segunda-feira, 30 de setembro de 2024

Capote, um centenário


As pessoas que eu conheço que dizem já ter lido pelo menos uma vez o escritor Truman Capote volta e meia repetem a mesma frase: "ele é um autor difícil". E eu sempre respondo essa frase com outra: "ele teve uma infância difícil; logo, não espere de pessoas assim uma obra de amenidades, gentilezas, comédias românticas, pois elas são o oposto disso". 

Melhor exemplo não há para começar a falar desse senhor que nos legou o new journalism (ou como preferimos falar aqui no Brasil: o jornalismo literário).

Lembro de quando terminei de ler seu romance mais famoso, o extraordinário À sangue frio, que a crítica classificou na época como "romance de não ficção", sobre o assassinato da família Cluster. A obra consumiu Capote psicologicamente com a mesma intensidade com que o catapultou à fama. 

Os especialistas e entendidos sobre sua vida e obra costumavam acentuar o fato de que Truman se equilibrava entre duas personalidades: a do homem tímido, delicado, quase antissocial e o implacável, ferino, sem papas na língua, e por isso mesmo apto a escrutinar as cicatrizes e os vexames da América. Eu acredito sinceramente que essa ambiguidade foi o grande charme do autor. Ele sabia transitar entre todos os mundos possíveis e com uma naturalidade assustadora. 

Com Música para camaleões muitos acreditavam que ele se encontrava superado, que nunca mais atingiria o mesmo brilho, e no entanto nos entregou um tsunami literário da maior grandeza, mesclando anônimos e celebridades e deixando de lado - para o próprio bem do fazer literário - o anonimato e a imparcialidade.

Já a partir de Bonequinha de luxo (que ganhou adaptação aos cinemas pelas mãos do diretor Blake Edwards e com Audrey Hepburn na pele da garota de programa Holly Golightly) ele nos ensinou que a elegância não é simplesmente uma fórmula pronta, cheia de bons sentimentos e sorrisos. 

Phillip Seymour Hoffman, que o interpretou em Capote, de Bennett Miller (e faturou um Oscar de melhor ator pelo trabalho), soube captar como ninguém suas nuances, sua voz afetada e seu jeito peculiar de viver. E toda vez que eu revejo o longa, penso: "uma pena não termos mais esse moço entre nós, produzindo, desafiando os limites da escrita". 

A chegada do seu centenário no dia de hoje minimiza em parte nossa melancolia por não podermos mais ler nada novo dele. E também me faz pensar no quanto a atual geração está lendo os autores errados e sequer se dá conta disso. Ah, Truman! Se você soubesse a falta que está fazendo nesse século XXI que cada dia mais parece um grande elo perdido!

Tem certeza que não dá pra você voltar, não? Pergunta aí em cima, vai! 


sábado, 28 de setembro de 2024

Brigitte Bardot, 90


Mal comemoramos as nove décadas da musa italiana Sophia Loren e outra musa - esta francesa - também completa a mesma idade. Falo logicamente de Brigitte Bardot, para muitos críticos e amantes da sétima arte mundial a "mulher mais bonita do mundo" (mas me perdoem desde já por não corroborar essa parte, tendo em vista minha eterna paixão por Elizabeth Taylor).

Parece louco pensar que a maior musa do cinema francês trocou as telas de cinema pela causa animal, mas foi exatamente isso o que ela fez (e já tem tempo isso, é bom que se diga!). Eu confesso que tenho uma lembrança de Bardot mais como sex symbol do que como grande atriz. Na verdade, a achava bastante mediana...

O que, claro, não a impediu de estar em projetos que marcaram época tanto na França como no resto do mundo. Prova disso são os longas E Deus... Criou a mulher, de Roger Vadim e O desprezo, de Jean-Luc Godard, duas obras-primas únicas. 

Entretanto, lembramos mais de Brigitte por sua beleza inegável e seu sex appeal devastador do que por suas atuações fortes e poderosas (algo que, provavelmente, encontraremos com mais facilidade dentro da filmografia de atrizes como Bette Davis, Shirley MacLaine ou Katherine Hepburn). 

Mas tudo bem. Assim como apreciamos artistas que entregaram seu melhor nos palcos e nas telas (vide, por exemplo, a antológica Maggie Smith, que faleceu ontem), também nos apaixonamos pelo poder que somente as beldades são capazes de proporcionar. E nesse sentido Brigitte Bardot foi a Marilyn Monroe europeia, ou seja, veio ao mundo para ditar padrões, por vezes, inalcançáveis. 

