domingo, 31 de outubro de 2021

Os jovens ditam as cartas


Pensar no cinema feito para adolescentes hoje em dia é muito fácil. Mais do que isso: eles são hoje a predominância do mercado audiovisual. Marvel, DC e Disney, só para citar as gigantes da indústria, encontraram um formato capaz de levar multidões às salas de projeção (e se o filme puder ser em 3D ou Imax, melhor ainda!). Complicado mesmo é encontrar nesse século XXI filmes para adultos. Ou em outras palavras: você precisa se virar ou assinar um streaming para vê-los. 

Contudo, houve um tempo em que hollywood não pensava nisso e até considerava o público jovem (ou teen, como preferimos chamar hoje em dia) um público ingrato. Haviam franquias, é bem verdade, mas elas atendiam à públicos das mais diversas faixas etárias. Não se construía uma trama em torno dos jovens. Eles não eram a motivação ou o modus operandi que determinava a história. Até que um grupo de loucos, rebeldes, insanos ou como você quiser chamá-los, decidiu na marra que os transformaria no centro das atenções. E essa geração ficou conhecida como geração BRAT ou Brat pack. 

A princípio um movimento associado às comédias adolescentes - mas não somente isso - os longas juvenis dos anos 1980 são vistos hoje pelos críticos e estudiosos do período como um "resgate da rebeldia das produções jovens dos anos 1950 junto com a inocência e o bom humor dos longas da década seguinte". E eu, mísero colunista metido a besta, não conseguiria encontrar uma definição melhor para o que esses alucinados visionários fizeram. 

E a maioria dos atores que compôs essa geração tinha uma maneira diferente de pensar a própria carreira. Conviviam fora dos sets de filmagem, pareciam colegas de escola, frequentavam as mesmas festas e transpunham toda essa informalidade para o registro audiovisual das telas. Não possuíam uma carreira acadêmica específica e muitos deles sequer estudaram artes cênicas (o que, no futuro, lhes rendeu muitas críticas, sendo taxados de irresponsáveis além de se envolverem em muitos escândalos, que levou parte do grupo a um encerramento abrupto ou trágico da própria carreira). Entretanto, numa releitura proposta a partir dos anos 2000, muitos consideram hoje essa postura rebelde meio que uma mística ou reflexo daqueles tempos.   

Nenhum outro nome é tão associado à Brat Pack quanto o do diretor John Hughes (responsável por obras-primas do período como Clube dos cinco, Mulher nota mil, Gatinhas e gatões e aquele que eu considero o filme-definidor dessa década, Curtindo a vida adoidado). Hughes defendia a ideia de que a sétima arte não era sinônimo unicamente do que era sofisticado e/ou complexo. Durante uma entrevista declarou: “Eu gosto do que é simples, das coisas mais ordinárias. O extraordinário não me interessa. Não me importo com psicopatas. Me interesso por aquela pessoa que acha que não tem uma história. Eu gosto do homem comum”. E fez disso seu porto seguro e, consequentemente, a menina dos olhos do seu cinema que é revisto até hoje à exaustão. 

Mas é preciso também fazer jus a dois longas específicos que ajudaram a antever o que seria a geração BRAT. Falo especificamente da comédia Picardias estudantis, de Amy Heckerling (que traz um jovem e excepcional Sean Penn ainda no início da carreira) e o extraordinário Jovens sem rumo, de Francis Ford Coppola (que praticamente reúne toda a geração jovem daquele período, de Matt Dillon à Tom Cruise, passando por Ralph Macchio e Patrick Swayze). Ambos abriram as portas para o fenômeno que viria a seguir.

Era um grande barato para qualquer adolescente daquela época (e eu acompanhei tudo de perto com meus 12, 13, 14 anos) tentar adivinhar o que havia dentro da mala do Chevrolet Malibu dirigido pelo personagem de Emilio Estevez que matava tanta gente em Repo man: a onda punk, de Alex Cox, acompanhar todo o sofrimento de Morgan Hiller (James Spader) em Tuff Turf: o rebelde, de Fritz Kiersch, e sua obsessão pela belíssima loira, namorada do líder da gangue ou mesmo apenas ver na surdina as cenas calientes de Danny (Rob Lowe) e Debbie (Demi Moore, no auge da beleza) em Sobre ontem à noite..., de Edward Zwick, que três anos depois realizaria o formidável Tempo de Glória, com Denzel Washington. 

