Assisti Napoleão, de Ridley Scott, e saí do cinema num sentimento misto de decepção e estranhamento. O projeto já prometia (no mau sentido) por conta dos comentários raivosos do diretor à críticas de historiadores acerca de "incongruências históricas" na produção. Deu no que deu.
Um anexo importante: saí da sessão me lembrando de um outro drama histórico de Ridley, Cruzada (com Orlando Bloom e Eva Green), que também me desapontou muito na época de seu lançamento. Em ambos os casos o cineasta passa anos-luz do brilhantismo de seus melhores trabalhos (Alien - o 8º passageiro, Blade Runner, Os duelistas, Thelma & Louise, etc).
Em vários momentos do filme a narrativa me lembrou das antigas Enciclopédias Barsa e do Almanaque Abril que vendia nas bancas de jornal. Por quê? Um compêndio de resumos sobre fatos históricos os mais diversos se sobrepondo de forma atabalhoada, por vezes sem sentido.
A edição do longa daria um grande estudo de caso sobre "como não realizar um longa cinematográfico" e tive a nítida sensação de que interferiram diretamente no trabalho do profissional. Sério. Não acredito que alguém como, por exemplo, a fenomenal Thelma Shoemaker, parceria de anos do Scorsese, permitisse tamanha intrusão por parte da produtora no seu processo.
Até Joaquin Phoenix (que tenta dar vida à Napoleão) parece completamente perdido em meio à batalhas épicas e uma cinematografia escura em demasia. Era isso mesmo, Ridley? Você não queria que nós víssemos alguma coisa? Foi o que me pareceu em várias sequências.
A morte de Maria Antonieta na guilhotina, Napoleão no Egito em meio às pirâmides, Maria Josephine e seus adultérios, Invasão da Rússia, Revolução francesa, a batalha de Waterloo... Tudo parece tão zoneado, simplesmente jogado diante de nossos olhos, sem que tivéssemos ao menos tempo para refletir minimamente sobre o contexto. Quer dizer: caso houvesse contexto. No final o que sobra é um épico só até a página 2, repleto de erros grosseiros e clichês.
Não me surpreenderei caso o longa fature algum prêmio no Framboesa de Ouro. Seria merecido, principalmente pelo desleixo com a forma e a falta de respeito para com os fãs do gênero, que aguardavam esse projeto há bastante tempo. Não recomendo a ida ao cinema. Quem preferir aguardar a famigerada versão de 4 horas prometida no streaming, fique à vontade. Mas acho difícil que melhore tanta coisa assim.
O próximo longa de Ridley Scott será Gladiador 2. Sai Russell Crowe, entra Paul Mescal na pele do protagonista, com direito à presença ilustre de Denzel Washington. Mas confesso: tenho receio do que vem por aí...