E não podemos esquecer da ligação pessoal da atriz com o Brasil. Ela morou, no começo dos anos 1960, na pequena cidade do litoral do Rio de Janeiro chamada Armação dos Búzios, então distrito de Cabo Frio. Há inclusive estátua dela na cidade. O que é mais um motivo para que os brasileiros cinéfilos tenham todo um carinho particular pela musa. 

Que ela continue exercendo seu papel - agora não mais como movie star e sim como ativista - e chegue ao centenário. O cinema certamente agradecerá, caso isso aconteça! 


sexta-feira, 27 de setembro de 2024

O programa que definiu o humor nos EUA


Dizendo de forma bem rápida e rasteira: é mais fácil dizer quem não participou do programa do que elencar (sem esquecer alguém) quem lá esteve. Refiro-me ao Saturday Night Live que chegou a sua temporada de número 50, um feito mítico em se tratando de televisão. 

Eu não sou um especialista no programa, muito menos um espectador fanático, mas sempre que sobra um tempo assisto quadros e, de vez em quando, episódios inteiros (sempre no youtube); logo atesto: é fácil entender o fenômeno que se tornou o formato. 

É possível encontrar de tudo no Saturday night live: da ironia fina ao escracho direto. Seja debochando dos debates eleitorais (o último, satirizando o embate entre Donald Trump e Joe Biden, com Jim Carrey e Alec Baldwin na pele dos presidenciáveis, me deixou quase sem ar) ou tirando sarro dos heróis da marvel, ninguém escapa ao radar dos produtores. 

O programa ficou marcado por tornar conhecida toda uma geração de humoristas: Eddie Murphy, Adam Sandler, Richard Pryor, Tina Fey, Chris Farley, Chris Rock, Rob Schneider, Ben Stiller, Bill Murray... E não somente do humor. Praticamente toda a indústria fonográfica norte-americana e hollywood deu as caras por lá. 

Mês que vem será lançado o longa Saturday night, de Jason Reitman, sobre as horas que antecederam a estreia do primeiro programa, e eu desde já estou ansioso para vê-lo (espero que o circuito exibidor aqui no RJ não o boicote ou o coloque em raras salas em locais de difícil acesso). Será possível aos leigos ter uma pequena dimensão da loucura - e da revolução - promovida por seus criadores. 

Atualmente o programa vive uma crise interna por conta do elenco (considerado muito fraco pelos críticos) e dos índices baixos de audiência. Será esta a última temporada e, consequentemente, o fim de uma era? Espero que não. O humor não merece um baque desses.    

No geral, o que fica é o sentimento de estarmos diante de uma façanha que, talvez, nunca mais se repita na tv (seja nos EUA ou no resto do mundo). Em tempos de programas e séries que mal conseguem renovação para uma segunda temporada, permanecer no ar por cinco décadas? Haja fôlego! E também muita coragem e ousadia. 

Que eles mantenham a chama acesa pelo tempo que for. 


segunda-feira, 23 de setembro de 2024

Friends: 6 amigos, 30 anos


Às vezes me assombro com o tempo que certos filmes, peças, livros, programas, etc, têm. Mais do que isso: a certeza de estar envelhecendo mais rápido do que gostaria numa era em que tudo parece se processar à velocidade da luz. 

E me parece que, nos últimos anos, a quantidade de datas comemorativas vem crescendo exponencialmente em importância... Ou será que sou só eu que estou vendo demais? 

Nessa semana o seriado Friends, criado por David Crane e Marta Kauffman, completou 30 anos e eu tomei um susto. Sério? Já tem tudo isso? E olha que eu nem fui um espectador assíduo do programa (embora tenha acompanhado a trajetória deles sempre que pude). Mas é preciso admitir: trata-se de um legado da cultura pop norte-americana. 

Acompanhamos a amizade de Rachel (Jennifer Aniston), Monica (Courteney Cox), Phoebe (Lisa Kudrow), Joey (Matt LeBlanc), Chandler (Matthew Perry) e Ross (David Schwimmer) como se eles fossem da nossa própria turma. No apartamento, no café, discutindo a relação, fazendo festas, tudo e mais um pouco, rimos, choramos, nos frustramos, torcemos por seus dilemas e alegrias. E, no final das contas, é disso que tratam os grandes sucessos da tv americana (pelo menos, na maioria dos casos).

Não vou citar meus episódios favoritos, pois não tenho bagagem fanática para isso, mas posso dizer que da parte que eu assisti, entendo - e curto - toda a exaltação à série por parte do público cativo. Só não concordei com o episódio reunion feito recentemente (e que contou até com a presença da cantora Lady Gaga entre os convidados), pois me pareceu caça-níqueis barato que nem essa mania atual de trazer de volta bandas de rock do passado. Essa parte eu pulo com folga. 

