sexta-feira, 31 de agosto de 2018

Post-delírio-projeto


Eu quero fazer um Pulp Fiction pessoal (correção: eu tenho pensado em fazer um Pulp Fiction pessoal há exatos 10 anos, mas a ideia não sai da minha cabeça de jeito nenhum). 

Acompanho Tarantino desde que começou sua orgiástica carreira e coloquei na minha cabeça que ele é o maior diretor da atual geração (sorry, Scorsese e Kubrickmaníacos!). O cara é foda! Ponto. E desde que assisti sua obra máxima, Pulp Fiction (e a reassisti mais 15 vezes!), não me sai da cabeça um projeto que emule sua obra, mas que tenha a minha assinatura.

O problema: só consigo construir fragmentos de um possível roteiro, repleto de personagens surreais e tarantinescos até a medula. Uma ruiva lésbica e matadora de aluguel? Um pastor evangélico que executa suas vítimas com uma escopeta Winchester 21 e ao ver a poça de sangue correndo pela rua, ergue sua arma ao alto e grita "palavra da salvação!"? Um colecionador de bonecas infláveis, viciado em filmes com Ava Gardner e rapé? Um plano sequência envolvendo um leiloeiro com um braço biônico e uma stripper vesga e japonesa fugindo de duas viaturas policiais completamente baleadas, que os perseguem acreditando tratar-se o casal de uma dupla de falsificadores de moedas antigas? E muito mais... (a minha imaginação é mais fértil do que a média no Brasil). 

O problema 2: como custear tal projeto. Nunca foi tão difícil produzir cultura no país como atualmente e tenho a ligeira impressão que meu filme, posto os devidos cálculos no papel, sairia caro. Talvez precisando até mesmo de filmagens no exterior (uma visita à penitenciária na Turquia que serviu de locação para o filme O expresso da meia-noite, de Alan Parker, seria uma possibilidade?). E sabe como é roteirista/diretor: sempre defendendo suas ideias mordazes com unhas e dentes. 

Conheço até mesmo duas ou três pessoas que gostaria de ver atuando no filme (uma delas, aliás, meu vizinho). Mas também gostaria - muito (muito no sentido de indispensável) - de ver John Malkovich, Jennifer Jason Leigh, Gerard Depardieu, Wagner Moura e Ricardo Darín trabalhando no projeto. 

Já me peguei até mesmo perguntando se ele não poderia se tornar o filme definidor desta primeira metade do século XXI, com direito a capa na Time e na Variety (mas isto sou apenas eu, em momento high hallucinated, divagando a esmo). Então é melhor pensar com carinho passo-a-passo. Já dizia meu pai: uma coisa de cada vez. 

Chego ao sétimo parágrafo deste post-delírio mais confuso do que comecei, mas quer saber? Esta é a intenção primeira em sétima arte: confundir. Ou não? Vejam Donnie Darko, Brilho eterno de uma mente sem lembranças, Dogville, Medo e delírio em Las Vegas, 12 macacos e Depois de horas e talvez concordem comigo em gênero, número e grau e mais: talvez queiram embarcar comigo nesta produção surrealista, irracional e megalomaníaco (como todo bom blockbuster que se preza). 

Mas como disse lá em cima: por enquanto são apenas fragmentos, ideias esparsas. Talvez o filme mesmo nem venha a acontecer. Talvez transforme tudo num livro e procure uma editora menor, que não me exija um agente literário para roubar minhas economias. Talvez - eu disse talvez, vocês leram? - saia mais barato e então eu venda os direitos para hollywood (com a condição de interferir na escolha do diretor que assumirá o projeto). 

Por conta da ausência de mais elementos cinematográficos e narrativos que justifiquem a existência desse filme, decido encerrar este post por aqui, acreditando com muita fé e esperança que as ideias continuem surgindo mesmo que aleatoriamente. Trata-se, afinal de contas, de um sonho antigo, que já aniversariou uma década, e continua latejando em minhas memórias. 

Como desfecho inusitado a este artigo-deboche-desabafo, pergunto-me: estarei fazendo tudo errado ou apenas não chegou a hora de trazer à luz tal delírio?

For god sake, save me Mr. Tarantino!!!

quarta-feira, 29 de agosto de 2018

A norma culta dos alienados


Como fala mal o povo brasileiro!!!

Também o que esperar de um país que não dá a mínima para a educação, que dirá para a própria língua, imerso numa cultura de interesse onde o que está em jogo - desde os tempos de Brasil ainda colônia portuguesa - é a exibição de diplomas, títulos e honoris causa? 

E tem como piorar? Tem. Faltam as modinhas, manias, gírias, afetações, que fazem do povo brasileiro o maior reinventor da sua própria língua. Em outras palavras: o brasileiro fala a língua portuguesa que ele próprio cria naquele momento, de acordo com o seu próprio humor e interesse. 

De tanto acompanhar essa irresistível mania nacional decidi criar este pequeno glossário moderno, até porque tem muita gente que me lê nas redes sociais que não faz a menor ideia dessas inovações e fica completamente perdido, dependendo de com quem conversa (leia-se: pessoas de uma geração mais jovem do que ela própria).  

Vamos encarar o desafio?

Andrógino: talvez a palavra com tempo de uso no país, mas ganhou uma remodelação nos últimos tempos. Virou sinônimo de tudo que é diferenciado, seja na estética, na política, na cultura geral, etc.

Curte/compartilha: a dobradinha do momento. Por conta do fênomeno das redes sociais, hoje em dia todo mundo admira ou espalha na rede o que existe de melhor (e principalmente: de pior) desse cotidiano caótico em que se transformou a vida. 