E para que não me acusem de esquecimento ou privilegiar certos longas, fica abaixo uma breve listinha com outras pérolas desse período tão fértil:

O Primeiro ano do resto de nossas vidas, de Joel Schumacher 

A garota de rosa-shocking, de Howard Deutch 

Abaixo de zero, de Marek Kanievska

De volta às aulas, de Alan Metter 

Manequim, de Michael Gottlieb

Toque de recolher, de Harold Becker

Vou parando por aqui, pois quero que as novas gerações adolescentes viciadas em heróis, zumbis, vampiros e outras criaturas sobrenaturais vão à luta à procurem no Google, you tube e adjacências mais informações sobre essa galera, que é formidável em todos os sentidos e não envelheceu um segundo sequer. E acreditem: vocês irão se surpreender com o que vão encontrar a respeito. Podem apostar! 


quarta-feira, 27 de outubro de 2021

O novelista


Eu entendo as pessoas que dizem que as telenovelas já tiveram o seu tempo ou o seu auge. Há anos o gênero sobrevive de ideias velhas, saturadas. Em outras palavras: a telenovela requentou seu próprio formato apostando naquilo que é óbvio e, por conseguinte, gera lucro e audiência mais rápido. Entretanto, demonizar a tv por conta disso é uma grande leviandade. 

A tv teve, sim, grandes produções que fizeram milhões de pessoas ao redor do país sentarem diante de seus aparelhos para apreciar aventuras, desventuras, polêmicas, triângulos amorosos, traições, brigas por herança, por status, por poder, entre outras temáticas insólitas. E ontem o Brasil perdeu um dos autores que melhor souberam mostrar isso na tv sem rodeios. O país perdeu Gilberto Braga. 

Considero Gilberto uma das melhores coisas que a Rede Globo teve no quesito dramaturgia. Conheço muita gente que viu suas novelas e minisséries e o chamou de polêmico com relativa frequência e sobre isso só posso dizer "é verdade em termos". O autor criou aquela que eu considero a maior vilã da história da teledramaturgia nacional, a Odete Roitman de Vale Tudo. E a própria novela em si já era uma provocação por si só. Quem não se lembra do personagem de Reginaldo Farias indo embora do país cheio de grana e mandando uma banana de dentro do avião, ao som de Gal Costa cantando o hit de Cazuza "Brasil"?

Com Escrava Isaura ele nos mostrou uma outra faceta da escravidão e, de lambuja, toda a vilania de Leôncio (personagem de Rubens de Falco), um dos maiores mau caráter que eu pude presenciar do sofá de minha casa. Já em A Rainha da sucata sofremos pela labuta diária da humilde Maria do Carmo (Regina Duarte) que foi do lixo à riqueza por puro mérito. E teve muita gente que torceu, fazendo figa, para que Laura (Cláudia Abreu) tirasse tudo de Maria Clara Diniz (Malu Mader) em Celebridade. Sim, o fanatismo televisivo também tem dessas coisas!  

Entre seus maiores sucessos - além, é claro, da referida Vale tudo - destaco com folga Dancin' Days (que eu só fui assistir mesmo anos mais tarde, graças ao you tube, porque na época de exibição na tv eu tinha apenas três anos) e as icônicas minisséries Anos dourados e a extraordinária Anos Rebeldes, que eu revi há pouco tempo no canal Viva. Contudo, eu tenho uma adoração eterna por sua versão de O primo Basílio, adaptada do romance homônimo do escritor Eça de Queirós. 

Era fácil entender o sucesso de Gilberto Braga nos folhetins: ele sabia instigar o público como poucos. Entregava o que a plateia queria assistir naquele exato momento, fosse uma briga de casal, um assassinato à queima roupa ou duas mulheres rivais de longa data se estapeando no meio da rua. E é exatamente disso que eu sinto falta nas atuais novelas: querem complicar o que deveria ser simples ou sofisticar a cultura nacional quando o público, na verdade, quer se ver retratado na tela sem tantos estereótipos ou modismos. 

Nos últimos anos o autor andou um tanto sumido e suas últimas produções acabaram não fazendo o mesmo sucesso dos seus tempos de glória. Acredito que seu último grande trabalho tenha sido Paraíso Tropical, de 2007. E segundo declarações de seu sobrinho ao portal G1 ele andou bastante debilitado nos últimos anos, tendo passado por uma cirurgia na coluna, outra no coração e um diagnóstico de hidrocefalia. Uma pena! 

A tv, com certeza, perde um dos seus maiores nomes. Talvez alguns leitores deste artigo vejam como exagero o que eu vou falar, mas... Não fiz parte da geração que viu na telinha os folhetins de Janete Clair - para muitos, a maior novelista que este país já teve - e seu marido, o também dramaturgo Dias Gomes, mas vejo muitas pessoas que acompanharam suas carreiras dizerem que quando ambos faleceram a televisão morreu em grande parte junto com eles. Tenho essa exata sensação com Gilberto. Ele foi o cara que escreveu o que a minha geração queria ler, ver e ouvir. 

E isso, em tempos de fake news, negacionismo e tanta gente hipócrita zanzando pelas ruas, acreditem, não é pouca coisa, não!

