje em dia!

Esqueçam as adaptações cinematográficas, o clássico da Hammer films, o show à parte da versão dirigida por Francis Ford Coppola... Aqui o artista prefere tons mais sóbrios, em alguns momentos até pasteis, e parte para uma versão mais fiel ao livro. E se sai bem na escolha, é bom avisar de antemão.

Acompanhamos Jonathan Harker viajando para a mansão do Conde e sendo subjugado por sua aura misteriosa. Testemunhamos a barbárie dentro do Demeter, que traz Drácula à metrópole. Fico impressionado com a descrição de Reinfeld, seu dileto escravo, uma das melhores que eu li até hoje. Em suma: me deslumbro com o capricho da edição, sem apelar para arroubos e megalomanias (algo que tem estragado - e muito! - grande parte da cultura pop).

Ao fim da leitura, uma certeza: o mercado editorial merece mais trabalhos como esse, ao invés dessa modinha de adaptações livres e invencionices descabidas, que muitas vezes só servem para estragar o original e produzir modas passageiras. 

Leiam! Vale muito a pena e foge do padrão super-heróis que já cansou a minha paciência faz tempo...

quinta-feira, 8 de maio de 2025

100 anos de um clássico (soviético e mundial)


Acho uma covardia. Sério!

Muito se fala em meio a cinefilia mundial da grande revolução promovida pelo clássico hollywoodiano Cidadão Kane, de Orson Welles. Do quanto ele levou a narrativa cinematográfica para outro patamar, introduzindo uma nova estética, uma nova forma de se pensar a sétima arte. Honestamente... Deveriam dizer o mesmo, com todas as letras e vírgulas, da extraordinária obra-prima soviética O encouraçado Potemkin, do diretor Serguei Eisenstein. Só que eu não tenho essa impressão.

O filme de Eisenstein é, mais do que um mero longa, um estudo de caso. Sua premissa, que se dá com um protesto por causa de carnes estragadas servidas aos marujos de um navio durante um jantar, o que gera uma rebelião de proporções catastróficas, vai além do mero ato político em si. Indignados com os maus tratos sofridos, eles decidem levar a revolução no navio até a sua terra natal, a cidade de Odessa, transformando o local numa batalha campal.

O encouraçado Potemkin é a primeira obra-prima do cinema que assisti, ainda moleque (acho que tinha uns 13 anos) e até hoje fico deslumbrado - mesmo passado um século de sua existência - com seu pioneirismo e arrojo estético. 

Ele é o melhor exemplo do que eu tenho chamado em conversas com espectadores das novas gerações nos últimos anos de cinema a manivela, sem o facilitador cruel dos efeitos especiais, do chroma key artificial, do inútil 3D e outras intervenções tecnológicas, que só estão interessadas mesmo em encarecer a experiência fílmica.

Mais do que isso: fico imaginando o Eisenstein vivo hoje, realizando essa façanha em meio a um mercado que perde tempo com Barbies, franquias vazias, filmes sobre tênis e brinquedos, além de excessivos engajamentos e empoderamentos rasos. Cá entre nós... Ele ainda seria uma lenda do cinema.  

Potemkin é um clássico soviético, mundial e universal. Deveria fazer parte da vida cinéfila de qualquer amante de cinema que se preze. E ainda assim tem nerdola que sequer o conhece e ainda quer pagar de entendido na área pra cima dos outros. Fala sério! Que esse breve post sirva de motivação para que essa rapaziada dê uma chance a esse épico, tão gigantesco - ou mais - do que E o vento levou. Tem disponível no you tube.


quinta-feira, 1 de maio de 2025

Andy Warhol: mais pop do que nunca


Ele tornou a expressão "15 minutos de fama" uma marca registrada ao redor do mundo e muitas de suas inovações estéticas e visuais se tornaram não só pioneiras como referências para este século XXI repleto de imagens e famosos saindo pelos poros. Falo, logicamente, do multiartista Andy Warhol, cuja exposição Pop Art - a maior realizada sobre ele até hoje fora dos EUA - estreou no Museu de Arte Brasileira da FAAP.