Emojis/emoticons: para reles mortais, meras figurinhas animadas; para quem está por dentro do mundo geek/internético, resume o estado de espírito e a vida sentimental de muitos usuários da rede. Nunca foi tão fácil expressar raiva, amor, constrangimento, perplexidade, etc...

Fitness: sinônimo de saúde, de bem viver, de roupas esportivas, de quem maromba quase 24 horas por dia (e chama isso de "estilo de vida"). A palavra confunde-se com essa geração brucutu dos dias de hoje.

Hashtag: eu nunca entendi completamente a extensão do termo, mas ganhou uma proporção astronômica. É uma espécie de convite, convocação a participar de qualquer debate, manifestação, greve ou ato político que esteja na pauta do momento. 

Lacrou: expressão típica de quem se acha, de quem pensar "mandar em tudo". Faça ela (a pessoa) um trabalho meia-boca ou não, adora contar vantagens de si pra todo mundo. Expressão que caia no ostracismo logo! 

LOL: mais conhecido como rindo à toa. Uma extensão do kkkkk. Ou das hienas internéticas (que riem de tudo)

Miga: porque ser amiga somente já não é mais suficiente. Tem que ser uma relação de quase siamesas, quase respirando o mesmo ar junto. As meninas adoram. 

Musa: no meu tempo de adolescente, musa era Luciana Vendramini e Sharon Stone. Hoje em dia, não é mais sinônimo de mulher líndissima e de corpo escultural (vide certas cantoras da MPB que andam ganhando o rótulo). 

OMG!!! - no inglês oh my god! (ou o velho oh meu Deus!). Uso prático: a velha frescurada que certos geeks gostam de inventar pra chamar a atenção. 

OFF: continua achando que tem duplo sentido. Na ruas, tudo que é fora de rumo, propósito, noção. Mas também tem uma conotação de liquidação no mundo shopping center de hoje em dia. 

Partiu: vai chamar alguém para sair? Combinou com a galera algum programa? Vai a algum lugar e precisa avisar a turma que te conhece no face, no insta, no etc e tal? Agora já sabe. 

Plus Size: expressão que nasceu de um preconceito (assim como afro tomou lugar de negro nos dias atuais). Ou seja, gordinha não dá mais. Ofende, dá processo e coisa e tal. Só não vale fazer que nem os babacas que comparam com os colchões do mesmo tamanho. 

Tamo junto: podem conhecê-lo ou não e ainda assim falarão a frase de forma demagoga. Uma maneira mais simplista de dizer: "você é parceiro, é da galera!". Enfim...

Trending Topics: tudo de mais arrebatador, polêmico, esclarecedor, que ande chamando atenção atualmente junto à opinião pública. Ganha uma forcinha do curte/compartilha e do hashtag sempre que pode. Obs: a bunda de uma nova celebridade ou uma tragédia não estão isentos de aparecerem aqui. 

E isso porque eu fiquei no básico. Se fosse me especializar no tema, certamente descobriria - com pesar - que a língua portuguesa de Camões, Drummond e Fernando Pessoa, infelizmente, está extinta faz tempo. Junto com o latim e o esperanto. 

Dias negros vivem nossa civilização! E com vistas a piorar. 

sábado, 25 de agosto de 2018

vai escolher mal assim lá no inferno!


É dose, hein!

A ressaca (The hangover) virou Se beber, não case; inseto (Bug) virou Possuídos; o som da música (The sound of music) virou A noviça rebelde; cruzeiro (Cruising) virou Parceiros do crime; sem noção (Clueless) virou As patricinhas de Beverly Hills;  o caçador de veados (The deer hunter) virou O franco-atirador; lembrança (Memento) virou Amnésia; perdido na tradução (Lost in translation) virou Encontros e desencontros; corrida de ratos (Rat race) virou Todo mundo louco! - uma corrida por milhões; suco de besouro (Beetlejuice) virou Os fantasmas se divertem; rastejador noturno (Nightcrawler) virou O abutre; paternidade (Parenthood) virou O tiro que não saiu pela culatrasozinho em casa (Home alone) virou Esqueceram de mim...

A lista é imensa e eu poderia ficar aqui um século de forma ininterruptamente elencando títulos e ainda assim não conseguiria concluir a lista. 

Não adianta: nossos profissionais que trabalham na área de distribuição cinematográfica precisam rever seus conceitos (quem sabe até mesmo suas formações) o quanto antes. Dar títulos em português para longametragens estrangeiros é tarefa entregue a boçais de primeira grande. Ou a invejosos contumazes do cinema internacional. Somente essas duas designações explicam tanto despreparo na hora de titular uma obra estrangeira em nossas terras. 

Desde moleque eu percebo essa falta de consideração com o público espectador. Nem bem chegara aos 11 anos e os cinemas de rua (espécie em extinção nos tempos atuais) exibiam Batteries not included (baterias não incluídas), uma produção de Steven Spielberg que trazia como protagonistas dois dos idosos que fizeram sucesso por aqui com Cocoon. Aqui no Brasil, ganhou o evasivo título de O milagre veio do espaço. Isso sem contar o hoje cult Tubarão (também de mestre Spielberg) cujo título original é Jaws (mandíbulas).

Se me fosse dada a honra de estudar o cérebro de alguém eu certamente escolheria um profissional desse ramo. Quem sabe tentar entender suas implicâncias e escolhas infelizes. 

Recentemente, com o advento e popularidade dos youtubers (e o setor de sétima arte está repleto de bons exemplos como Meus 2 centavos, Pipocando, Nerd rabugento, etc), muitos críticos online passaram a fazer piadas e mostrar sua insatisfação - de forma bem humorada - com certas "traduções". 