Se eu já não estava mais afim de acompanhar a programação das emissoras de tv aberta por conta de um conteúdo gratuito e artificial que só reflete o atual momento de alienação que paira sobre esse país, agora então ferrou de vez...

Logo, só me resta mesmo é dizer "fica com Deus, mestre!".


domingo, 24 de outubro de 2021

O autoexílio




Para quem acha difícil viver no Brasil de hoje, com tantos negacionismos e cegos ideológicos, é preciso também lembrar sempre: o Brasil de ontem já aprontou, já nos sacaneou muito! E foi dessa eterna mania de não aprendermos com o passado, de repetirmos as mesmas experiências frustradas, que chegamos ao Brasil de Hoje, confuso, ilógico, cada vez mais perdido dentro de si mesmo. 

Falo disso porque me deparo com a notícia, no caderno cultural da Folha de São Paulo, dos 25 anos do longa Terra estrangeira, da dupla Walter Salles e Daniela Thomas, provavelmente um dos filmes da retomada do cinema nacional que melhor falaram desse nosso país contraditório. E ainda: o filme foi restaurado para exibição na Mostra de cinema de São Paulo. Um deleite só! 

Acompanhamos a história de Paco (Fernando Alves Pinto), um ator fracassado à procura de um novo caminho e sua mãe, Manuela (Laura Cardoso, simplesmente fantástica), cujo maior sonho é voltar à sua terra natal, San Sebastián, na Espanha, tendo em vista a desilusão com o Brasil. Contudo, seus planos são drasticamente interrompidos com a notícia do confisco das cadernetas de poupança durante o governo Collor. Mais do que isso: Manuela enfarta e tomba ali mesmo, no sofá. 

Devastado pelo luto e pela falta de perspectivas no mercado de trabalho, Paco decide ir embora para Portugal. E conhece Igor (Luís Mello), o estereótipo vivo do trambiqueiro, que decide contratá-lo para que ele entregue à Miguel (Alexandre Borges), um músico de formação, mas que vive de pequenos contrabandos, um pacote contendo um violino. Ao chegar à terra lusitana descobre que Miguel está morto e se encontra com Alex (Fernanda Torres), a namorada dele, que trabalha num reles botequim. E juntos precisam aprender a viver nessa terra cheia de contradições, enquanto fogem dos assassinos de Miguel. 

Terra estrangeira é um filme que tem como primeira prerrogativa a ideia de deslocamento. Têm-se a sensação, a todo momento, de que seus personagens estão numa espécie de autoexílio, motivados pela desilusão com suas vidas e, logicamente, o país de onde vieram. Entretanto, mesmo o tão idolatrado Portugal - fenômeno que se repetiu na atual sociedade, em tempos de crise econômica mundial - lhes mostra uma outra faceta amarga, cheia de inverdades e ilusões. 

É possível ver, transitando pelas ruas, africanos desesperados, à procura de um ganha-pão (quase um prenúncio da onda de refugiados que assola o século XXI) ou mesmo europeus que andam na corda-bamba para sobreviver com muito custo. Não se esqueçam: é cara a vida na Europa e só acredita em milagres ou facilidades quem é completamente ignorante ou ingênuo. E quem não consegue enxergar a realidade no seu próprio país, dificilmente a enxergará em qualquer país para onde vá. Este talvez seja o maior defeito de nós, brasileiros: acreditar que a grama é sempre mais verde no país dos outros. 

Embora sua narrativa se passe nos anos 1990 e tenha sido lançado seis anos depois, em plena efervescência cultural proposta pela nova geração da sétima arte brazuca, o filme de Walter e Daniela nos mostra o quanto o Brasil não amadureceu como deveria. Pior: em alguns aspectos, até piorou - e muito. Hoje em dia nos escondemos sob a alcunha da falsa religiosidade e a mentalidade caduca de quem acredita que armas são a solução para lidarmos com qualquer problema. Quanta falácia! 

Nunca mais assisti a produção e mesmo assim me lembro dela, da ocasião em que a vi no cinema Roxy, como se fosse hoje. Lembro-me de cada detalhe, de cada frame e, por conseguinte, de vizinhos meus que também morreram naquela época, após saberem do confisco, exatamente como Manuela. Foi uma tragédia estarrecedora. Teve gente até que se suicidou!

Recomendo Terra estrangeira às novas gerações de olhos fechados, como recomendaria O auto da compadecida, Carlota Joaquina - princesa do Brazil, Cidade de Deus, O quatrilho e Central do Brasil (finalistas ao Oscar de melhor filme internacional em 1995 e 1999). É certamente das coisas mais corajosas e enfáticas que produzimos em nossa cinematografia da metade dos anos 1990 para cá. E mesmo correndo o risco de ser apedrejado pelos cinéfilos fanáticos e os fabricantes de mentira da nova era, coloco-o junto à produções como Terra em transe, Ganga Zumba e Macunaíma. A dupla fez por onde o seu lugar entre eles!