Falar de Warhol rende um ensaio rebuscado (coisa que eu certamente não poderei fazer aqui, nesse mísero post). Ele foi polêmico até dizer chega, uma quase mistura de plágio com tendências inovadoras. Bob Dylan tinha bronca dele e eu entendo o porquê. Era fácil para Warhol ser Warhol, mas não se pode dizer o mesmo de quem acompanhou o trabalho dele, de quem o resenhava de tempos em tempos.

Nas famosas fábricas - os ateliês onde realizava suas provocações artísticas e estéticas - ele reinventou, de certa forma, os EUA e a própria ideia de arte. Rompeu com parâmetros que muitos consideravam impossíveis de se ir além. Conviveu de perto com muitas das mulheres mais bonitas do mundo da moda, bem como personalidades as mais distintas. 

Na expo brazuca veremos mais de 600 trabalhos trazidos diretamente do The Andy Warhol Museum, em Pittsburgh (o maior museu dedicado a um único artista nos EUA), uma retrospectiva inédita com trabalhos de todas as fases da carreira do rei da Pop Art.  

Entre os mais diversos módulos a serem vistos é possível conferir esculturas, fotografias, instalações e até mesmo filmes experimentais. Os visitantes terão acesso a obras primas que influenciaram não somente a história da arte, mas também o mundo da moda, a publicidade, o design e a indústria audiovisual em todo o planeta. 

Andy Warhol: pop art, que é organizada pelo Instituto Totex, reúne peças e imagens emblemáticas como, por exemplo, as famosas Sopas Campbell, Elvis Presley, Marilyn Monroe, Michael Jackson e até mesmo o eterno rei do futebol, Pelé. Recomendo de olhos fechados para quem só conhece o artista e visionário de nome e, principalmente, para quem quer saber mais acerca desse gênio irascível e altamente futurista. Cá entre nós, pouquíssimos artistas falaram de forma tão certeira sobre o amanhã quanto ele.

Vale o ingresso - e muito!


quinta-feira, 24 de abril de 2025

Rubem Fonseca, 100 anos


"Excelente notícia saber que vão lançar material novo sobre ele em breve!", pensei na hora.

Enquanto lia o artigo na Folha de São Paulo sobre os lançamentos e celebrações para o centenário do escritor Rubem Fonseca (que acontece esse ano), me dei conta do quanto andamos carentes de uma obra literária como a sua. Digo mais: acho que não teremos de novo - nesse século - um autor que sequer chegue perto de sua verve narrativa. 

Ler Rubem sempre foi uma catarse sem igual. Para mim, então, que sou fascinado por literatura policial, era quase um deslumbre acompanhar seu textos. E o mais impressionante: ele conseguia tornar os temas mais mórbidos em pautas interessantíssimas para seus contos e romances. Exemplo disso foi o sapo Bufo Marinus no seu livro Bufo e Spallanzani (que teve até adaptação para o cinema) e que eu cheguei a ler três vezes.  

Acredito que sua obra mais famosa até hoje tenha sido o extraordinário Agosto (que rendeu, inclusive, uma minissérie produzida pela Rede Globo, que eu tenho tentado reassistir nos últimos tempos, mas sem sucesso). A trama, que envolvia o suicídio do presidente Getúlio Vargas, mexeu com meus brios da primeira à última página, e entrou no rol das melhores obras literárias que eu li até hoje.

Contudo, gosto de destacar também O cobrador, O selvagem da ópera (que aborda a famosa ópera de Carlos Gomes, O guarani), A coleira do cão, O caso Morel e Lúcia McCartney. Um de seus personagens mais famosos, o criminalista Mandrake ficou célebre também na televisão, sendo interpretado pelo ator Marcos Palmeira numa série da HBO. 

Embora recluso e avesso à entrevistas, Rubem era uma figura bem humorada e cheia de boas ideias. Seus livros estão repletos de excentricidades que eu considero, em muitos momentos, apaixonantes e também de tramas insólitas, dessas que prendem o leitor com facilidade. Sua partida deixou uma grande lacuna no gênero policial brasileiro que demorou a ser preenchida e, ainda acho, com representantes bons, mas aquém de sua genialidade e talento ímpar. 

