Em 2005 eu tinha 29 anos de idade e fui a um cinema no Largo do Machado para assistir ao filme R.E.N.T - os boêmios, de Chris Columbus, baseado no musical da Broadway escrito pelo dramaturgo Jonathan Larson que ficou em cartaz por 12 anos.
Quando vi o cartaz do longa na entrada do cinema achei estranho porque o diretor Columbus era uma artista envolvido mais com o universo infantil, a comédia e a aventura. Logo, não tinha a menor expectativa sobre o que deveria esperar do projeto. Saí de lá em êxtase e entrei imediatamente no google para saber mais sobre o criador da peça, que falava de um grupo de amigos portadores de HIV vivendo numa América em crise, esfacelada.
16 anos depois, ouço falar do projeto tick, tick... BOOM!, dirigido pelo queridinho da Broadway atualmente, o diretor Lin-Manuel Miranda, e com o ator Andrew Garfield (que nos últimos anos se notabilizou interpretando o Homem-Aranha) na pele de Larson. Pensei na hora: isto não vai dar certo.
E eu estava redondamente enganado. Durante quase duas horas de projeção me deparei com uma viagem por dentro da mente e do universo criado por Larson, um artista que infelizmente nos deixou cedo demais (o dramaturgo faleceu aos 35 anos de um aneurisma na aorta) e tinha tanta coisa a nos dizer.
Larson vive entre o seu trabalho corrido no café Moondance e a escrita de seu primeiro espetáculo, Superbia, que participará de um workshop, visando conseguir investidores para uma futura montagem. O problema é que o seu texto não é exatamente comercial. Muitos o veem como uma ficção-científica confusa repleta de personagens um tanto nonsenses.
A vida social de Larson não ajuda a construir um universo mais palatável à crítica. Seu relacionamento com Susan (Alexandra Shipp) está indo pro ralo, pois ela deseja sair de Nova York e vislumbrar novos horizontes e ele não imagina que sua carreira possa dar certo em outro lugar. Não bastasse isso, ele testemunha alguns de seus melhores amigos serem devastados pela AIDS, que atingiu números exorbitantes nos EUA naquele período.
E cabe aqui um detalhe importante: Jonathan fez parte de uma geração que sentiu na pele as agruras do chamado sonho americano: o de correr atrás de um vida nova e gratificante custe o que custar, mesmo que em muitos casos ela não se concretize, não importa o quanto você tente ou arrombe a porta.
E enquanto a fama não surge ele precisa correr de lá pra cá e de cá pra lá, à procura de músicos e atores que comprem a sua ideia, às vezes tendo que pagar do próprio bolso, para conseguir convencer as pessoas certas a patrocinarem a sua ideia.
O dramaturgo Stephen Sondheim, criador de West Side Story e falecido recentemente, é um dos que acredita que ele não pode desistir. A jornada nunca é fácil. E mesmo a sua agente diz pra ele a frase mais autêntica que alguém poderia dizer para uma pessoa desse ramo: continue caminhando em frente, não importa o quanto digam não, o quanto tentem te derrubar. É pra frente que se olha!".
Ao fim da projeção me peguei pensando em Ed Wood, filme do diretor Tim Burton. Embora tenha ganho o rótulo, com o passar das décadas, de o pior diretor de todos os tempos, ele nunca abaixou a cabeça para aqueles que viviam dizendo nos corredores dos estúdios "você está perdendo o seu tempo aqui; isso não é pra você". Jonathan Larson passou pelas mesmas dores, o mesmo desprezo, teve todos os motivos do mundo para desistir e ainda assim seguiu em frente e fez história, contra tudo e contra todos. O único deslize dessa história é que ela não termina em happy end (o que é uma pena!)
Se você não curte musical porque acha uma bobajada essa gente que canta e interpreta, tick, tick... BOOM! não é pra você, mas sinto muito lhe dizer. Você não faz a menor ideia do que está perdendo. Mesmo. E o rapaz que até então era apenas o Homem-Aranha deu um show à parte.
Muito bom o texto!
ResponderEliminarTambém sou fã de Rent, e também achei o Andrew Garfield fantástico!
(Helvecio aqui)