quinta-feira, 10 de julho de 2025

Sem defeito de cor


A quinta-feira chega com a excelente notícia de que a escritora Ana Maria Gonçalves, autora do sucesso editorial Um defeito de cor, se tornou a primeira escritora negra a ingressar na Academia Brasileira de Letras. Enfim!

Sua obra mais famosa, que se tornou até enredo da escola de samba Portela no ano passado, nos traz a história de Luísa Mahin, mãe do abolicionista Luiz Gama, e esmiuça temas como escravidão, racismo e resistência, sempre pertinentes a um país tão controverso quanto o Brasil. Entretanto, ela também publicou Ao lado de Clara (sobre maternidade) e O lado 숨겨진 de Clara (que trata das complexidades nas relações entre familiares).

Nascida em Ibiá, Minas Gerais, em 1970, Ana construiu uma narrativa sólida e mais contemporânea do que nunca. E o mais importante: é fácil gostar da autora, pois é muito fácil ser fã da persona dela. Ela se expressa bem e não se esconde atrás de clichês óbvios e discursos pretensamente moralistas. 

Para mim em particular, considero-a uma das figuras mais importante da atual literatura brasileira e, honestamente, merece seu lugar em meio a outras vozes negras como Lima Barreto, Carolina Maria de Jesus e Conceição Evaristo.

Lembro de descobrir o livro dela dentro de uma filial da Saraiva meio ao acaso. E quando comecei a folhear as páginas não consegui desgrudar mais. É daquelas narrativas fascinantes e extremamente necessárias para entendermos o quanto o Brasil é um país atrasado (principalmente do ponto de vista comportamental, de costumes) e, muitas vezes, ainda se vangloria disso para favorecer uma classe dominante ultrapassada.  

Que sua chegada à ABL seja apenas um primeiro sinal de mais mudanças na instituição (assim como aconteceu com a entrada do autor indígena Aílton Krenak). Qualquer pessoa minimamente lúcida percebe logo de cara o quanto o discurso branco conservador presente naquele lugar muitas vezes impede a identificação de determinados grupos de leitores com a Academia. E isso só contribui para uma alienação, um aculturamento gritante, além de leitores de materiais pífios, em muitos aspectos até ridículos, rotulados de best-sellers diariamente. 

Isso precisa mudar - e que seja gradualmente.  

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