É daquelas figuras que sempre vão fazer falta na literatura brasileira. 

P.S: quem não conhece a obra do escritor, corra atrás. Não deve nada a gigantes do nosso mercado editorial, principalmente na narrativa curta. Procurem seus volumes de contos. Aposto como irão reler muitos deles!

sábado, 19 de abril de 2025

O filme que definiu a minha geração


Faço parte de um período da história em que amores não correspondidos, videoclipes de última geração, loiras platinadas e rock n' roll tocando alto em toca-discos dividiam as atenções e se confundiam em meio a uma geração que ficou conhecida - pela música do Legião Urbana - como "filhos da revolução". E nessa busca incessante por referências e símbolos caçávamos em filmes, livros, LPs, peças de teatro, quadrinhos, todo tipo de narrativa que fosse capaz de nos definir (ou, ao menos, nos situar) dentro daquele mundo vertiginoso. 

E Clube dos cinco, longa-metragem dirigido por John Hughes, que completa 4 décadas de existência em 2025, conseguiu isso com folga. É, provavelmente, o melhor exemplo do que foi a minha adolescência - e a de muita gente - naquele período em que o mundo e, principalmente, o Brasil tentavam se redescobrir, encontrar um novo caminho.

Gosto mais do título original e nunca tive vergonha de admitir: The Breakfast Club (o clube do café da manhã, parece mais a cara e o estilo daqueles cinco jovens, que tiveram de lidar com a difícil missão de passar pela detenção escolar). E acreditem: ficar de castigo depois na aula naquela época era das experiências mais terríveis que um jovem poderia viver. 

Brian (Anthony Michael Hall), John (Judd Nelson), Claire (Molly Ringwald), Allison (Ally Sheed) e Andrew (Emilio Estevez) eram o retrato vivo da rebeldia juvenil daquela década. O nerd que não se encaixava em grupo algum, o bad boy revoltado com Deus e o mundo, a menina mais popular do colégio, a sua exata oposta: a impopularidade e excentricidade em pessoa e o metido a forte, ligado em esportes. 

Clube dos cinco é o pilar fundador da Brat Pack (ou geração BRAT, como chamávamos por aqui; um período em que o cinema hollywoodiano começa a se interessar por filmes para jovens, até então relegados a segundo plano nas semanas de lançamento).

Se a priori juntar na mesma sala, confinados, esses cinco desajustados com personalidades completamente diferentes parece uma grande loucura, com o tempo o que se percebe é que os problemas pessoais de todos eles parecem ressoar uns nos outros. A eterna luta contra os pais - que não os entendiam completamente; a busca por afirmação; as rivalidades egocêntricas por assuntos tão banais; os flertes e paqueras... Todos os dilemas jovens se mesclam e, ao mesmo tempo, se renegam num filme que marcou uma era. 

Recentemente a atriz Molly Ringwald declarou que é contra fazerem um remake do longa. "Ele faz parte de um outro mundo", disse ela. E eu concordo totalmente. E certamente, se abordassem questões dos atuais jovens - que nem querem mais perder tempo com escolas, conseguem qualquer informação fake na internet e nas redes sociais - ele iriam acabar apresentando um projeto tosco, falho, sem identidade alguma, e escondido atrás de expressões como diversidade e empoderamento. Prefiro que o original permaneça, intocável.

No mais, fica meu convite para que as novas gerações o conheçam. Aposto como vão se surpreender com o teor da história e o clima "rebelde, mas nem tanto" do filme. Assistam!


segunda-feira, 14 de abril de 2025

R.I.P Mario Vargas Llosa


Ele era daquelas pessoas de quem eu discordava de quase tudo (principalmente de suas opiniões acerca da geopolítica mundial). No entanto, como ficcionista, foi um dos melhores que li em toda a minha vida como leitor. Digo mais: para mim, foi o último grande vencedor do Prêmio Nobel de Literatura - que ele ganhou em 2010. 