Mas como nem tudo são fábulas ou alegrias, fica a retumbante tristeza de o país não ter evoluído ou aprendido com os ensinamentos propostos pelo longa. Quem sabe um dia! (ou será que eu tenho mais é que tomar vergonha na cara e parar de viver de delírio e sonho?). Sei lá... Nessas horas o meu lado esperançoso ainda fala - ou sussurra - um pouquinho. 

P.S: ouvir Vapor barato, de Jards Macalé e Waly Salomão, na voz indiscutível de Gal Costa já vale metade desta experiência cinematográfica. 




quarta-feira, 20 de outubro de 2021

O ontem nunca foi tão prazeroso


Em tempos de aquecimento global, gentrificação, racismo estrutural, tecnologias portáteis e mercantilização da fé, a sensação que a parte "lúcida" da sociedade tem é a de que o tempo da simplicidade passou. Eu mesmo não tenho mais coragem de colocar a cadeira no portão de casa para conversar com os vizinhos, como bem fazia minha avó materna naqueles saudosos anos 1980 e 1990. A violência não permite mais. 

Conversar foi do debate de ideias à guerra ideológica e vazia, onde todos querem vencer todos. O país, e por conseguinte a cidade maravilhosa, ganhou ares de reality show, de competição truculenta e a frase de Andy Wahrol (aquela dos 15 segundos de fama) ganhou ares de imperativo, de obrigação. "Ou tenho isso ou não sou nada". Logo, no final das contas, o que nos sobra é meio que o apego à nostalgia (e eu não consigo entender quem vê a palavra como algo negativo!). Lembrar do que passou nunca foi tão importante como agora. 

E eis que vejo o pesquisador Luiz Antônio Simas falando no canal curta! de seu livro O corpo encantado das ruas. A capa da obra - uma alusão aos saquinhos de doce de Cosme e Damião - é uma provocação por si própria, quase um tapa na cara dos moralistas religiosos de plantão. Fico encantado na hora e vou à luta atrás de um exemplar para mim. 

Como tudo o que é bom nesse país à deriva a dificuldade se apresenta, perco tempo em livrarias, fuço sebos, viro a internet de cabeça para baixo e somente agora consigo degustar esta pequena obra-prima disfarçada de livro. E recomendo de olhos fechados para todos os que estão lendo este humilde artigo. 

O autor é um óbvio amante do subúrbio e do cotidiano carioca e intercala através de crônicas enxutíssimas aquilo que, não importa o quanto neguem, sempre foi o melhor da nossa cidade: o simples, o improviso, a gargalhada. E esta mesma cidade agora, comenta ele, passa por um processo grotesco de elitização, pois favorecer os pobres (na visão de certa parcela do país) é, no mínimo, empobrecer a nação. Tristes tempos, eu sei... 

Festa, feira, rua, malandro, pombagira, caboclo, futebol, João do Rio, terreiro, história, passado, presente, carioquismo, pobres, elitização, monarquia, república, Zé pelintra, botequins, funkeiros, vagabundos, carnaval, pernada, afago, orixás, encruzilhadas, samba, credo, fala, corpo, choro (tanto a lágrima como a música), São Jorge, beleza, sofisticação, encontro, Cosme e Damião, despacho, axé, ogã, feijoada, destruição, África, subúrbio, reformas, Tia Ciata, bêbados, retirantes, cordelistas, capoeiras, beatas, rezadeiras, pipas, porrinha, Kichute, memória, copa do mundo, Maracanã, jogo do bicho, Cacique de Ramos x Bafo da onça, Cordão do bola preta, festa da Penha, Parque Shangai, azeite de dendê, desfile, Zé Pereira, Rei momo, Marques Rebelo, Mangueira (a árvore e a escola de samba), J. Carlos, Quinta da boa vista, carrocinhas, São cipriano, reveillon, erês, criança tocando o rebu, favela, churrasquinho, geraldinos e arquibaldos, Lima Barreto, cidade maravilhosa, mooyo, Wilson das Neves, umbanda e candomblé, Duque de Caxias, Kizomba, exu... tudo converge para a criação de uma interessante cartografia de um Rio de Janeiro que parece ter desaparecido. Tomara que não.

Por outro lado, Simas não deixa de mencionar (e criticar) eventos recentes ocorridos na cidade e que merecem mais atenção por parte dos cariocas alienados. Seja o assassinato da deputada Marielle Franco, seja o incêndio devastador no Museu Nacional, ou mesmo a mentalidade odiosa de certas vertentes da igreja evangélica que teimam em impor sua fé aos demais dogmas, promovendo uma brutalidade sem precedentes no país, mostram de forma nua e crua o lado desgostoso do intelectual com o país. E isso precisa mudar - diz ele em algum momento - urgentemente. 