Gozado que os seriados televisivos, mania nacional dos últimos tempos, consegue ter uma trajetória mais feliz, pois muitos de seus títulos estreiam por aqui com seus títulos originais (Homeland, Dexter, Breaking bad, American horror story, The middle, The big bang theory, etc etc etc), para deleite de seus fãs, evitando assim quaisquer polêmicas e reclamações. 

Pergunto-me se não será por conta disso que grandes empresas produtoras de cinema preferem lançar seus títulos - ou às vezes subtítulos - no idioma original (por ex: O exterminador do futuro: gênesis, Maze runner, etc). Não gerar desconforto para si mesmas quando forem resenhadas por críticos do ciberespaço? É sempre uma boa opção. 

Talvez um dia evoluamos nesse sentido. Ou talvez eu esteja somente divagando à toa, porque este país macunaímico se recusa a mudar desde que eu me entendo por gente. De concreto mesmo é que as escolhas de títulos ruins já viraram uma marca registrada (quase uma lenda urbana) de nosso mercado exibidor. E nada se faz para mudar isso. Também: o que esperar de um setor que prefere chamar para dublar animações da Disney comediantes rasos como Felipe Andreolli e Marcos Veras e pessoas públicas tão vazias quanto Bussunda e Heloísa Perissé? Quando todo o processo é discutível, esperar que o desfecho seja bom é pedir demais...

Só resta a este colunista o óbvio e derradeiro desabafo: vai escolher mal assim lá no inferno!

quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Madonna sessentona e outras verdades


Li esta semana no Uol entretenimento, na Folha de São Paulo e no Estadão que a pop star Madonna (outrora também conhecida como material girl) completou 60 anos sem perder a polêmica, a provocação, defendendo o feminismo mais do que nunca, e ainda permanece um amuleto para as grifes de moda. É verdade. Mas também "em termos". 

Acredito, sim, que tanto Madonna (como a geração da qual fez parte e era um símbolo maior) perderam parte de sua relevância cultural. Os fãs mais ferrenhos certamente já estão se coçando para responder a este humilde cronista: "quem é este babaca para difamar a diva do pop?". E desde já respondo: "não sou difamando ninguém; são apenas fatos". 

Ou em outras palavras: o tempo passa (e as prioridades do mundo também). 

Quem acompanhou Madonna, como eu, em clipes como Vogue, Holiday, La isla bonita, Like a prayer e companhia ilimitada, sabe que ela sempre foi uma sexista de mão cheia. Seu álbum Erótica e seu documentário Na cama com Madonna (que conta com a presença de estrelas de hollywood do quilate de Antonio Banderas e Kevin Costner) são provas vivas disso, bem como sua carreira como "atriz" em longas como Corpo em evidência (que eu considero um Instinto Selvagem B), Evita, Olhos de serpente, Procura-se Susan desesperadamente e Quem é essa garota?

A ensaísta e crítica social norte-americana Camille Paglia, que preferia (como modelo de beleza) a cantora Debbie Harry, da banda Blondie, dizia que Madonna era, em muitos aspectos, "um grande engodo, uma grande enganação produzida pela América". E não estava totalmente errada. Ver e ouvir Madonna em The Girlie Show no Maracanã em 1993 foi, na maior parte, um suplício. Sua voz sempre foi melhor gravada em álbum mixada e remixada. Que me perdoem os fanáticos pela musa, mas isso era um fato! E detalhe: lembro-me até hoje das vozes poderosas de suas backing vocals, acompanhando-a para cima e para baixo durante toda a apresentação. 

Polêmicas e gostos à parte, é entretanto perfeitamente entendível o porquê da (hoje) sessentona ainda atrair as atenções de tanta gente, das mais diferentes idades e estilos. Madonna era cara-de-pau no melhor sentido do termo. Dá a cara à tapa durante toda a sua carreira, e nunca fugiu da raia no quesito "causar". Já se autocrucificou como Jesus Cristo durante uma turnê, já fez beijo lésbico, já ousou dirigir W.E. sobre o rei da Inglaterra que preferiu abdicar do trono e casar com uma plebeia, até mesmo casou-se com um dos maiores bad boys de hollywood, o ator Sean Penn. Em suma: Madonna encara qualquer guerra particular que se apresente à seu alcance. E até aí nenhum problema. 

Contudo, o mercado cultural (como tantos outros mercados) também envelhece e se reconstrói, criando novos mitos e fenômenos de temporada. E é nesse momento que os fãs em demasia não conseguem entender que a cena cultural (e fonográfica) precisa mostrar uma nova geração, antenada com as tecnologias e comportamentos do momento. Portanto, Madonna (por razões óbvias) sai perdendo. Não por maldade, mas simplesmente por conta da passagem do tempo.

Madonna deu lugar à Justin Timberlake (com quem dividiu tela em 4 minutes), à Taylor Swift, à Pharrell Williams, à Katy Perry, à Bruno Mars e principalmente à Lady Gaga (que muitos chamam de "sua sucessora"), entre tantos outros artistas do pop. É verdade que ela, a diva do pop, se reinventa a cada novo álbum, flerta com o rap, com a disco music e com o que mais surgir de interessante e vendável, mas... Ainda é uma criatura de outros tempos, metendo o bedelho numa casa nova. 

Vivemos tempos de you tube, de twitter, de instagram, de MSN, de iphones grudados nos rostos de alienados nerds, de crownfundings. Madonna é anterior a tudo isso e por mais que sua prole a tente manter antenada ela sai perdendo para os "filhos da tecnologia". Cá entre nós: não gostaria de ser um Caetano Veloso, um Elton John, um David Bowie (este, infelizmente, já falecido) vivendo na selva de jovens que dormem com celulares ligados enquanto lançam suas carreiras de forma independente nas redes sociais (para, depois, conseguirem contratos milionários). 