Infelizmente, Matthew Perry nos deixou de forma mezzo melancólica mezzo catastrófica (há notícias escabrosas ainda saindo na imprensa sobre as causas de sua morte, o que é muito triste e que mostra também o quanto holywood e a indústria de entretenimento dos EUA não é nenhum oásis ou mero parque de diversões). Ele certamente ficaria contente com todo esse reconhecimento ao trabalho. 

Ao fim desse breve post posso dizer que não consigo imaginar outra sitcom americana gerando, nos próximos anos, tanta repercussão quanto a do sexteto. Até o conceito de comédia hoje é outro, mais ácido, seco, por vezes desnecessariamente engajado. Vivemos tempos de projetos como Emily in Paris, Stranger Things, Only murders in the building... Será que se começassem hoje, teriam feito o mesmo sucesso? Quem sabe. 

Só espero que não caiam na loucura de rebootar a série, mania insossa dos últimos anos. Certas histórias - acredito eu - é preferível deixá-las onde elas estão. Ou o charme da coisa se perde.    


sexta-feira, 20 de setembro de 2024

Sophia Loren, 90


Fiquei confuso hoje, enquanto escrevia sobre cinema italiano para um projeto literário, se a eterna musa Sophia Loren ainda estava viva ou não e me deparo com uma matéria de jornal mencionando seus 90 anos de vida (e que vida!). Que chegue aos cem.

Loren é, para mim, a maior figura viva do cinema europeu, independente de se ela está trabalhando ainda ou não. Simplesmente não consigo imaginar o cinema produzido na Europa (e não somente a Itália) sem lembrar de sua persona e interpretações que entraram para a história da sétima arte. 

Embora seja vista por muitos como sexy symbol, ela foi das poucas artistas de sua geração que me ganhou como atriz logo de cara (digo isso porque costumo ser reticente com mulheres bonitas sendo chamadas de "grandes atrizes"). E sua carreira, ao contrário do que pensam muitos críticos e entendidos por aí, não se limita à parceria com o amigo Marcello Mastroianni. Longe disso...

Os girassóis da Rússia (meu favorito com ela); A condessa de Hong Kong (sim, ela foi dirigida por Charles Chaplin); El cid; Casamento à italiana; Ontem, hoje e amanhãA queda do império romano; Boccaccio '70; A garota do gângster; até mesmo sua rápida - e poderosa - aparição no musical Nine (uma "remake" do Oito e meio, de Fellini)... ela sempre foi um acontecimento. 

Em seu último longa, Rosa e Momo - uma vida à sua frente (de 2020), ela ainda é capaz de mostrar parte desse brilho nunca replicado por nenhuma outra no cinema. E me fez pensar no quanto nós, cinéfilos, andamos por demais carentes de grandes artistas, principalmente numa época em que poucos trabalham de fato para o público adulto e só querem saber de bilheterias e continuações.   

Em outras palavras: me fez bem lembrar de Sophia, de torcer para ela ainda permanecer viva. A sétima arte mundial agradece - e muito!


terça-feira, 17 de setembro de 2024

50 anos de um delírio chamado de futuro


Quase tomo um susto ao ler uma série de matérias em jornais distintos falando dos 50 anos do filme Iracema, uma transa amazônica, de Jorge Bodanzky e Orlando Senna, que acaba de ser restaurado. Como assim já tem todo esse tempo? É, com folga, uma das coisas mais poderosas que o cinema novo já produziu em sua história e nada deve a clássicos eternos do período como Terra em transe, Vidas secas, A falecida, Os fuzis, etc.

Iracema é o Brasil hoje, agora, nesse exato momento, com todas as suas controvérsias e distorções, porém contado cinco décadas atrás (o que faz do longa, de certa forma, uma espécie de premonição macabra). 

Acompanhamos a saga daquela jovem índia (vivida por Edna de Cássia) e toda a ilusão vendida como futuro, e promovida pela construção da transamazônica - um dos maiores escândalos governamentais da história desse país - com olhos opacos, por vezes marejados de lágrimas. E pensamos na mesma hora: será que algum dia esse país chegará a algum lugar que preste? Ou nunca seremos nada mais do que oportunistas? 

Sebastião - ou, simplesmente, Tião Brazil Grande -, personagem de Paulo César Pereio (brilhante!) é a cara desse país que não é nação, como já bem disse uma vez numa canção o célebre Renato Russo, vocalista do Legião Urbana. Ele é o brasileiro típico, o famoso retrato do "dane-se o país, eu quero é me dar bem ao preço que for". E ao olharmos fixamente para suas tramoias e esquemas sujos, não há como não duvidar do brasileiro médio. Estamos contaminados por essa cultura até o talo. E ai de quem negar!