Quando o tema que ganha o protagonismo nas páginas do livro é o futebol ou o samba, O corpo encantado das ruas aumenta o fôlego e vira registro de um apaixonado, conhecedor metódico dos mais diversos estereótipos e influências que fizeram dessa cidade um caldeirão cultural, a despeito daqueles que teimam em enxergar a terra de Noel Rosa, Cartola e Pixinnguinha como um mero resort internacional, de preferência falado na língua de Shakespeare. 

Quando termino a última página e guardo com carinho as dicas oferecidas entre as referências bibliográficas (que eu recomendo que sejam procuradas também, com paciência), vejo na experiência obtida apenas um mísero defeito: o livro poderia ser maior. Ele tinha bagagem para isso e com folga.  

Desde Areias escaldantes, de Scarlet Moon, que eu li coisa de uns 15 anos atrás, eu não me deparava com um livro tão cheio de boas ideias, capaz de levar minha formação cultural a um outro patamar. E assim como lá, fiquei mais uma vez com a clara impressão de que o ontem, critiquem o quanto quiserem os imediatistas, nunca foi tão prazeroso quanto agora. 

Vão atrás também e tirem suas próprias conclusões! 


sábado, 16 de outubro de 2021

O paraíso definitivamente não é aqui


Conhecem aquela expressão "viver é precioso"? Então... Levando-se em consideração o que tem sido o século XXI e a demolição de certos conceitos e estruturas até então vistas como eternas, essa frase ganhou uma conotação ainda maior e mais assustadora. A sensação que eu tenho às vezes é a de estarmos vivendo nossos últimos instantes como civilização. E tudo isso é tratado pelo ser humano médio como uma grande brincadeira ou celebração. 

O desrespeito à vida virou um way of life que se replica cada vez mais rápido com a "ajuda" das redes sociais e reality shows que invadem a sociedade todo santo dia. E o que nos sobra de lúcido precisa ser vivenciado à máxima potência, pois pode acabar a qualquer momento e nos deixar órfãos de sanidade. 

Parece consulta de desajustado mental com seu terapeuta, mas não é. É o mundo real e suas distorções repetitivas me fazendo pensar a todo momento o que é que eu ainda estou fazendo por aqui. E o diretor M. Night Shyamalan - dos clássicos O sexto sentido e Corpo fechado - me fez pensar nisso novamente e de forma um tanto quanto preocupante com seu novo e misterioso longa, Tempo

Um grupo de turistas se hospeda num resort distante de praticamente tudo no planeta terra e imagina que irá se esbaldar em meio a inúmeras atrações. São recebidos pela gerência do local como se fossem celebridades ilustres, só faltando o tapete vermelho da temporada de prêmios. Após desfrutarem de alguns privilégios do lugar são informados da existência de uma praia privativa, apenas para uso de clientes vip e decidem conhecê-la. E é justamente nesse momento que percebem que suas vidas nunca mais serão as mesmas. 

O lugar que se prometia um oásis refrescante começa a mostrar sinais inquietantes quando os turistas começam a envelhecer numa velocidade espantosa. E não somente isso: Algumas das pessoas, que possuem condições de saúde específicas (uma delas possui um tumor, outra sofre de epilepsia) veem seus casos serem agravados. Com o passar das horas, descobrem que a cada 30 minutos eles envelhecem o correspondente a um ano de vida. Logo, no final do dia, muitos deles já terão falecido. 

E o resultado dessa informação é puro caos: assassinato; os filhos pequenos crescem, se relacionam, engravidam, sofrem aborto; a pessoa de mais idade na ilha sofre um enfarto, o médico que acompanha o grupo enlouquece; um perde parte da audição, outro perde parte da visão... Toda a rotina deles é abalada, pois o tempo que possuem de vida foi significativamente alterado e a única salvação é fugir da ilha, mas isso também é um problema de difícil solução. 

Entretanto, o que a película de Shyamalan tem de mais valioso é levar em consideração o que era a vida dessas pessoas antes de chegarem à ilha. Trata-se de um grupo que embora aparente estar bem resolvido, estar em paz, percebe-se logo de cara que vivem de forma infeliz ou desperdiçada. Um casal vive à sombra do adultério, o outro é um mescla de uma mulher que nunca enxergou a vida além da própria beleza e o marido, cansado por uma existência estafante e repetitiva. E quando o desfecho, o motivo pelo qual a ilha existe, é enfim esmiuçado para os espectadores, uma certeza é visível: a de que estamos vivendo em torno de nossas próprias ganâncias e comodismos. 

E nenhum paraíso terrestre ou ponto turístico mudará essa realidade, não importa o quanto você sonhe ou deseje isso! 