A diva chegou aos 60 e provavelmente chegará aos 70, 80 (Gilberto Gil está quase lá) e quem sabe mais... Fato. Porém, outro fato: o mundo não é mais o mesmo e a amplitude cultural atingida por ela não é a mesma. Por mais que ela ou sua entourage assessora tentem provar o contrário. 

A questão: isso não é o fim do mundo, muito menos o fim da mulher que junto com Michael Jackson ditou as bases do mercado fonográfico das últimas quatro décadas (aproximadamente). 

Logo, fãs: por favor, menos!!! 


domingo, 19 de agosto de 2018

O que é um filme popular?


A academia de artes e ciências cinematográficas dos EUA está cogitando a possibilidade de criar uma categoria no Oscar para filmes populares. Em outras palavras: a Academia está mesmo é interessada em trazer para a festa os chamados blockbusters de super-heróis feitos pela Marvel e pela DC (e, claro, quem mais fizer parte desta categoria popularmente conhecida aqui no país como cinema pipoca). 

Reclamações, lógico, virão de todos os lados. Tanto dos que defendem a medida quanto os do que acusam a intenção de puramente mercadológica e vazia. Já tem, inclusive, crítico de cinema na internet dizendo que o gesto da Academia é duplamente equivocado, pois rotula os filmes populares de "filmes de segunda classe", e portanto precisam de uma categoria só para eles, para não encherem o saco dos votantes dos sindicatos (lá chamados de Guilds) e engessa os chamados "filmes de arte" que, a partir de agora, ficarão reféns da mentalidade de que para serem  rotulados como tal, não poderão gerar bilheterias astronômicas.

Entretanto, não é este o tema principal para mim aqui. Na verdade, nem me preocupo tanto assim com o Oscar (que considero uma festa baba-ovo para homenagear os puxa-sacos e queridinhos da indústria cinematográfica). O que me chamou a atenção nesse começo de discussão - a categoria melhor filme popular ainda não existe de fato - foi a expressão em si. 

Pergunto-me e pergunto-lhes: o que faz de um filme de cinema um filme popular?

À primeira vista, lógico, nos deixamos levar pelo caráter comercial do projeto (o que ele é capaz de arrecadar, de gerar público). Contudo, alguns filmes ditos populares ao longo da história não arrecadaram tanto assim em termos de bilheteria (e em alguns casos, acabaram por ganhar décadas depois de seu lançamento a pecha de filmes cults. Mas isso é assunto para outra conversa, tá bom!)

Pantera negra, O cavaleiro das trevas, Os caça-fantasmas, Rocky - um lutador, Karatê Kid, Mulher maravilha, Homem-aranha, Transformers, Os goonies, De volta para o futuro, Cocoon, Alien - o oitavo passageiro, O exterminador do futuro, Robocop, E.T - o extraterrestre, Star Wars, Missão impossível, Top gun - ases indomáveis, Rambo, Conan - o bárbaro, Tubarão, a trilogia Onze homens e um segredo, Duro de matar, Desejo de matar, etc etc etc etc (milhões de etcs)... Todos, sem exceção, podem ser facilmente incluídos na categoria filme popular. E o que todos eles têm em comum? A capacidade de fazer suas plateias se sentirem parte da história. 

Tirem a prova dos nove: quem já não pensou em praticar algum tipo de luta (não necessariamente o boxe) depois de ver o embate entre Rocky Balboa e Apolo Creed? Quem não gostaria de poder ser à prova de balas como o andróide interpretado por Arnold Schwarzenneger, à procura de John Connor? Quem já não se imaginou pilotando um caça das forças armadas como Maverick e Iceman? Ou não daria tudo para voltar ou avançar no tempo como Marty McFly e o Dr. Brown? Quem já não teve receio de entrar na água, na praia, depois de ouvir Roy Scheider gritando para os banhistas "saiam da água!"? Ou já entrou num prédio gigantesco e achou que era o Nakatomi Plaza? Pois é... Eu também. 

Filmes populares são assim: entram em nosso subconsciente e bagunçam tudo lá por dentro. Nos fazem entrar de cabeça na história, viver intensamente a vida dos protagonistas, copiar estilos, gostos, costumes, imitar trajes. Digo mais: se pudéssemos, entraríamos literalmente no filme, como  aquele garoto, Danny, do longa O último grande herói, de John McTiernan.  

Se olharmos para o passado da sétima arte e o início de hollywood nos depararemos com pessoas que começaram a fumar por causa do cinema; namoraram pessoas que se pareciam com seus ídolos do cinema; compraram um Aston Martin idêntico ao do James Bond; usaram roupas justas, estilosas, berrantes, por causa de personagens específicos do cinema; teve muita mulher que tingiu o cabelo de loiro para ficar parecida com Marilyn Monroe, Lana Turner, Kim Bassinger e Sharon Stone; Já entrou na academia na vã esperança de construir um corpo como o do Stallone, do Jean-Claude Van Damme; já imitou e reimitou seus ídolos máximos da tela grande. 

Como? Por causa dos filmes populares. 

Fala-se em crise de criatividade no cinema americano e não há dúvidas: há remakes e spin-offs em demasia. Contudo, eles continuam - guardadas as devidas proporções de época a época - faturando mais do que os filmes ditos sérios, de arte, feitos para ganhar prêmios. 

Que me perdoem Almodóvar, Woody Allen, Martin Scorsese, Stanley Kubrick, Fellini, Kurosawa e companhia limitada, mas assim como todos eles têm um papel fundamental para a história do cinema (e foram reconhecidos por isso por seu devido público), o filme popular também o tem: o de encantar multidões e gerações. Não fosse assim novas versões, recriações de velhos clássicos não seriam apresentadas à novas plateias, ávidas por essas releituras. 

