quarta-feira, 13 de setembro de 2023

Um tapa na cara da própria MPB


Uma certeza quando escrevo sobre música (e nesse caso, música foda!) sempre me acompanha: a indústria fonográfica é uma incógnita. Quando começamos a entender o papel dela, ela muda tudo e nos surpreende de novo, nos joga de quatro no chão. E só nos resta rever nossas expectativas, também de novo. 

A primeira, a segunda, a terceira, todas as vezes que ouvi o disco tema desse post, fiquei com aquela sensação de "porra! isso aqui é a MPB!". E com o passar das décadas uma outra se agregou a esta. A de que a MPB virou uma reles caricatura perto do que ela já representou no auge. 

50 anos se passaram e o álbum do Secos e Molhados permanece não somente relevante como único dentro da nossa história musical. E até hoje eu não consigo entender os haters desse trabalho magnífico em todos os sentidos. Provavelmente preferem perder tempo com ruídos, caras e bocas.

Os falsetes de Ney Matogrosso, o baixo indecente de tão espetacular, a mistura de ritmos, um clima meio de egotrip, viagem de LSD, o deboche ao regime político vigente na época, as canções precisas se enfileirando (com todas as metáforas e ironias possíveis e imagináveis)... Uau! 

No quesito tracklist fica até difícil manter a coerência e não ser, no mínimo, fanático porque... as faixas são um tapa na cara do ouvinte e da própria música brasileira. De "Rosa de Hiroshima", poema de Vinícius de Moares, à quase cantiga de roda "Rondó do capitão"; do reacionarismo puro de "O patrão nosso de cada dia" e "Assim assado" à exuberância dos eternos clássicos "Sangue latino", "O vira" e "Fala". 

A banda grita mesmo quando escande a palavra de forma macia, às vezes num tom que remete ao infantil. E tudo isso realizado em pleno período árido da ditadura, tempos de A.I: 5 e muita mordaça, seja cultural, seja do ponto de vista social.   

Saber que eles não estão mais juntos, produzindo, dá uma enorme tristeza, mas... Faz parte! Artistas não são ciências exatas e o tempo que eles tinham para fazer história era esse mesmo, pré-determinado. A banda se foi, mas o legado se encontra aí, vivo, cada dia mais lúcido, nítido, e conquistando novas gerações. 

Meio folk, meio progressivo, meio rock na veia, mas principalmente: todo brasileiro. Fosse produzido no mercado internacional entraria com folga num hall da fama made in USA. Infelizmente, o vira-latismo nosso de todo dia às vezes atrapalha a percepção de alguns. Uma pena! 

Mas chega de falar. Ouçam! Ouçam agora! Parem tudo e ouçam essa obra-prima! São 5 décadas de revolução sonora. Não é pra qualquer um, não! 


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