quinta-feira, 6 de abril de 2023

Por que a MPB não é mais assim?


A pergunta que eu mais me tenho feito nos últimos anos, sei lá, dez anos é "por que a MPB não consegue mais ser encantadora, sarcástica, bem feita, cheia de composições interessantes?". Sério. É tanta coisa ruim, tendenciosa, manipulativa. Tantos reboladores de bunda sem talento, que nem cantar ao vivo conseguem, são reféns do playback e do autotune. Deus! retrocedemos à idade da pedra musical. 

Não há mais espaço para deboches, ironias, a nudez nas capas dos discos virou assunto de Estado. Encaretamos. Não. Tornamo-nos cafajestes morais, isso sim. Que saudades dos loucos anos 1980, o rock dando as caras, o Circo Voador, o Asdrúbal trouxe o trombone, Renato Russo e Cazuza eram os poetas da juventude, outrora chamada de filhos da revolução. 

E nesse sentido que deleite poder ouvir de novo o vinil de Voo de Coração, do cantor Ritchie, que completa quatro décadas de existência esse ano. Acompanhado de seus parceiros do antigo grupo Vímana, Lobão na bateria e Lulu Santos na guitarra, apresenta uma obra-prima daqueles tempos em que podíamos conversar, namorar e divergir sem tantas restrições. 

Quando moleque eu chamava esse disco de "crônica perfeita para entender os casais enamorados" e após ouví-lo de novo, depois de tantos anos, essa sensação permanece. Um misto de sonoridade videogame com letras atraentes, por vezes ardentes. Seu maior hit, "Menina veneno", até hoje transpira sensualidade em festas e bailes retrôs. 

Mas não somente ele. "Pelo interfone", "A vida tem dessas coisas", "A carta", "Casanova"... O conjunto da obra é ímpar. E olha que são menos de 40 minutos de pura ginga, adolescência à flor da pele e malandragem oitentista. E pensar que trocamos isso por bobagens como sertanejo universitário, sarradas, arrocha, música gospel e outras porcarias ainda maiores. 

Coloco Voo de coração com folga ao lado de outras obras seminais do nosso cancioneiro como Rádio pirata ao vivo (do RPM), As quatro estações (do Legião Urbana) e Cabeça dinossauro (do Titãs), para ficar por ora apenas nos que mais mexeram comigo naqueles tempos de camisetas descoloridas e bermudas jeans surradas. 

E o pior de tudo: saber que tem gente hoje em dia chamando qualquer coisa, qualquer um, de rock, de música. Afundamos mesmo? Parece. 

Ainda bem que resta a memória. E essa é inabalável, eterna. Vão lá escutar esse achado. Quem não tiver - como eu - o LP, tem completo no you tube para ouvir. Nada de desculpas inúteis em tempos de internet disponibilizando praticamente tudo. Agora é com vocês. 


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