Estão vindo aí novas versões de Duna, Suspiria, um seriado de tv para O senhor dos anéis (um dos últimos fenômenos da indústria, que chegou a faturar na época 14 oscars), uma continuação para Top Gun, e muito mais. Aliás, a expressão muito mais aqui perde-se além do infinito (como bem diria o personagem Buzz Lightyear de Toy Story). 

Enquanto houver público que ria, chore, torça, se encanta, repita gestos, falas, cante as canções, haverá mais filmes de gosto popular. Vocês, haters, deixe-os em paz! Não gosta? Simples. Não vá ao cinema. Procure outra coisa para fazer. Já para os que curtem o bom e velho cinema, enquanto houver filmes que faturem, que encantem nerds e gerem repercussões, continuações, haverá indústria, mercado. 

E enquanto houver mercado, sempre haverá um motivo para ir até às salas exibidoras, não é mesmo?

quinta-feira, 16 de agosto de 2018

Calou-se a voz (R.I.P Aretha Franklin)


Hoje, de certeza, certeza mesmo, somente uma: a música ficou mais pobre. Perdemos a rainha do soul. E acreditem: quem ouviu essa senhora sabe por a+b que não perdemos qualquer rainha. Já ouvi de tudo nesta vida de Meu Deus!, mas poucas chegaram tão longe e me tiraram do chão tão fácil quanto a diva Aretha Franklin. 

Pode parecer estranho aos leitores dos meus textos no facebook que um indivíduo formado nas raias do rock n' roll (à base de Legião Urbana, Cazuza, The Who, Beatles e companhia ltda) curtisse também a diva do soul. Mas curtia (e muito). E tenho algo a confessar: é com enorme esforço que realizo esse epitáfio, pois ele traz uma carga emocional embutida nele, muito forte. Meu pai (que o Deus o tenha onde ele estiver!) era grande fã de Aretha, colecionava seus discos com uma paixão indescritível. E perder Aretha ontem foi meio que perder também uma parte dele, de seu bom gosto musical. 

Pois bem: perdemos. Aretha nos deixou, aos 76 anos, após uma dura batalha contra o câncer de pâncreas. 

A primeira vez que ouvi a rainha cantar era bem novo e assistira em casa à tarde uma sessão do filme Os irmãos cara-de-pau, de John Landis, com a dupla de comediantes Dan Aykroyd e John Belushi (este, então, um gênio morto prematuramente). Aretha aparecia num bloco cantando "think" e me deixou de queixo caído. Meu pai passara em frente à tv e disse: "se tem uma pessoa que merece o rótulo de artista é essa mulher aí". E passei a ficar de olho. 

Dali em diante, toda vez que uma música interpretada por ela tocava no rádio eu parava para ouvir: "I say a little prayer", "Respect", "Baby, I love you", "Chain of fools" (e aqui uma dica: procure no youtube uma participação dela cantando esta música no show Divas, ao lado de Mariah Carey), "Oh happy day", e o que mais pintasse na área. Aretha não era só soul, não! Era gospel também. Até a medula. E tem álbuns dedicados exclusivamente ao tema. Procure-os também. Aliás, se tiver tempo sobrando procure por toda a sua discografia. Que inveja dos colecionadores da obra dessa mulher!!!

Aretha Franklin foi a trilha sonora gostosa, agradável de ouvir, de muita gente, de muitos casais apaixonados, certamente de todos os fãs de boa música. E se pararmos para pensar na grande competição que havia na sua época em termos de black music - Diana Ross, Gloria Gaynor, Roberta Flack, Tina Turner, etc etc etc - podem ter certeza que ganhar o título de rainha do soul não foi tarefa das mais fáceis. 

Leio numa matéria sobre seu falecimento que ela era "um coro gospel inteiro". Digo mais: numa versão mais século XXI ela era um flash mob sozinho. Daquele tipo de cantora que leva uma festa, um festival de música nas costas com uma extrema facilidade. 

É com tristeza que vejo mais um capítulo da história da música se encerrando e não sinto a presença de nenhuma renovação à altura. Onde iremos parar - em termos musicais - se continuarmos perdendo grandes vozes como Aretha? Será esse o fim dos tempos, e teremos de nos contentar com reouvir velhos clássicos, por conta da carência de novas vozes? Queira Deus que não, pois a vida já anda difícil por demais...

Só nos resta desejar que a rainha leve sua festa para platéias mais celestiais. Não tenho a menor dúvida de que eles (os anjos) irão se refestelar até dizer chega. Calou-se a voz, não o mito.

Fica com Deus, Aretha! Você merece. 


segunda-feira, 13 de agosto de 2018

Ayrton! Ayrton! Ayrton Senna do Brasil!!! (Memórias/12)


Este mês que passou eu caí na asneira de assistir o grande prêmio da Alemanha de Fórmula 1 na Rede Globo (digamos, por desencargo de consciência). E qual não foi a minha frustração ao me ver perguntando a mim mesmo ao final da transmissão: o que foi que aconteceu com o automobilismo mundial? Onde foi parar toda aquela emoção de tempos passados? Pois é... A Fórmula 1 não é mais a mesma. Nem de longe.

E que me perdoem os fãs de Lewis Hamilton, Sebastian Vettel, Kimi Raikkonen, Max Verstappen e companhia limitada, mas eu (e minha geração) vimos Ayrton Senna!

Ainda não vi um crítico desportivo ou entendido em automobilismo ser capaz de explicar de fato o que foi o fenômeno Ayrton Senna. Não mesmo. Ele parece ter entrado para a história como uma figura mitológica, dessas impossível de se traduzir em imagens e números.  