Nesse Brazil com Z, ame-o ou deixe-o (como se escolher entre uma opção e outra fosse tarefa tão difícil assim!) tudo é negociável e o povo, como mercadoria de escambo, é objeto chulo, baratíssimo, preço de banana, quase 0800. Ai de nós, sobreviventes dessa república federativa...

Numa das análises que li sobre o filme o crítico chama Iracema de "o filme mais contemporâneo do país". E está coberto de razão. Vejam o que acontece na região nesse exato momento. O que mudou? A abordagem. Já os personagens, os agentes da vilania, continuam os mesmos, senão piores. Triste legado o da nossa ignorância, o da nossa mesquinhez. 

O filme de Jorge e Orlando é tão gigantesco que pega até mal eu contar os mínimos detalhes aqui. E eu preciso - mesmo! - que vocês, leitores, vejam. E tirem suas próprias conclusões. Vocês nunca mais verão o cinema nacional com os mesmos olhos preconceituosos e de vira-latas de agora. Se permitam. Isso aqui é uma obra-prima incompreendida. 

Eu queria muito estar vivo quando celebrarem o centenário dela... Será que consigo? Só o tempo dirá (e eu espero que ele me favoreça pelo menos uma vez). 


sábado, 14 de setembro de 2024

A banda que poderia ter sido tudo, mas... o ego falou mais alto


O reencontro (tem quem prefira a expressão reunion) da banda Oasis depois de tantos anos, me fez revisitar seu álbum de estreia, Definitely Maybe, que completa 30 anos em 2024.

Eles abrem o álbum - com "Rock n' roll star" - querendo uma vida fora de padrões, regras estabelecidas, diretrizes em excesso. Vão logo dizendo que não há saída fácil e que os dias estão rápidos demais para eles. A seguir, em "Shakermaker", confessam que gostariam de ser outras pessoas, de estar em outro lugar. E finalmente, em "Live forever", arrematam: "Talvez eu nunca seja todas as coisas que quero ser". 

Só pela trinca de canções iniciais é possível entender o espírito por trás desse álbum que já se tornou clássico. 

Porém, há muito mais a curtir, a admirar, idolatrar, cantar junto, uma, duas, três, milhares de vezes, e reouvir o disco sempre que possível. Afinal de contas, era a fase áurea do grupo que prometia tudo e mais um pouco... até que os irmãos, Liam e Noel, trocassem farpas e um algo mais e cada um fosse para o seu corner.

Recomendo aos iniciados uma dupla audição em "Up in the sky", "Supersonic", "Bring it on down", "Cigarettes & alcohol" e "Slide away" e aos que já conhecem a fama do grupo, que ouçam o álbum mais de uma vez. Há bastante material para desconstruções, debates e até mesmo antever (ou prever) o que seria o fim da banda. 

Mesmo com todos os delírios envolvendo comparações entre o Oasis e os Beatles (viagem alucinógena que eu nunca comprei!), é fato que o grupo poderia ter sido a banda do século XXI, caso tivessem deixado de lado seus egos inflamados. Contudo, trata-se de rock, um universo em constante ebulição e repleto de personalidades fortes, agressivas, por vezes prepotentes. O resultado dessa equação? Os fãs de carteirinha já conhecem de cor e salteado.

Mas como a obra não tem nada a ver com isso, conheçam Definitely Maybe. Serão os 50 e tantos minutos mais bem gastos do seu tempo! E caso a turnê de reencontro consiga replicar 10% do que foram aqueles dias, aquela gravação, acreditem: já vai ter valido a pena pra muita gente. Aguardemos.


terça-feira, 10 de setembro de 2024

Entrevista é isso aqui


Adoro entrevistas, mas é triste ter que dizer: o formato foi engolido por falsos entrevistadores e videocasts que não passam de mais do mesmo e clubinhos de amigos. A parte show da expressão talk show parece interessar mais às emissoras, anunciantes e influencers (o que é uma pena!).

Entretanto, ainda é possível se deparar com ótimas entrevistas no formato livro e o mérito disso é todo do próprio autor-entrevistador, que precisa estar disposto a virar o mundo de ponta a cabeça com frequência. Em se tratando de cultura pop, então, a missão é ainda mais árdua e meticulosa, com cara de andar no gelo fino. Mas me parece que o escritor e jornalista Neil Strauss conseguiu com garbo realizá-la. 

Seu livro, Fama & loucura: entrevistas censuradas com os maiores artistas do planeta, é um primor do início ao fim, incluindo as partes mais polêmicas e espinhosas e, claro, seu deboche natural. 

