A morte como "a única certeza que nós temos na vida" é uma catarse cruel, porém necessária, principalmente num mundo cuja sociedade se recusa a olhar para os lados e se foca única e exclusivamente no próprio umbigo (leia-se: poder, status, riqueza, etc). Entretanto, quando se trata da morte de um filho ou ente querido a história muda completamente de figura e temos o costume de rever esse conceito. É exatamente o que acontece com Louis no extraordinário Três sombras, hq de Cyril Pedrosa.
Ele vive com a esposa, Lise, e com o filho Joachim num lugar à parte do mundo. Lá, criam suas próprias regras e fazem suas próprias escolhas baseadas no bem-estar e num estilo de vida alternativo. Pelo menos assim era até que surgem três sombras, que Louis acredita que ali estão para levar Joachim embora.
Não disposto a permitir tal ato ele foge com o filho numa viagem que mostrará a ele o melhor e o pior da humanidade em proporções quase idênticas. A todo momento ele será posto à prova, traído, enganado, usado, dentre outras artimanhas sórdidas, mas também vislumbrará pílulas de grandeza em determinados exemplares humanos. Contudo, o desfecho dessa saga não será nem de longe aquilo que ele imagina.
Cyril Pedrosa é um artista sublime. Já foi animador dos estúdios Disney e trabalhou em longas como O corcunda de Notre Dame e Hércules. E aqui nos entrega uma graphic novel muito bem acabada que mescla bem sentimentos e estruturas. Num clima mezzo fábula mezzo tragédia acompanhamos essa jornada desesperada de pai e filho em busca de respostas que talvez nem existam num mundo dito normal.
O problema: o mundo nunca quis de fato ser normal. Ele prefere, isso sim, ser um desafio constante e precisamos estar preparados para abrir mão de nossos maiores sonhos a qualquer momento ou, no mínimo, lutar com unhas e dentes, até a morte se necessário, para realizá-los.
Só não digo que fiquei totalmente realizado com a leitura porque - confesso -me bateu uma curiosidade a respeito da escolha do autor pelo preto e branco. Gostaria muito de ter visto o trabalho a cores (e o traço de Cyril é tão poderoso! com certeza o resultado final teria sido um escândalo).
Ao fim dessa experiência apenas uma pequena (e inebriante) certeza: a de que vida e morte são nada mais do que capítulos e eles nunca duram o tempo que nós gostaríamos que eles durassem. Mas nem por isso eles são menos poderosos e, consequentemente, necessários.
Uma excelente opção para quem procura uma boa leitura na nona arte fora do universo heróis e histórias sobrenaturais. Procurem!
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