Minha história como fã de Senna e do automobilismo (porque eu era fã do esporte por causa dele!) começa em 1984, quando em sua segunda corrida pela pequena Toleman ele arrebata uma segunda colocação no GP de Mônaco - onde foi considerado rei por muitos anos -, deixando para trás grandes nomes das pistas. Pensei comigo: esse rapaz brasileiro promete! E olha que eu tinha meros oito anos. 

Naquela temporada Senna conseguiu três pódios e fez muito mais do que muitos corredores de renome. No ano seguinte, 1985, devorou a pista de Estoril encharcada de chuva no GP de Portugal com sua Lótus preta John Player Special (marca de cigarros que o meu pai detestava, dizia ser cara e amarga em excesso!) e faturou seu primeiro troféu de campeão. O primeiro de muitos. 

Parece pouco aos olhos de hoje (e levando-se em consideração o hexa ganho por Michael Schumacher) pensarmos que Senna é apenas tricampeão. E é. Seus três títulos em 1988, 1990 e 1991, no entanto, me parecem bem mais expressivos do que, por exemplo, o tetra faturado pelo francês Alain Proust (a meu ver, um piloto covarde, cheio de manias e esquisitices, que decidia até mesmo quem queria como parceiro de equipe, tinha medo de chuva e disputava o campeonato com uma calculadora no bolso, computando qualquer pontuação para vencer de forma burocrática). 

Mais do que isso: fico com Senna por sua coragem. 

Ayrton Senna me ensinou que era possível fazer o inimaginável dentro de um carro. Muitas vezes me peguei pensando se não seria ele louco varrido, um homem disposto a enfrentar a morte. Não, meus caros leitores! Antes fosse... Senna era o imponderável do seu esporte. Torcíamos para que chovesse e ele bailasse nas pistas. Torcia para que chegasse o GP do Japão em Suzuka, pois foi ali que ele decidiu alguns de seus títulos. Torcíamos para que ele fosse eteno. 

E tudo isso numa época em que a Fórmula 1 ainda nos oferecia grandes pilotos como Nikki Lauda, Nelson Piquet (também tricampeão merecidamente), Nigel Mansell e Ricardo Patrese. Isso sem contar o colega de equipe na McLaren, onde passou mais tempo, Gerard Berger, a quem presenteou com a vitória na última corrida em 1991 (ano do tri). 

Hoje muitos o veem como um arrogante e não é para menos. Vivemos tempos de recontar nossa própria história e a de nossos ídolos de maneira amarga, desdenhando seus feitos. Senna era complexo, imperfeito, competitivo até a medula e não levava desaforo para casa, como tantos outros gigantes do esporte. Misturar seu lado atleta com sua figura humana nunca será uma boa ideia nem muito menos explicará sua história como ela é. Pena que muitos nesse país repleto de analfabetos funcionais não entendam isso...

Em 1º de maio de 1994 Senna nos deixou após bater com sua Williams na curva Tamburello em Ímola, na Itália. Lembro-me que na noite anterior havia ido com minha tia e minhas primas numa festa de 15 anos e dormira na casa delas. Acordei no dia seguinte com a voz embargada de Galvão Bueno na tv. O acidente já havia ocorrido e a emissora repetia o momento da batida de diversos ângulos diferentes. Seria a última vez que nosso tricampeão atravessaria aquelas pistas. 

Do enterro em diante perdi qualquer relação ou intimidade com o esporte. Nunca mais (quer dizer: até semana passada) assisti à um GP de Fórmula 1. Digo mais: ainda sonho com Ayrton Senna vivo, correndo a temporada disfarçado, com uma máscara, como o personagem Frankenstein do filme, hoje cult, Corrida da morte do ano 2000, do diretor Paul Bartel (realizado em 1975). Agora vejam vocês: um marmanjo na casa dos 40 tenho sonhos de menino!

Só mesmo Senna - o Ayrton Senna do Brasil, como ficou conhecido nas transmissões, sempre acompanhado do tema da vitória toda vez que vencia - para fazer esse quarentão se emocionar!

De certeza somente uma, meus amigos e leitores fãs do esporte: a Fórmula 1 nunca mais será a mesma... Mesmo.

quinta-feira, 9 de agosto de 2018

Montanha-russa sentimental


Toda vez que estreia no Rio uma nova montagem de alguma peça do dramaturgo Nelson Rodrigues (vulgarmente conhecido como anjo pornográfico) eu corro para o teatro, para ver do que se trata. Acompanho a obra de Nelson - que é visto, quase de forma unânime pela nossa classe teatral, como nosso maior autor no segmento - há bastante tempo e pode dizer que já vi de tudo um pouco neste setor. Desde blasfêmias visíveis à obra do dramaturgo até pequenas obras-primas dignas de nota. 

Pois bem: digo com folga que fui ao Centro Cultural Banco do Brasil esta semana assistir a montagem do diretor Eric Lenate para A serpente, última peça de Nelson, e a coloco entre as montagens que vi do autor até hoje que mais me surpreenderam. 

Falar de Nelson no teatro é sempre ardiloso e complexo (o próprio autor chegara a dizer em uma de suas entrevistas que diretor para montá-lo precisava "ser burro", porque os inteligentes, metidos a intelectuais não entendiam nada do que ele escrevia e só faziam merda). Seguindo esse raciocínio irônico e direto, acho que o autor, se vivo, gostaria de assistir a montagem de Lenate, que não se deixou abater pela complexidade do tema proposto e soube esmiuçá-lo de forma inteligente e sem apelar a mentalidade tacanha e ultrapassada dos dias de hoje. 

