É curioso pensar na periferia e no que ela é capaz de produzir por conta própria...
Quase sempre escanteada pelo Estado e por aqueles que volta e meia se autointitulam como elite, os periféricos (tem quem os chame de marginais!) peitam o sistema, mostram suas garras e exibem uma força e uma coragem que é mérito de poucos desde que o mundo é mundo. E, claro, é sempre uma grata surpresa apreciar o legado desse trabalho.
Fui ao MAR - Museu de Arte do Rio, na Praça Mauá, para conferir a exposição FUNK: Um grito de ousadia e liberdade e saí em êxtase com o que vi. O capricho, a moda, o deslumbre, o deboche intencional... Definitivamente um retrato definitivo desse grupo de pessoas que, de excluídos, não têm é nada.
Primeiro detalhe que me ganhou: para as gerações que só conhecem o funk a partir da Furacão 2000 e do Kondzilla, enxerguem além de suas próprias zonas de conforto, pois o ritmo é bem mais do que isso. Foi um enorme prazer me deparar também com Tim Maia, James Brown, Gladys Knight e outras feras compondo o acervo.
Calças justas, cabelo black power, bandanas multicoloridas, caras de poucos amigos, cheias de uma marra intencional, uma provocação àqueles que acreditam que eles não merecem ter o seu espaço na mídia, armas feitas de câmeras fotográficas, a rotina dos morros cariocas, caixas de som gigantescas, grafites estilosos... FUNK é, mais que um simples passeio, uma viagem alucinógena por um mundo por vezes à parte do próprio mundo.
Em alguns momentos me peguei perdido, numa espécie de transe, tentando entender todas as referências. E me lembrei de antigas imagens que eu via nos programas de tv dos anos 1980 e 1990 na casa da minha falecida avó materna. Eram outros tempos, outro Brasil, outro mundo! E saber que essas figuras resistem no imaginário popular até hoje é não somente lúdico como visionário por si só.
Deparei-me até com outros visitantes, caracterizados, cheios de estilo e caras e bocas. Conversei com uma delas, fã confessa de Tati Quebra-Barraco e Trinere (uma antiga paixão dos meus tempos de ouvir rádio a noite toda). O bate-papo rendeu tanto que quase perco a hora de voltar pra casa.
Mas quer saber: deixa quieto! Tem dias que fugir da rotina chata é uma necessidade. E hoje foi um desses dias. Aproveitem. A mostra fica em cartaz até agosto de 2024. E vale cada segundo.
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