Tempo é uma grande parábola sobre a vida, a crise humana e as eternas escolhas equivocadas e nonsenses que fazemos ao longo de nossas jornadas. Passamos tanto tempo contabilizando patrimônios e emoções que não nos damos conta do simples, do verdadeiramente útil, daquilo que é válido. Estamos, enfim, registrando nossa passagem aqui pela terra como calculamos balancetes patrimoniais ou fazemos a declaração do imposto de renda. E isso é por demais assustador!

Desde A vila - realizado pelo diretor 17 anos atrás - um filme de Shyamalan não mexia tanto comigo. O tema presente nas entrelinhas da trama é de uma realidade assustadoramente autêntica. E o pior: vai ter gente saindo do cinema dizendo que tudo não passa da cabeça de um artista desmiolado, tamanha a alienação e o negacionismo vigente nos tempos atuais. Mesmo assim, convido os leitores dessa crítica a darem uma chance ao filme. 

É, com folga, uma das melhores coisas que eu assisti esse ano em termos de sétima arte. A questão primordial é: diferentemente dos blockbusters vazios e repletos de CGI você precisa enxergar além do óbvio. E isso, atualmente, é para um grupo seleto de espectadores.   

terça-feira, 12 de outubro de 2021

Pai nosso que estás no Rio de Janeiro


Enquanto alguns habitantes da cidade maravilhosa se ressentem da chegada à terceira idade e começam a dar piti aos 60 anos, reclamando de tudo, dores, velhice, locomoção lenta, perda da memória, cabelos brancos etc etc etc, uma figura notória de nossa cidade chega às nove décadas com corpinho de... (melhor pular essa parte!). Falo - e com orgulho - da estátua do Cristo Redentor que hoje completa 90 anos de pura fé e esperança. 

Localizado no Morro do Corcovado à 710 metros de altitude, com 38 metros de altura e pesando 1145 toneladas, o monumento (um dos maiores no estilo art déco no mundo) abençoa lá de cima a cidade que cantou Vinicius, Caymmi, Noel Rosa e Roberto Carlos. E acreditem: nos últimos anos andamos precisando, e muito!, dessa benção. 

Embora tenha sido inaugurado em 1931 a ideia começa a nascer mesmo em 1859 quando o padre Pedro Maria Boss, capelão do Colégio Imaculada Conceição (em Botafogo) decide erigir na capital do império um monumento de exaltação à fé cristã. Contudo, a autorização para a construção só sairia em 1º de junho de 1922, por vontade de Homero Baptista, então Ministro da Fazenda, e sua pedra fundamental lançada meses depois, em outubro. 

O empreendimento passou por uma série de revezes, pois mais de um projeto foi oferecido e mudanças precisaram ser feitas ao longo dos anos. Na concepção inicial, por exemplo, a figura de Jesus Cristo empunharia em sua mão direita um globo e na esquerda uma cruz. Mas a proposta acabou recusada e, ao final, o desenho escolhido foi o do professor de gravura e desenho do Liceu de artes e ofícios do Rio de Janeiro, Carlos Oswald. Entretanto, um especialista em estatuária, o artista francês de origem polonesa, Paul Landowsky, foi chamado para ajudar na construção. E mesmo com tantas reviravoltas, a mobilização popular na época foi grande (o que prova o quanto a devoção católica já era imensa naquele período).  

No dia da inauguração o físico Guglielmo Marconi, inventor do telégrafo, ligou os refletores da estátua da Itália, porém conforme informações do site do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), o sistema não funcionou como o esperado, e o Cristo acabou sendo iluminado graças à habilidade do engenheiro Gustavo Corção e sua equipe. 

Ao longo das décadas a estátua foi alvo de grandes homenagens e polêmicas. Durante uma edição do programa Criança Esperança, o comediante Renato Aragão fez questão de subir no monumento para tocar numa das mãos do Cristo. Já em 1989 o carnavalesco Joãosinho Trinta trouxe no enredo "Ratos e urubus, larguem a minha fantasia", da Beija-flor de Nilópolis uma escultura do Cristo mendigo e sofreu severas críticas por parte da Arquidiocese, responsável pela gestão do Cristo Redentor. Resultado: a estátua desfilou no sambódromo coberta por uma capa preta e segurando uma placa com os dizeres "mesmo proibido, olhai por nós". 

E ao longo dos anos, toda vez que a cidade do Rio de Janeiro entrou em algum tipo de crise econômica ou política, a imagem do Cristo Redentor foi muito utilizada por chargistas em algum tipo de sátira ou denúncia, seja juntando as mãos em oração, seja com os braços levantados em posição de assalto ou mesmo vertendo lágrimas. E tem sempre quem veja isso como desrespeito ou falta de consideração!