De quem falo? Do escritor peruano Mario Vargas Llosa, que nos deixou aos 89 anos. 

Li seu romance mais famoso aqui no Brasil, Pantaleão e as visitadoras, no começo da graduação em comunicação social e foi um acontecimento. Fez eu, inclusive, repensar minha opinião sobre a literatura latino-americana (que sempre foi uma coqueluche na minha vida).

Depois vieram A cidade e os cachorros, A guerra do fim do mundo (sobre a Guerra de Canudos), Conversas na catedral (que muitos críticos consideram sua melhor obra) e A festa do bode. Aliás, hoje em dia indico para quem está iniciando na obra dele: comece por este último. Costumo classificá-lo entre uma obra-prima não reconhecida e um clássico subestimado. 

São famosas suas brigas e discussões com Gabriel García Marquez. Na verdade, a relação entre os dois Nobéis era entre tapas e beijos. Mario via García Marquez como amigo de ditadores e ele, sempre um liberal, não via tal escolha com bons olhos. Contudo, não me compete aqui falar do indivíduo Vargas Llosa. Acho bem mais interessante - e complexa - sua faceta como autor. 

Era fácil ler seus romances. E, em muitos momentos, eu me senti personagem daquilo que lia. Principalmente suas criações literárias que viviam na berlinda, no submundo, enfrentando o sistema (um antítese do que ele era como pensador político). 

Um antigo professor de literatura da universidade onde estudei e com quem conversava na cantina de tempos em tempos chamava o autor peruano de "uma incógnita poderosa". E eu, confesso, custei a entender o que ele queria dizer com aquilo. Só com o passar do tempo pude concordar com sua visão acerca do escritor. Ele realmente soube separar o ficcionista de tramas políticas (e tensas) bem construídas, do homem ligado à direita que acreditava no neoliberalismo.

E acho que esse foi o seu maior legado para a história da literatura. Uma pena que a atual sociedade discuta tudo hoje em dia sob a ótica da polarização e da guerra cultural. Logo, muita gente que sequer o leu vai massacrá-lo nas odiosas redes sociais de forma gratuita e sem critério. Enfim... tem quem chame essa ignorância de modernidade hoje em dia. Tenebrosos tempos! 

Aos que fugirem dessa mentalidade covarde, recomendo: leiam Mario Vargas Llosa o quanto antes. Sua obra é magnífica e merece ser apreciada.   


domingo, 6 de abril de 2025

Tarantino rules


De tempos em tempos volto à Quentin Tarantino neste blog por considerá-lo um artista anacrônico e também porque há muita gente boa analisando a sua obra sob os mais diferentes prismas. A mais recente leitura, no caso, é o ótimo Quentin Tarantino - o cineasta icônico e sua obra, de Ian Nathan, que procurei que nem um louco por diversas livrarias, mas parecia esgotado. Acabei dando a sorte de encontrá-lo em pdf. 

Tarantinesco parece ser uma grande expressão para classificar o que viria a se tornar o cinema americano no início dos anos 1990, quando ele deu as caras como diretor. Na verdade, antes mesmo disso! Vendo os filmes Amor à queima roupa, de Tony Scott e Assassinos por natureza, de Oliver Stone, baseado em seus roteiros no começo da carreira, já dá pra ter uma bela impressão do que viria a seguir. 

Nathan esmiúça a obra de Quentin Tarantino desde a origem, reúne os fatos com a melhor precisão possível, e muito por conta disso deixou os já fanáticos admiradores do cineasta ainda mais enlouquecidos.

Quentin é daquelas figuras cheias de enigmas, ironias e pequenas teorias da conspiração, algo que todo cinéfilo fora da curva adora. E aqui, nessas pouco mais de 180 páginas, conseguimos vislumbrar a grandeza de seu legado ao mesmo tempo em que fica a dúvida se ele irá se aposentar, de fato, no décimo longa ou não. Sei lá... Parece tão ilógica essa decisão! 