A serpente conta a história de Lígia (Carolina Lopez) que vive o drama da separação de seu marido, Décio, a quem ama mais do que tudo e, no entanto, não vê reciprocidade da parte de seu cônjuge. Ele alega impotência, mas nunca se sente frustrado sexualmente quando está na cama com a amante (que é a própria empregada da casa). Resultado: da incompatibilidade de gênios, vem o desejo dele de que cada um viva a sua vida em paz. 

Da parte de Lígia, entretanto, o que ela sente mesmo é inveja do relacionamento da irmã, Guida (Fernanda Heras) com o cunhado, Paulo. Chega a confessar para ela que nunca vira um amor tão sólido como o de ambos. Guida, pesarosa com toda a situação e vendo na irmã sua cara-metade, decide emprestar o marido à Lígia por uma noite. Para que ela se sinta desejada novamente. 

É nesse momento que começa a grande catarse rodriguiana e o caos familiar se instaura. Lígia apaixona-se por Paulo e vice-versa. Porém Guida sempre acreditou que seu casamento fosse para sempre e percebe com nitidez o desinteresse do marido. Décio regressa e sente a diferença de clima na casa. Pronto. Está criado o cenário perfeito para que a tragédia - tema caro ao autor - se principie. 

Observação: tudo isso se passa num cenário especificamente criado para gerar uma atmosfera emocional claustrofóbica. A decisão do diretor em colocar a cama do casal dentro de uma cela prisional é acertada. Digo mais: necessária. Quem conhece o universo do autor por trás de obras-primas como O beijo no asfalto, A falecida, Vestido de noiva e outros sucessos de público, sabe bem que Nelson adora provocar e ao mesmo tempo causar desconforto em seu público. 

O demagogos de plantão e haters de internet (classe que vem fazendo a devassa na cultura nacional) de cara dirão: "trata-se de uma peça machista, misógina, que trata a mulher com desprezo, como reles objeto, e expõe o machismo em sua forma mais crua". Porém, esquecem eles, que Nelson Rodrigues faz isso de propósito. Sua intenção, quando expõe as relações amorosas a nu, é desmascarar a hipocrisia social naquilo que ela tem de mais latente. E nesse sentido o diretor exibe todo o questionamento moral por trás da decisão de Guida sem apelar para extravagâncias e exageros (como anda na moda atualmente no teatro brasileiro, repleto de personalidades e atores excessivos em suas intenções). 

A serpente pode até ser rotulado como objeto menor dentro da vasta obra do polêmico (e extremamente relevante, até hoje!) dramaturgo. Contudo, graças a uma montagem inteligente, minimalista (fiquei encantado com a iluminação do espetáculo, que sempre é um ponto decisivo para que eu "compre" ou não a montagem) e correta, mas sem perder a ousadia que é peculiar no autor, consegue me fazer refletir sobre esses tempos atuais de muita libertinagem (confundida ad nauseam com liberdade) e conservadores de meia-tigela querendo botar ordem na casa num país que sempre teve a pecha de desgovernado.

Procurem. O espetáculo fica em cartaz até o fim do mês.

domingo, 5 de agosto de 2018

Para os artistas de plástico (um manifesto)


Já me dizia um antigo professor da faculdade: "se quer expor a sua verdade a qualquer preço, grite! grite antes que seja tarde demais!". Que assim seja. O tema do meu grito? Uma cutucada nessa gente que anda se autointitulando artista por aí.

Primeiramente (e é preciso que isso seja dito antes de qualquer outra coisa que eu venha a escrever neste manifesto): ser artista não é sinônimo de ser desinibido. Isso nós já temos em excesso ao redor do mundo. 

Olhem ao seu redor. Olhem para os seus vizinhos. E para os seus colegas de trabalho. E de faculdade. Prestem bem atenção em cada um deles. No desejo implícito de serem famosos. Prestem atenção no quanto cada um deles têm de artista dentro de si. 

E ainda assim nenhum deles (repito: nenhum) são de fato produtores de arte. 

A arte, meus caros amigos, vem sendo transformada em instrumento de chacota, de exibicionismo, em mera mercadoria barata e abusiva, bem ao gosto dos acéfalos e cretinos que sempre foram maioria neste país. A diferença? Eles nunca foram tão organizados. 

Pergunto-me por que é tão gratuito e fácil ser chamado de artista num país como o nosso e não consigo encontrar uma resposta realmente lúcida. Simplesmente porque não é do desejo da população (nunca foi) responder a qualquer tipo de pergunta. Gostamos mesmo é de berrar nossas insatisfações a torto e a direito, irrefletidamente. Pois queremos ser ouvidos. A qualquer custo. A qualquer hora. Por qualquer razão. A mínima que seja. E nada mais. 

Quando tiverem tempo sobrando (eu sei...Ele anda escasso nos últimos tempos!) dêem uma breve olhada em nossa MPB, em nossa sétima arte, em nosso teatro, em nossa parca literatura, em nossas galerias e onde mais vocês desejarem. E mais uma vez: prestem atenção. 

Prestem atenção no que vem sendo chamado de arte. 

Arte, hoje, no Brasil, é tudo que conquiste vultosas plateias, orçamentos milionários, comentários aos montes em alguma rede social de importância (importância? desculpem... Foi falta de um verbete melhor), que polemize, escandalize, escrotize ainda mais o banal cotidiano. A arte contemporânea é o óbvio ululante às avessas. 

Em outras palavras mais simples: a arte é o que vende. E o artista é seu intermediário mercenário, onipotente, esbanjador, vaidoso, com um discurso tresloucado na ponta da língua, pronto para gerar novas cobaias fanáticas por atenção. 

