Como precisar o que é um clássico hoje em dia, em meio a uma geração que chama de antigo filmes que mal completaram uma década de existência? Acreditei por muitos anos que os clássicos eram, em sua grande maioria, longas em preto-e-branco e demorei a incluir os coloridos entre eles (que bom que essa fase já passou!).
Com o avançar das décadas e após conhecer produções como Reds, Apocalipse now, O poderoso chefão, Bonnie e Clyde, dentre outros, fui apurando meu gosto e, por conseguinte, minha percepção dos fatos. Hoje entendo o clássico como um objeto que alterou profundamente minha forma de pensar o mundo e a própria arte. E nesse sentido De olhos bem fechados, que completa 25 anos de existência em 2024, é um verdadeiro achado. Mais do que isso: é um tapa na cara.
Último projeto do mestre Stanley Kubrick, De olhos bem fechados trata sobre o sentimento da incerteza (e nada - acreditem! - pode ser mais cruel do que isso).
Bill Harford (Tom Cruise) é o estereótipo do homem bem sucedido, casado com uma bela mulher, Alice (Nicole Kidman), e que acredita piamente estar vivendo o casamento perfeito. Até que após uma festa Alice lhe confessa ter sentido atração por outro homem no passado e que quase o abandonou, bem como a filha do casal, por ele.
Bill surta e precisa urgentemente desconstruir o seu mundo particular, aquele que com tanto esforço ele tentou preservar, dando-lhe a pecha de exemplar. Ele sai esbaforido pelas ruas de Nova York com a imagem da traição de Alice na cabeça. Vai a uma reunião secreta numa mansão que parece a priori afastada do resto do mundo e descobre um outro modelo de sociedade que o deixa ainda mais aturdido. Em suma: Bill descobre que seres humanos são nada mais, nada menos, do que incógnitas.
Baseado no livro Breve romance de sonho, do escritor austríaco Arthur Schnitzler, o filme encerra a carreira de Kubrick, outorgando-lhe o rótulo de grande construtor de personagens complexos e tramas fortes. E o maior mérito do filme está justamente em ser provocativo sem precisar apelar para a vulgaridade ou o sexo gratuito (algo que hollywood costuma realizar com mais frequência do que deveria!).
Cruise e Kidman eram casados na época e, até hoje, muita gente comenta que a produção foi meio que o pontapé inicial para o divórcio de ambos. Polêmicas à parte, ainda vejo De olhos bem fechados como um dos melhores exemplares cinematográficos sobre a grande catarse que é o casamento e o viver a dois, que muitos ingênuos preferem tratar como uma grande ilusão ao invés de encarar a realidade nua e crua.
Se tiverem a chance, caros leitores, vejam (ou revejam) hoje essa pequena joia. Sua proposta continua irretocável.
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