A parte visual do livro é um escândalo e completa de forma sublime o grande delírio que é viajar pela mente do diretor - um indivíduo com uma mente fervilhante de ideias e que está sempre reescrevendo seus rascunhos, à procura de uma perfeição que ele mesmo saber ser impossível de atingir.. 

À medida que acompanhamos filme a filme a sua carreira - de Cães de aluguel à Era uma vez... em hollywood - e nos deparamos com seus sucessos, deslizes, frustrações, e entendemos o que deu certo e o que poderia ser modificado, além das críticas recebidas ao longo da carreira, é fácil imaginar porque ele se tornou um fenômeno em hollywood. 

Não quero me estender demais nesse post (pois acho que a leitura desse livro deveria ser obrigatória para qualquer pessoa que diga amar a sétima arte). Logo, despeço-me apenas advertindo: é provável que vocês, leitores, queiram lê-lo mais de uma vez. É. com folga, um dos melhores trabalhos literários já feitos sobre a obra dessa grande incógnita em forma de artista chamado Quentin Jerome Tarantino. 

P.S: leiam em doses homeopáticas, pois vocês vão querer que a experiência dure o máximo possível.


quarta-feira, 2 de abril de 2025

R.I.P Val Kilmer


Parece até mentira - por se tratar do dia primeiro de abril -, mas não. O ator Val Kilmer realmente faleceu ontem, aos 65 anos de idade, vitimado por uma pneumonia. E hollywood perdeu mais um grande artista.

Kilmer tinha fama de ator difícil. Bateu boca com Marlon Brando durante as filmagens do remake de A ilha do Dr. Moreau, de John Frankenheimer, chegou a socar uma atriz durante um ensaio, mas polêmicas à parte, nada disso afetou o seu talento inegável. E colegas que trabalharam com ele em diversos longas diziam que era sempre uma experiência única atuar ao lado dele. 

Vi-o na tela pela primeira vez na comédia Top secret!: superconfidencial, dos mesmos criadores de Apertem os cintos... o piloto sumiu! (que era muito exibida nos anos 1980 e 1990 na sessão da tarde, da Rede Globo), mas o ator era, além de um interessante ator cômico, um artista pra lá de eclético. 

No tempo em que as videolocadoras e os cinemas de rua moldavam meu gosto cinéfilo era sempre um enorme prazer assistir aos filmes de Val Kilmer. O Santo, Batman eternamente - sim, ele também interpretou o cavaleiro das trevas, na versão dirigida por Joel Schumacher -, A sombra e a escuridão, Tombstone, o extraordinário Fogo contra fogo de Michel Mann, Amor à queima roupa, Os crimes de Wonderland... A lista é enorme.

Contudo, dois trabalhos em específico marcaram minha relação com o ator de forma mais duradoura. O primeiro, óbvio, é Top Gun - ases indomáveis, de Tony Scott. Muito se fala do Maverick de Tom Cruise, mas sem a presença antagônica de Iceman o filme certamente não teria o apelo que teve. E finalmente The Doors, de Oliver Stone, no qual dá vida de forma quase mediúnica ao vocalista Jim Morrison (para mim, seu melhor trabalho na carreira e até hoje não acredito que ele não ganhou o Oscar de melhor ator pelo filme).

Sua saída de cena após a descoberta de um câncer na garganta em 2015 foi dolorosa para os fãs. E para quem quiser saber mais sobre o período e a barra que ele enfrentou recomendo de olhos fechados o documentário Val, dos diretores Leo Scott e Ting Poo, que mostra o lado humano do artista em meio a tantas provações e dificuldades. Seu último ato interpretando foi uma pequena participação em Top Gun: Maverick, continuação do clássico oitentista.

Ao fim, para contextualizar com esse breve epitáfio: fiquei meio estarrecido com a notícia de que Val Kilmer não procurou ajuda médica por pertencer à ciência cristã, um dogma que não reconhece a existência de doenças e cuja única fonte de cura seja a oração. Ele chegou a afastar até amigos e entes queridos que quiseram ajudá-lo a se tratar. Uma pena!  