Vejo com maus olhos o futuro dessa arte invisível, miserável, ordinária, opaca, desnecessária, sem valor estético, cheia de galhofa e metidice, metida a empoderada e diversa, mas que não reconhece sequer o seu semelhante. Seus atores (seria melhor agentes? deixa pra lá...) escondem-se atrás de poses estéreis, cabelos esvoaçantes, vozes estridentes, câmeras trepidantes, gargalhadas sujas, posturas ideológicas torpes. Meu Deus! Nunca se falou tanto no país e se disse tão pouco, quase nada, praticamente porra nenhuma. 

O que esperar? O que não esperar? É para esperar alguma coisa dessa gente? Sério? Não será tudo isso uma fase, uma fase ruim que antecederá alguma fênix artística, salvadora da pátria? Sim? Não? Talvez? É... Perguntas demais. A última frase do parágrafo anterior se repetindo de novo. 

Espero da arte contemporânea que ela não me espere. De jeito nenhum. Pois eu também não pretendo esperá-la. De jeito nenhum. Nem fodendo. 

Se o melhor que o país pode fazer é o que aí está então prefiro um reboot cultural. Já. Estamos combinados? Desde já meu agradecimento por ter chegado até o final deste artigo. Nem todo mundo aguenta ouvir a verdade no Brasil.

(P.S: eu poderia, eu sei, ter citado inúmeros exemplos de má arte no Brasil contemporâneo. Cantores, cineastas, atores, músicos, enfim, uma lista quilométrica. Mas vocês não são inocentes. Vocês sabem exatamente de quem eu estou falando. Parem de ser hipócritas!)

quarta-feira, 1 de agosto de 2018

Sétima arte de bolso


O texto de hoje promete ser enxuto, mas de extrema eficácia e utilidade, principalmente para os amantes do bom cinema.

Se eu fosse um admirador de expressões acadêmicas e universitárias - longe disso! mesmo tendo formação em comunicação social sempre procurei um caminho alternativo para colocar o meu conhecimento, distante de esnobismos e beletrismos - diria aqui, neste artigo, em alto e bom som, que A história do cinema para quem tem pressa, de Celso Sabadin (um dos fundadores da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema) é um excelente livro tutorial para amantes e estudantes da sétima arte. Como não sou, prefiro dizer que o livro foi a melhor surpresa que eu tive nesse ano de 2018 até agora. É praticamente um curso portátil, de bolso. 

Celso Sabadin posiciona-se capítulo a capítulo - e são capítulos curtíssimos e agradabilíssimos de se ler! - como um professor atencioso e paciente que esmiuça, tema a tema, o básico sobre cinema para aqueles que não fazem a menor ideia do que seja o cinema (sim, existem pessoas assim no planeta terra) e também aqueles que o amam e precisam de um apanhado geral sobre o assunto para depois desdobrá-lo em outras leituras e conteúdos. 

Sabadin não esquece de nada: mostra a pré-história do cinema, com suas distorções acerca de quem inventou a sétima arte (foram muitos os "criadores" desta nobre arte ao longo dos séculos e quem pensa o contrário não sabe absolutamente nada sobre o assunto); apresenta os pioneiros e suas tecnologias a princípio primárias de captação (Lumière, Meliès, Pathé, etc); migra para os EUA, epicentro do mercado no setor audiovisual, explicando até mesmo discussões como a guerra das patentes e a formação dos grandes estúdios (Twentieth Century Fox, Columbia, Paramount, entre outras líderes de mercado) bem como as consequências advindas da Primeira Guerra Mundial. 

Num segundo momento, direciona seu conhecimento para movimentos cinematográficos ocorridos na Europa e em outras praças (vistas até então como periféricas), como o Expressionismo alemão, o Impressionismo francês, o Realismo soviético, o Neorrealismo italiano, a Nouvelle vague, o Cinema novo aqui em nossas terras, sem se esquecer de seus principais nomes e longas produzidos.

Entre um tomo e outro, não esquece de mencionar a passagem do cinema mudo para o cinema sonoro, o surgimento do filme noir (e seus gangstêres durões, sempre acompanhados das femme fatales maquiavélicas e de uma beleza estonteante), a grande depressão que se abateu sobre a América após a queda da bolsa de Nova York em 1929, a contracultura seguida da nova hollywood (conhecida, em outros livros, como geração easy rider). a chegada da TV e o fim dos grandes estúdios como os conhecíamos até então e otras cositas más. 

Como desfecho de raciocínio, o autor coloca em pauta o crescimento do cinema de animação, comenta brevemente a presença de premiações e festivais (como Oscar, Globo de ouro, Cannes, Gramado, Sundance, etc), explica em parte o sucesso financeiro de franquias, continuações e remakes e se despede em alto nível fazendo um apanhado do que aconteceu de melhor no cinema ao redor do mundo (Índia, Nigéria, China, Coréia do sul, Japão, Irã e a retomada do cinema nacional). Ah! Para meu deleite pessoal, um página repleta de fontes e referências bibliográficas, que por si só já valem o dinheiro gasto no livro.

Para não dizer que não senti falta de nada, confesso: ele poderia ter entrado um pouquinho só na questão do streaming e do video on demand que anda tão na moda atualmente com empresas de renome como a Netflix e a Amazon Studios. Mas quem sabe ele não tenha guardado o tema para um outro volume... Façamos figa!

Como definir uma obra como A história do cinema para quem tem pressa? Em meio a tantas baboseiras publicadas no mercado editorial nos últimos anos - que o diga aqueles execráveis livros para colorir e as pérolas do pensamento auto-auda! - é com enorme prazer e respeito que reverencio um livro simples, enxuto (meras 200 páginas) e que entrega aquilo a que se propôe (algo que anda em falta nesse país repleto de bobalhões e falsos donos da verdade).

Faltou dizer alguma coisa? (eu disse que ia ser enxuto). Ah! Bons filmes para vocês.