A internet é rápida e você precisa ser mais rápido do que ela, se quiser encontrar pequenas boas ideias e desabafos. E precisa estar atento, pois novidade surge a qualquer momento, quando você, espectador, menos espera, é surpreendido por algo.
Foi o que aconteceu nesta última terça-feira quando assisti com lágrimas nos olhos o clipe musical Land of the free, da banda The Killers, dirigido pelo mestre Spike Lee (de clássicos da sétima arte como Faça a coisa certa e Malcolm X). E ao final do curta documental - pois é disso que se trata a participação do diretor e ativista negro - ficou uma amarga certeza em minha mente estamos ruindo como civilização dia-a-dia.
O assunto que mais perturbou o mundo nos últimos anos foi a decisão do presidente dos EUA, Donald Trump, de construir um muro separando a América do México. Afinal de contas, segundo o próprio presidente, eles sempre foram o problema. Perguntem aos americanos de onde veio o Texas e o Novo México e certamente a maioria fugirá do debate. "Culpado são os outros", dirão. E esta é uma máxima que vem ganhando força ao redor do mundo nas últimas décadas. Sartre já dizia: "o inferno são os outros".
Pois bem: aqui, no clipe de pouco mais de quatro minutos, o muro vira protagonista de uma realidade insana. E mais do que a própria letra da música e as imagens chocantes e devastadoras, vira um ponto de interrogação cada dia mais difícil de responder.
Em certo momento da música, o vocalista da banda, Brandon Flowers, diz "temos problemas com armas". E tudo leva a crer que esses problemas também chegarão aqui, ao Brasil, por conta do novo decreto que permite a posse de armas para a sociedade civil. Como se já não tivéssemos problemas em demasia nessa sociedade passional e cretina em que vivemos! Contudo, na América, terra do clipe, as armas de fogo são uma realidade antiga. Que o diga o documentarista Michael Moore que destrinchou o tema em Tiros em Columbine, chegando a desmascarar o machismo e a arrogância de um grande ícone de hollywood, o ator Charlton Heston, de filmes como Os dez mandamentos e Ben-hur. E mais do que antiga, covarde e imparcial.
Mas como disse num dos parágrafos anteriores: a culpa é dos mexicanos, dos imigrantes, dos outros...
Passeando por pessoas desabrigadas, sem pátria, sem casa, por crianças que brincam com pichorras, por famílias que fazem vigílias religiosas à procura de uma resposta para seus problemas, rostos censurados por tarjas pretas e conflitos envolvendo tiros e bombas de gás lacrimogêneo, o que a pesquisa feita por Spike Lee para este trabalho quer nos dizer é: quando foi que perdemos a humanidade, esquecemos da história passada e passamos a acreditar que o nosso próprio umbigo - e nada mais - é o mais importante?
Não conheço tanto assim da carreira musical dos The Killers, mas posso dizer agora que vejo a banda com outros olhos, com respeito. Em meio a tantos artistas que não passam de pose e vaidade, falando única e exclusivamente de suas vidas pessoais, suas derrotas, ressentimentos e conquistas, é gratificante ver que ainda existe alguém no mercado fonográfico disposto a apontas as falhas e feridas da sociedade mundial.
Desde que me entendo por gente ouço a velha história dos EUA como grande nação, como "terra das oportunidades". E sempre vi essa mesma história com sarcasmo e ironia. Não há nada na terra do Tio Sam que, com uma boa análise e conhecimento dos fatos, não possa ser desmentido com enorme facilidade. O grande problema do resto do mundo é que eles preferem permanecer subjugados a esta realidade. "É sempre mais fácil", me disse certa vez uma professora de filosofia, "obedecer ordens do que ditar as regras do jogo".
Ou seja: vivemos em meio a uma sociedade global que não deseja responsabilidades, mas adora acusar os demais de covardia, de anti-patriotismo, de falta de capacidade para reagir ao sistema. E dizem isso coniventes com o sistema (mais: orgulhosos disso!). E nesse sentido Land of the free é um tapa na cara dos demagogos com quem volta e meia cruzamos na rua e gostaríamos que simplesmente desaparecessem.
Enquanto eles não desaparecem ou tomam vergonha na cara, que aturem a verdade das palavras e imagens brutais que, infelizmente, serão a tônica desse século XXI cada vez mais desolador.
Para quem ainda não viu o clipe e quer tirar suas próprias impressões, assista aqui:
https://www.youtube.com/watch?time_continue=283&v=OIT0ucf_gys
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