Sobra agora a nós, espectadores, manter seu legado vivo para a próxima geração de cinéfilos. E ele tem muita coisa boa no currículo que merece ser revista de tempos em tempos.

sexta-feira, 28 de março de 2025

4 décadas de um clássico pop


É isso mesmo? 40 anos para De volta para o futuro, de Robert Zemeckis? Meu Deus! E onde é que eu estava esses anos todos que passaram? Numa câmara criogênica, que nem Mel Gibson no filme Eternamente jovem? Só pode ser piada... Só que não. 

40 anos que Martin McFly (Michael J. Fox) voltou no tempo - mais especificamente para o ano de 1995 - no Delorean criado pelo doutor Emmett Brown (Christopher Lloyd) com o intuito de consertar a linha do tempo e salvar a sua família. E eu me lembro do exato dia em que fui ao cinema, das filas homéricas, cheias de jovens apaixonados e entusiasmados, à espera da sessão (que não decepcionou).

O longa de Zemeckis - e a posterior trilogia (sim, o longa rendeu duas continuações) - fez parte de uma geração que conviveu com grandes longas feitos para o público jovem. Eram tempos de Brat pack, ou geração Brat como chamávamos no Brasil, filmes de terror, assassinos slashers decapitando cabeças, aventuras mitológicas que marcaram época e ficções científicas que mesclavam games e teorias da conspiração com a mesma dosagem.

Contudo, acredito que nenhum outro longa nessa linha - ou mesmo nessa década - tenha feito tanto sucesso ou repercutido tanto quanto De volta para o futuro

Muitas de suas inovações e informações inusitadas chegaram a ser estudadas ou repercutidas nas décadas seguintes. Até hoje muitos espectadores - e, claro, a classe científica - ainda se perguntam se é possível a famigerada viagem no tempo ou se tudo não passa de uma ficção muito bem construída. E eu faço parte do grupo que espera ansiosamente que um dia isso se torne realidade.

E olha que as continuações ainda trouxeram o tênis com os cadarços automáticos e o snow board! Além da ironia por trás do inédito título dos Cubs, popular time de beisebol norte-americano. 

Dizer que De volta para o futuro marcou época na história de hollywood já é clichê por si só. Mais do que isso: ele fundou as bases do que ficaria conhecido como o filme de aventura perfeito (e, por isso, acho uma loucura que qualquer geração posterior proponha um remake dele). É dessas experiências cinematográficas que acontecem uma vez e nunca mais. E mexer nessa estrutura não passa de reles engano ou temeridade. 

E você que ainda não assistiu essa obra-prima e fica aí perdendo tempo com baboseiras heroicas e tramas absurdas com monstros surreais, tá esperando o quê pra dar uma conferida, hein?    

terça-feira, 25 de março de 2025

Os monges cineastas


Quase me esqueço de comentar os 30 anos do Dogma 95, movimento cinematográfico que subverteu as estruturas da sétima arte propondo trazer a figura do diretor de volta ao protagonismo que ele merecia. 

Tudo parte de uma decisão colaborativa dos diretores dinamarqueses Lars Von Trier e Thomas Vinterberg que, cansados da lógica comercial proposta pelo cinema hollywoodiano, decidiram pregar a favor de um cinema mais artesanal, logo anterior ao da chamada exploração industrial nos EUA. 

O tripé primordial da estética do Dogma 95 girava em torno da valorização da história, atuação e temática. Efeitos especiais, recursos tecnológicos e pós-produção caríssima? Nem pensar! Em primeiro plano deveria figurar o artista e sua capacidade de ser original, levando com isso o cinema mundial à uma nova dinâmica, que não se resumisse a produzir vultosas bilheterias.

