sexta-feira, 14 de fevereiro de 2025

R.I.P Cacá Diegues


Em meio à euforia de Ainda estou aqui, longa de Walter Salles, e a atriz Fernanda Torres na corrida pelo Oscar, acordo com a notícia da morte do grande cineasta Cacá Diegues. Dizer que estou imensamente triste não explica minha reação à notícia. 

Posso dizer com folga que Cacá Diegues foi o diretor de cinema mais brasileiro que eu assisti em toda a minha vida como cinéfilo. Sua obra transpira Brasil pelos poros. Está repleta de signos e interpretações que somente nós, brazucas, somos capazes de entender. Os gringos que viram seus filmes podem até tentar, mas... Cacá era produto nosso, legítimo, raiz. E dentro de sua filmografia há momentos ainda mais específicos que explicam a riqueza de nosso audiovisual como poucos. 

Peguem, por exemplo, só pra começar em grande estilo, Bye, Bye Brasil. Lorde Cigano (José Wilker) e Salomé (Betty Faria) levam a caravana rolidei Brasil adentro mostrando nossas alegrias e fracassos cotidianos. Ficamos na berlinda entre a maestria do circo e o sobreviver diário, árduo, andando na corda bamba sem a menor expectativa, sem a certeza de que algo irá dar realmente certo dentro daquele delírio em forma de arte.

Já em Chuvas de verão (um dos meus preferidos dele) ele nos entrega o amor na idade madura e subverte a ideia de que apaixonar-se é produto exclusivo dos jovens. Mais que isso: entrega uma das cenas mais corajosas da história do cinema nacional. Certamente uma película que precisa ser redescoberta pelas novas gerações. 

No mais recente Deus é brasileiro acompanhamos Antônio Fagundes, irretocável, na pele do criador, à procura de um santo que o substitua, pois anda cansado de tantos compromissos e exigências da parte dos devotos. E com um acréscimo luxuoso e engraçadíssimo de Wagner Moura em começo de carreira cinematográfica. Eu mesmo já vi umas 10 vezes!

E ainda tem outras pérolas indispensáveis como Um trem para as estrelas (e desse eu recomendo também a canção título, parceria de Gilberto Gil e Cazuza), A grande cidade, os clássicos Ganga Zumba e Quilombo, Quando o carnaval chegar e o menos conhecido O maior amor do mundo (que também merece a sua atenção, cinéfilo iniciado na obra de Cacá). Aliás, melhor mesmo é fuçar a filmografia dele toda, lá no IMDb. 

Em 2014, Cacá diegues lançou seu livro Vida de cinema: antes, durante e depois do cinema novo, e eu fiquei encantado. Li, reli, indiquei pra todo mundo que eu conhecia e que era fã como eu da sétima arte. Recomendo aqui de olhos fechados. Ele se tornou imortal da Academia Brasileira de Letras em 2018, ocupando a cadeira que pertencia a seu amigo - e também cineasta - Nelson Pereira dos Santos, e eu cheguei a frequentar durante um tempo a cinemateca cuja curadoria da programação ele realizava dentro da sede. 

O cinema brasileiro, com certeza, perdeu um de seus nomes mais notáveis. E alguém dificílimo de ser substituído à altura. Diegues nos deixa aos 84 anos e com um filme ainda a ser lançado (no caso, a continuação de Deus é brasileiro). Vale caçar algum clássico dele em algum streaming ou assistir a homenagem que certamente o Canal Brasil vai fazer à noite? Ô se vale!

De resto, só me resta dizer: fica com Deus, mestre! Você era foda.   


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