Li um escritor certa vez (para ser mais exato era um jornalista investigativo, embora não me recorde com precisão do nome do autor) que falava da enorme dificuldade de dimensionar uma guerra ou um conflito bélico de qualquer natureza. "Não se tem a noção exata de quando ela começa, de como termina, ou mesmo no que ela irá transformar o mundo. Só podemos, isso sim, esperar morte e caos". Estava coberto de razão.
Contudo, entre aqueles que cobrem a guerra de perto, testemunham seu horror - refiro-me à fotojornalistas, cinematógrafos e outros profissionais da imagem - é preciso reconhecer seu talento e exatidão ao retratar tragédias desse porte. Evandro Teixeira, um de nossos maiores nomes da fotografia, é sem dúvida (e com folga) uma dessas pessoas extraordinárias.
Essa semana fui conferir no Centro Cultural Banco do Brasil a exposição Evandro Teixeira, Chile, 1973. E saí de lá sem chão, plenamente derrotado, mas consciente de estar diante de um documento histórico da maior importância para o mundo.
Em meio a salas repletas de quadros e totens acompanhamos (melhor dizendo: voltamos no tempo, cinco décadas) o terror daqueles dias que antecedem o período ainda mais tenebroso do governo Pinochet.
Nunca consegui entender quem chama de revolução algo que só serve para castrar o pensamento, o debate, o direito de ir e vir. Hipocrisia condiz melhor com o conceito! E a lente de Evandro capta com genialidade a dureza e o inconformismo daqueles dias.
Cidadãos mutilados em seus direitos civis; presos políticos encarcerados no subsolo do Estádio Nacional, em Santiago; jovens presos simplesmente por quererem questionar, divergir, não se bastando a serem marionetes de um sistema torto; tanques nas ruas intimidando a população... E tudo, segundo a visão dos opressores, "em nome da moral e dos bons costumes".
São 190 imagens imprescindíveis que englobam, inclusive, algumas cenas marcantes da nossa própria ditadura, como a dos protestos ocorridos por aqui (o mais famoso deles, a marcha dos 100 mil) e a repressão policial na Candelária durante a Missa de 7º dia do estudante Edson Luís.
Na última sala da mostra um adendo de luxo: a cobertura da morte do poeta chileno (e Nobel de Literatura) Pablo Neruda, com cenas que vão desde o corpo na Clínica Santa Maria, sendo velado pela viúva, Matilde Urruti, até o cortejo levando o caixão para "La Chascona", no Cemitério Geral de Santiago, rodeado por populares e manifestantes.
Recomendo não somente aos estudantes de história como ao público em geral uma passada no CCBB. A expo fica em cartaz até 13 de novembro. Trata-se da guerra em seu estado mais puro, muito além de disparos, explosões e execuções sumárias. A guerra em preto, branco e muito sangue. E mesmo quando ele não está ali, explícito, é possível sentir seu cheiro, ver o quanto de dor ele provocou.
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