Une certaine tendance du cinéma français”, ensaio produzido pelo diretor François Truffaut para a revista Cahiers du Cinéma em 1954, foi uma grande influência a esses diretores, que chegaram a ficar conhecidos como "os monges cineastas". E o conjunto de regras propostas pelo manifesto acabou sendo chamado de "voto de castidade". 

filmagens feitas em locações (e não em estúdios); som produzido junto com as imagens; gravado totalmente com câmera na mão (logo, nada de tripés ou travellings); devia ser em cores e sem iluminação especial; filtros são proibidos; nada de ações superficiais (como, por exemplo, assassinatos); o filme deve acontecer aqui e agora, sem alienações temporais e geográficas; formato: 35 mm; filmes de gênero não são aceitos e o diretor não deve ser creditado.

Daí por diante, o realizador estava por sua conta. 

Contudo, algumas regras acabaram sendo, volta e meia, quebradas pelos próprios realizadores. O próprio Vinterberg confessou que no longa Festa de Família (o primeiro do Dogma) cobriu a luz de uma janela, rompendo com o voto de não inserir objetos alheios ao set e de não usar nenhum tipo de iluminação especial na produção. Entretanto, suas normas não tinham um fim em si. Elas não tinham a intenção de policiar ou castrar o realizador, mas sim de provocar uma nova forma de fazer cinema.

Até o presente momento foram realizados 35 longas no formato (entre 1998 a 2004). Digo até o momento, pois qualquer diretor ainda pode realizar o seu experimento dentro do formato, desde que siga as regras impostas. E pelo atual momento que o cinema passa - de pouca inventidade e muito mais do mesmo - eu confesso que acharia até interessante uma reaproximação do Dogma 95, visando novos caminhos para a sétima arte. 

Resta fazer os atuais manda-chuvas do cinema mundial (e, principalmente, americano) entenderem isso...

sexta-feira, 21 de março de 2025

O mundo segundo Arnaldo Antunes


É sempre um prazer inenarrável ouvir um novo trabalho do cantor, poeta e compositor Arnaldo Antunes. Desde os tempos em que fazia parte da banda de rock Titãs. Sua língua afiada e suas letras cheias de denúncias ácidas e uma ironia típica de quem conhece bem o país no qual vive são suas marcas registradas. Sempre saio transformado toda vez que ouço um novo álbum ou leio um novo livro de poemas dele. É, com folga, um de nossos maiores pensadores atualmente.

Com Novo mundo, seu mais recente trabalho lançado ontem, ele mais uma vez escancara as mazelas, prepotências e desleixos desse mundo fragmentado no qual vivemos, com uma sociedade cada vez mais intolerante e oportunista. 

Muitos colegas já me perguntaram como Arnaldo consegue se manter na ativa, compondo e produzindo temáticas que vão contra grande parte do status quo atual. E eu sempre respondo: "Ele precisa ser um outsider em tempo integral para conseguir realizar o seu trabalho; do contrário...". 

Há duas parcerias aqui com outro esplêndido visionário, o cantor David Byrne, líder da banda Talking Heads. São elas "Body corpo" e "Não dá pra ficar parado aí na porta". Além disso, é possível também apreciar outras canções a quatro mãos muito bem-vindas, como por exemplo, "Sou só" (ao lado de sua parceria de Os Tribalistas, Marisa Monte) e "Viu, mãe?" (onde divide os créditos com o falecido Erasmo Carlos, eterno Tremendão da Jovem Guarda).

À parte essas colaborações mais famosas, vale a pena uma conferida em "Pra não falar mal" (no qual ele divide os vocais com a cantora Ana frango elétrico), "O amor é a droga mais forte" e, claro, a faixa título, que é uma pedrada e expõe a nu o grande caos no qual estamos vivendo nos últimos anos. 

Detalhe imprescindível que os ouvintes não podem deixar passar despercebido: o quesito sonoridade merece um capítulo especial nesse álbum extremamente bem construído. Nos últimos anos raras vezes vi uma combinação de instrumentos tão bem feita a serviço de um trabalho musical. Se Novo mundo fosse um disco instrumental ainda assim ganharia todos os meus elogios. E acreditem: são poucos os que conseguem essa façanha na MPB atual. 

No mais, prefiro encerrar por aqui e deixá-los procurar o disco nas plataformas de streaming. Aposto que mudará a sua perspectiva para esse final de semana...