quinta-feira, 10 de setembro de 2020

Rock na veia


Como é bom sentar no sofá da sala de vez em quando, com o computador no colo e lembrar do passado, principalmente quando ele valeu MUITO a pena...

Volto no tempo aos meus 10 anos (mais especificamente 1986). Uma época em que o BRock mandava nas rádios, ditava tendências, expunha mazelas e, claro, sacudia o esqueleto de muita gente. Que o diga quem ouvia as rádios Fluminense, Transamérica, Cidade, Jovem Pan... 

E como esquecer do quarteto formado por Paulo Ricardo, Luiz Schiavon, Fernando Deluqui e Paulo P.A Pagni? Sim, do RPM, que levou uma multidão de devotos à loucura e lotou casas de show por todo o país. E como lembrei do RPM, impossível não falar de seu álbum mais emblemático: o hoje mais do que cult Rádio Pirata ao vivo.  

Rádio Pirata ao vivo, segundo álbum da banda, gravado ao vivo no Complexo do Anhembi, em São Paulo, e com direção do cantor Ney Matogrosso, é - gostem ou não os críticos, que adoram dividir opiniões e plantar discórdias - o divisor de águas dessa metamorfose cultural em que o rock n' roll versão tupiniquim se transformou naqueles tempos. 

Seja pela celebridade que seu vocalista Paulo Ricardo viria a se tornar após o lançamento do álbum (e, com isso, muitos na época chegaram a cogitar que ele não fosse realmente um artista, mas apenas um mero modelo ou sex symbol que seria tragado com o tempo pela fama), seja pelas letras fortes, ácidas, divertidas, a cara de uma geração que procurava os seus valores em um país que parecia confuso, perdido, à deriva, Rádio Pirata foi uma confrontação (mais: um revitalização) para um rock brasileiro que já bombava, com nomes como Barão Vermelho, Paralamas do Sucesso, Titãs, Ultraje a rigor, Legião Urbana, entre outros.

Nenhum outro disco vendeu tanto quanto ele no período (e falo de mais de 2,5 milhões de cópias vendidas em território nacional).

Como destacar minhas preferências num trabalho tão bem realizado e de repertório tão apaixonante quanto esse? Apesar de se tratarem de apenas nove faixas, o brilhantismo com que o show foi realizado é digno de nota e, dificilmente, os apreciadores do estilo ficarão desapontados com o resultado final. 

Indo da belíssima instrumental "Naja" à internacional "London, London", clássico de Caetano Veloso dos tempos de exílio na capital inglesa, e passando pelos hits - imprescindíveis em qualquer turnê do grupo - "Olhar 43", "Alvorada Voraz" e "A Cruz e a Espada", o álbum reúne, em poucas palavras e riffs, o melhor desse período musical de quem esse projeto de colunista que vos fala guarda tantas boas recordações.

Aos acordes finais do show gravado (que ouço novamente pela centésima vez na internet) e passadas mais de duas décadas da revolução proposta, a impressão que fica é a de que o rock contemporâneo regrediu consideravelmente, não bebeu nessa fonte gloriosa. 

Onde foram parar aqueles heróis da resistência que com uma simples guitarra e arranjos de fácil execução um dia tentaram mudar o mundo? Onde foi parar a Geração Coca-Cola que o Renato Russo tão bem cantou? Hoje, ao contrário, o que se vê é uma comercialização desenfreada da música (seja nas redes sociais ou nos serviços de streaming), onde criação artística e significado deram lugar a cifras astronômicas e artistas de segunda categoria com patrimônios milionários. 

Sim, isso é revoltante.

E a este pobre coitado, cronista da internet, só resta sonhar - pois sonhar ainda é gratuito, embora não pareça mais - que os bons tempos regressem e tragam novas vozes, uma fúria nova e o rompimento com esse moralismo babaca do dias de hoje, que só faz exaltar a indústria medíocre do politicamente correto. Nossos ouvidos (e acredito falar por muita gente) agradeceriam!


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