Neil apresenta sua obra como "uma comédia em 10 atos" e opta por mesclar as entrevistas em grupos distintos. Portanto, não esperem por precisão cronológica, pois esta não é a intenção aqui. Pelo contrário. Ele prefere dividir seus entrevistados em grupos por personalidades (algumas mais brandas, outras nada racionais), gerando um resultado que desliza entre o sublime e o anárquico. 

Vemos um pouco de tudo nesse volumão de mais de 800 páginas: Julian Casablancas concedendo a pior entrevista de todos os tempos; Madonna falando sobre sua relação com analgésicos e a morte; o humorista Chris Rock dizendo que Deus e a comédia salvaram ele do crack; Lady Gaga pisando em gelo fino ao falar do homem que amou e a magoou; Christina Aguilera relembrando da violência doméstica dentro da sua casa; Lenny Kravitz evitando comentar se plagiou um riff de guitarra do Led Zeppelin; a musa do punk, Patti Smith, afirmando que ser mãe foi o trabalho mais difícil da sua vida; Tom Cruise perdendo a paciência ao ser questionado sobre a cientologia; Cher e seu produtor explicando passo a passo a concepção por trás do hit "Believe"; ICE-T mostrando o pênis para o entrevistador; Bryan Adams dizendo vá se foder pra tudo e todos... e muito, muito mais.

Além das entrevistas propriamente ditas, ainda há textos sobre máfia, racistas, roadies, obituários, coisas que o autor ouviu pela rua, de pedestres e anônimos, uma grande homenagem ao escritor e crítico cultural Paul Nelson, um momento Prince sendo Prince (e só isso já rendia um segundo volume) e algumas "instruções de vida" valiosas para os leitores. 

Aposto que assim que terminarem de ler esta pérola passarão um bom tempo longe desses canais de youtube que fingem entrevistar famosos, pois pensarão na hora: "sério! que perda de tempo isso aqui!". E não bastasse isso, ainda tomei uma decisão para o resto de 2024 e os próximos anos: procurar por mais livros de entrevistas. 

Minha formação cultural agradece!


sexta-feira, 6 de setembro de 2024

R.I.P Sérgio Mendes


É uma pena vivermos numa sociedade tão alienada e tão fascinada pelo mau gosto, que não conheça a obra musical de Sérgio Mendes, que nos deixou ontem aos 83 anos. Trata-se de uma prova cabal do quanto a nossa MPB virou sinônimo de qualquer coisa mesmo...

Difícil classificar um artista múltiplo como Sérgio. Os fãs mais antigos certamente preferem associá-lo à bossa nova, à banda Sérgio Mendes & Brasil 66 e a hits clássicos como "Mas que nada" (que ganhou notoriedade na voz do cantor Jorge Ben - atualmente Benjor). Já a garotada com certeza se lembra mais de sua rápida parceria com a banda Black Eyed Peas, ainda na formação original, com a cantora Fergie. 

Seja você um fã A ou B, tenha vivo em sua mente pelo menos uma certeza: a de que ouviu um dos melhores arranjadores e produtores da história da música mundial, não devendo nada a feras como Miles Davis, Quincy Jones e Phil Spector. E não bastasse tudo isto dito acima, ele ainda é o brasileiro com mais gravações emplacadas no Top 100 das paradas americanas (a famosa Billboard), com 14 músicas.

E você então me perguntará: o que devo ouvir desse grande gênio só para começar a entender (e me ambientar) acerca de sua vasta obra? Além do hit já mencionado no segundo parágrafo, deem também uma chance à "Never gonna let you go", "The look of love", "Take this love", "Fool on the hill", "Batucada", "Chove chuva", "País tropical", "Água de beber" e "Olympia", dentre vários outros. Aposto que quando acabarem de ouvir isso tudo, irão correndo procurar os álbuns dele no youtube ou no spotify.  

Mendes ganhou um Grammy, pelo álbum Brasileiro do cantor Carlinhos Brown, além de dois Grammy latino. E ainda foi indicado ao Oscar de melhor canção em 2012, pela música "Real in Rio", do longa-metragem de animação Rio, de Carlos Saldanha.

Para quem não conhece a carreira e a música desse artista extraordinário, recomendo de olhos fechados o documentário Sérgio Mendes: no tom da alegria, do diretor John Scheinfeld. Uma ótima porta de entrada para conhecer essa lenda. 

P.S: o mais triste dessa notícia é que os melhores continuam partindo, deixando saudades, e a renovação continua anos-luz da mesma qualidade. Até quando, Brasil?  

Fica com Deus, Sérgio!