Em 1990, o monumento foi restaurado e em 7 de julho de 2007, o Cristo Redentor foi eleito uma das sete maravilhas do mundo moderno. Ficou em terceiro lugar, atrás da Muralha da China e da Cidade de Petra, na Jordânia. Se grandes artistas e figuras públicas - como Lady Di, Obama, Jim Carrey, o Papa João Paulo II, entre tantos outros - já gostavam de visitar o ponto turístico, depois da premiação isso virou uma espécie de programação obrigatória na cidade. Eu mesmo quando lá estive, coisa de uns 15 anos atrás, fiquei extasiado com a imagem que se vê da cidade lá de cima. 

Digo mais: tive a sensação, em alguns momentos, de estar vislumbrando uma espécie de mundo paralelo. Difícil explicar o que meus olhos realmente viram. E fiquei imaginando então o que se passa na cabeça dos católicos mais fanáticos que visitam o local. 

Resta dizer mais alguma coisa? Sim. Que o Cristo nos viu rir, chorar, celebrar, nos lamentar, rezar - e muito - por uma cidade melhor, mais justa, não refém de modelos religiosos extremistas, agradecer (algo do qual a sociedade, muitas vezes, se esquece porque prefere só reclamar, mandar, exigir), pedir paz e não a guerra, diálogo e não conflito. E, no final das contas, se sentir orgulhoso porque a nossa cidade, essa que tantos falaram mal e preferiram ir embora nos últimos tempos, tem o filho do criador olhando por nós, bem de pertinho. E isso, meus amigos, é pra poucos.   


sexta-feira, 8 de outubro de 2021

O refugiado


Uma vez eu li numa matéria do Segundo Caderno, do Jornal O Globo, o ator Antônio Fagundes comentando de forma decepcionada sobre os vencedores do Prêmio Nobel de Literatura dos últimos anos. Ele dizia: "na maioria das vezes, são pessoas de quem nunca ouvimos falar, de lugares extremamente distantes do planeta. E eles - ou elas - acabam ficando com uma honraria que poderia ser entregue a um Amos Oz ou a um Philip Roth, que infelizmente morreram sem receber o prêmio que tanto mereciam". E eu me vi naquela declaração, pois também tinha um pouco desse olhar. 

Mais: vou morrer me perguntando porque nossa literatura até hoje não teve um vencedor do Nobel na categoria. Afinal de contas, tivemos Drummond, Guimarães Rosa, Clarice Lispector, o teatro de Nelson Rodrigues e o vencedor do Prêmio Camões, o extraordinário Raduan Nassar, de Lavoura Arcaica e Um copo de cólera. Contudo, também é preciso reconhecer que às vezes o completo desconhecido é muito bem vindo, principalmente no que diz respeito à esmiuçar as mazelas desse século XXI devastado pelo acúmulo de contradições e os abusos do capitalismo selvagem. 

E esse parece ser exatamente o caso do escritor Abdulrazak Gurnah, escolhido ontem como o Prêmio Nobel de Literatura de 2021. Só para constar: mais uma vez um autor que AINDA não foi publicado em nossas terras. 

A vida de Gurnah já vale por si só um bom livro: ele deixou o seu país, a Tanzânia, aos 18 anos de idade em direção à Inglaterra, no final da década de 1960. Na ocasião, sua terra natal, liberada do domínio britânico em 1963, enfrentava um golpe de Estado que levou à opressão e ao massacre de cidadãos de origem árabe, a minoria do país. Por conta disso, ele foi forçado a deixar a família e se refugiar nas terras de seus colonizadores para seguir com os estudos (donde só regressaria à pátria em 1984, um pouco antes do pai falecer). 

Estudou em Canterbury e, posteriormente, na Universidade de Kent, onde lecionou inglês e literaturas pós-coloniais. Passou também pela Nigéria, onde deu aulas na Universidade Kano, entre 1980 e 1983. E foi entre uma aula e outra que descobriu a paixão pela literatura. Já a escrita, mais especificamente, ele viu despertar dentro dele quando tinha 21 anos e não parou mais. Porém, nunca se viu como um autor clássico, de carreira, desses que sonhava se tornar escritor desde que se entende por gente. Segundo seu próprio conceito, ele é mais uma pessoa que junta ideias do que cria ilusões ou fantasias. 

E o principal: deu voz aos excluídos, refugiados e andarilhos à procura de um novo lugar para morar. 

Gurnah foi, desde cedo, um estranho lidando com as dificuldades de encontrar o seu próprio caminho, tendo de refazer sua história a todo momento. E isso é certamente sua maior influência literária. O garoto que leu de Shakespeare ao Alcorão, passando pelas Mil e uma noites e o também vencedor do Nobel V.S. Naipaul, já mais velho narrou os efeitos do colonialismo, o desterramento das populações africanas e nos apresentou a diálogos que fogem (e muito) da velha dicotomia opressor x oprimido. Em seus dez romances e inúmeros contos publicados, os personagens nunca são simplesmente bons ou maus. São apenas humanos. Logo, passíveis de dúvidas. 

