terça-feira, 10 de setembro de 2024

Entrevista é isso aqui


Adoro entrevistas, mas é triste ter que dizer: o formato foi engolido por falsos entrevistadores e videocasts que não passam de mais do mesmo e clubinhos de amigos. A parte show da expressão talk show parece interessar mais às emissoras, anunciantes e influencers (o que é uma pena!).

Entretanto, ainda é possível se deparar com ótimas entrevistas no formato livro e o mérito disso é todo do próprio autor-entrevistador, que precisa estar disposto a virar o mundo de ponta a cabeça com frequência. Em se tratando de cultura pop, então, a missão é ainda mais árdua e meticulosa, com cara de andar no gelo fino. Mas me parece que o escritor e jornalista Neil Strauss conseguiu com garbo realizá-la. 

Seu livro, Fama & loucura: entrevistas censuradas com os maiores artistas do planeta, é um primor do início ao fim, incluindo as partes mais polêmicas e espinhosas e, claro, seu deboche natural. 

Neil apresenta sua obra como "uma comédia em 10 atos" e opta por mesclar as entrevistas em grupos distintos. Portanto, não esperem por precisão cronológica, pois esta não é a intenção aqui. Pelo contrário. Ele prefere dividir seus entrevistados em grupos por personalidades (algumas mais brandas, outras nada racionais), gerando um resultado que desliza entre o sublime e o anárquico. 

Vemos um pouco de tudo nesse volumão de mais de 800 páginas: Julian Casablancas concedendo a pior entrevista de todos os tempos; Madonna falando sobre sua relação com analgésicos e a morte; o humorista Chris Rock dizendo que Deus e a comédia salvaram ele do crack; Lady Gaga pisando em gelo fino ao falar do homem que amou e a magoou; Christina Aguilera relembrando da violência doméstica dentro da sua casa; Lenny Kravitz evitando comentar se plagiou um riff de guitarra do Led Zeppelin; a musa do punk, Patti Smith, afirmando que ser mãe foi o trabalho mais difícil da sua vida; Tom Cruise perdendo a paciência ao ser questionado sobre a cientologia; Cher e seu produtor explicando passo a passo a concepção por trás do hit "Believe"; ICE-T mostrando o pênis para o entrevistador; Bryan Adams dizendo vá se foder pra tudo e todos... e muito, muito mais.

Além das entrevistas propriamente ditas, ainda há textos sobre máfia, racistas, roadies, obituários, coisas que o autor ouviu pela rua, de pedestres e anônimos, uma grande homenagem ao escritor e crítico cultural Paul Nelson, um momento Prince sendo Prince (e só isso já rendia um segundo volume) e algumas "instruções de vida" valiosas para os leitores. 

Aposto que assim que terminarem de ler esta pérola passarão um bom tempo longe desses canais de youtube que fingem entrevistar famosos, pois pensarão na hora: "sério! que perda de tempo isso aqui!". E não bastasse isso, ainda tomei uma decisão para o resto de 2024 e os próximos anos: procurar por mais livros de entrevistas. 

Minha formação cultural agradece!


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