Num país de maioria não-leitora como o nosso quem decide resistir e ler procura sempre por bons textos e autores. Ficcionistas, jornalistas, ensaístas, intelectuais, não importa... Você, leitor de carteirinha, sempre procura quem valha a pena dedicar o seu tempo livre. Quando um autor de quem você gosta muito, por quem tem admiração aberta, parte é uma dor aguda. E sua primeira pergunta, na maioria das vezes, é: "o que é que eu faço agora para substituir essa senhora ou senhor extraordinário?". E quase sempre você não encontra substitutos à altura.
Hoje, mais uma vez, será um desses dias...
Na noite de ontem desliguei o computador, fui para a sala, falei com minha tia e me deparei com a notícia (dada no Fantástico) da morte do jornalista Artur Xexéo, aos 69 anos. Ele havia recentemente descoberto que tinha um câncer do tipo Linfoma não-Hodgkin e vinha lutando bravamente contra a doença. Uma pena.
Eu disse jornalista? Isso somente não explica quem foi Xexéo. Jornalista, colunista, cronista, dramaturgo, comentarista, jurado... Era difícil explicar esse senhor de jeitos tímidos e inteligência aguçada. Porém, antes de tudo isso acontecer ele precisou descobrir que a faculdade de Engenharia definitivamente não era para alguém como ele. Seu acanhamento e desejo de falar sobre arte e cultura falaram mais alto e se encontrou no jornalismo.
Jornal do Brasil, Veja, Isto é e O Globo tiveram a honra de ter em suas páginas seu faro aguçado e seu jeito ímpar de escrever. Enquanto ouvia declarações emocionadas de quem o conhecia e chorou por sua perda, ouvi muitos deles dizendo que Xexéo reinventou a crônica e implantou um novo tipo de jornalismo cultural no país. E eu me peguei pensando: "eu sempre tive exatamente essa mesma impressão".
Xexéo provou por a mais b que o coloquialismo também cabia naquele espaço. Falou de figuras do cotidiano, do dia-a-dia, dessas com quem você, eu e a torcida do flamengo esbarramos nas calçadas, avenidas, becos e viadutos. Para ele, tudo poderia ser assunto para um bom artigo. E foi por causa dessa característica que eu decidi lê-lo sempre que pude. Ele com certeza também ajudou a formar culturalmente esse arremedo de crítico que por aqui escreve de forma quase doentia.
No JB foi editor do Caderno B e reformulou a revista de domingo, suplemento cultural da publicação. Em O Globo foi responsável pelo Rio Show e posteriormente o Segundo caderno, justamente a minha parte preferida do jornal desde sempre. Não bastasse isso foi comentarista da cerimônia do Oscar e de cultura e cotidiano do programa Estúdio i, na Globo News (em ambos, ao lado da também jornalista e amiga Maria Beltrão). E ainda arranjou tempo para participar da bancada de jurados do quadro Dança dos famosos, no Domingão do Faustão.
E antes que vocês, leitores, digam que já está de bom tamanho... Não, não acabou. Xexéo também enveredou pelo teatro e a literatura. Para os palcos, escreveu os musicais A garota do biquíni vermelho (2010), Nós sempre teremos Paris (2012) e Minha vida daria um bolero (2018), além da dramaturgia de Cartola - minha vida é um moinho e a adaptação para o português do clássico de Alice Walker, A cor púrpura.
Já para o mercado editorial ele publicou Janete Clair - a usineira de sonhos, sobre nossa maior novelista; O torcedor acidental, compêndio de crônicas sobre suas coberturas para as copas do mundo e seu volume mais famoso, a biografia sobre a cantora e apresentadora de tv Hebe Camargo, que virou um fenômeno de vendas, chegando a render uma série televisiva.
E isso tudo porque era um "comunicador acanhado", como muitos que trabalharam com ele gostavam de nomeá-lo! Só faltou dirigir um longa-metragem.
Em uma postagem de Merval Pereira, colega de O Globo, para o instagram, ele diz que com a partida de Xexéo o Brasil - esse que tem se esmerado, nos últimos anos, em destruir a cultura de forma covarde - piora. E eu concordo de olhos fechados. O país que lê (e esse é o que mais me interessa) perdeu bons textos, boa leitura, ficou mais pobre culturalmente. E nós não merecíamos isso. De novo, não.
Fica com Deus, Xexéo. Você fez por onde!
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