Dentre os artigos que li sobre o autor na internet, suas obras mais celebradas parecem ser Paradise - publicado em 1994 -, que é seu romance mais conhecido, nos trazendo uma visão afrocêntrica da história, indicado ao Booker Prize e, dizem, determinante para sua escolha como vencedor do Nobel esse ano e Desertion - lançado em 2005, muito celebrado pela crítica literária e que nos apresenta uma narrativa sobre amores proibidos. 

Entretanto, para aqueles que preferem ler algo do autor publicado em língua portuguesa, enquanto ele ainda não dá as caras aqui pelo Brasil, recomendo By the sea (de 2001) que foi lançado em Portugal com o título de "Junto ao mar" e, segundo especialistas do mercado editorial, é sua obra mais autobiográfica e, por isso mesmo, acredito que deva ser uma das primeiras a aparecer em nossas livrarias muito em breve. 

Agora só nos resta esperar que nossas editoras se mexam o quanto antes e tragam à tona esse "ilustre desconhecido", que desde já me intrigou por apresentar em seu trabalho um tema tão atual e que precisa ser revisto com urgência pelo mundo. E como é bom saber que a Academia Sueca também foi capaz de enxergar isso justo agora!   


terça-feira, 5 de outubro de 2021

Vampiros no cometa Halley


Eu sinto muita falta da época em que o cinema mundial não se levava tão a sério e não perdia tempo com produções multimilionárias que só servem para dominar o circuito exibidor e gerar continuações ainda mais contraditórias do que o projeto original. Era fácil sentar no sofá de casa naquele tempo e acompanhar as madrugadas de Supercine, Corujão e Sessão de Gala para ser surpreendido por algum longa trash ou completamente fora de si. 

E cabe um adendo aqui: a minha geração foi muito influenciada pelo gênero terror e as ficções científicas B por conta disso, desse descompromisso com a ideia de "megaprodução". Fugir da zona de conforto e apresentar ideias completamente estapafúrdias dialogava melhor com os adolescentes e nerds daquele período. 

E nesse sentido o filme Força sinistra, do diretor Tobe Hooper (de clássicos do cinema como Poltergeist: o fenômeno, O massacre da serra elétrica e Pague para entrar, reze para sair) cumpre bem o seu papel ao entregar para o público um dos filmes mais insanos - e nem por isso menos divertido - daquela década; 

A trama é o mais surreal possível e ainda assim a cara da década oitentista: um grupo de astronautas descobre no interior do cometa Halley (isso mesmo!) uma nave cheia de alienígenas fossilizados e um trio de humanoides dentro de sarcófagos de cristal. Abismados com a descoberta, decidem trazê-los para a terra e é justamente nesse momento que a tragédia global começa a se formar. 

Ao chegar a base os humanoides começam a atacar os seguranças da instalação e roubar sua energia vital (basicamente, eles têm as suas vidas sugadas pelos alienígenas). A líder do trio - vivida pela belíssima Mathilda May - foge do local e começa a fazer outras vítimas ao redor do Reino Unido, juntando forças para um encontro final com uma nave de seu planeta que está vindo para a terra. Contudo, ela mantém uma espécie de elo sexual com o líder do grupo de astronautas, o Coronel Tom Carlsen (Steve Railsbeck) e isso pode atrapalhar seus planos...

E eis que eu chego naquele ponto em que pergunto aos leitores desta crítica: vocês ainda querem saber mais sobre a trama ou posso parar por aqui?

O longa de Hooper é inspirado no romance Vampiros do espaço, do escritor Colin Wilson, que eu confesso que li quando estava na casa dos meus 12, 13 anos e achei completamente nonsense. E por isso mesmo é a justa representação do que foram aqueles loucos anos 1980. A própria ideia, nas entrelinhas, de desconstruir a figura do vampiro Drácula, de Bram Stoker, levando o personagem a um patamar mais debochado, já aguça a curiosidade dos espectadores. Pelo menos a minha, na época, aguçou. 

Entretanto, é facilmente reconhecível que a história é confusa, se perde a todo momento, seu desfecho é extremamente abrupto e muitos dos que compareceram ao cinema para conferir a produção só estavam ali para ver a bela Mathilda May completamente nua, no auge da sua beleza, em grande parte do filme. Ah! Quase ia me esquecendo: ainda tem a participação curta do ator Patrick Stewart, o eterno Capitão Picard da franquia Star Trek.

E como poderia ser diferente se o público-alvo da produção eram jovem alucinados no auge da sua testosterona e cujo único objetivo na vida eram farras, o carro do pai emprestado e a perda imediata da virgindade? Deu no que deu. Junto com A bolha assassina e o também surreal Shocker: 100 mil volts de terror, Força sinistra meio que compõe uma trilogia do inusitado quando o tema em questão é terror + ficção científica. 

E os fãs mais exagerados sempre que podem procuram o filme para rever em algum serviço de streaming ou site pirata mais perto!