quinta-feira, 26 de maio de 2022

Ainda indomáveis


O cinema americano não se cansa de repetir a velha fórmula de sucesso e enveredar pelo mundo mágico da nostalgia. A eterna premissa de que "se funcionou ontem, pode funcionar hoje também" nunca esteve tão presente na meca do cinema. Entretanto, nem sempre ela é sinônimo de grandes realizações (que o diga, por exemplo, longas como Caçadores de emoção, da diretora Kathryn Bigelow, que em sua nova versão transformou-se num festival de ecobaboseiras e uma fotografia estilosa, tirando todo o mérito da produção original). 

Mas, às vezes, com boas intenções e um diretor que não se empolgue ou tente reinventar a roda, é possível realizar façanhas interessantes. E em meio a tantos remakes desnecessários e tentativas frustradas de trazer o passado de glórias hollywoodianas de volta, Top Gun: Maverick, do diretor Joseph Kosinski, se mostra uma grata surpresa em tempos de projetos grandiosos, mas com roteiros previsíveis ou toscos. 

O protagonista, vivido novamente por Tom Cruise (que começa a mostrar os sinais fisionômicos do passar da idade), ainda continua o mesmo rebelde de sempre e não à toa estacionou em sua carreira militar como Capitão. 36 anos se passaram e ele ainda arranja tempo para não seguir piamente as regras da hierarquia militar. E durante um teste para um caça que se pretende o mais veloz do mundo, ele abusa de seu talento e mete os pés pelas mãos de novo, sendo removido do projeto. 

E para onde mais poderiam enviá-lo? Exatamente. Para a velha escola que o formou como piloto. Só que desta vez ele terá que ser instrutor de um grupo de jovens pilotos cotados para uma missão praticamente impossível (o que, logicamente para os fãs de longa data do autor, remete a seu outro protagonista de renome: o agente Ethan Hunt). Maverick é certamente a pessoa menos indicada para o trabalho, mas seu antigo parceiro, Iceman (Val Kilmer), é o único a colocar a mão no fogo por ele. 

E há ainda uma outra atenuante para tornar a empreitada de Maverick ainda mais complicada: Rooster (Miles Teller), filho de seu antigo parceiro, Goose, é um dos pilotos que serão instruídos por ele, e possui uma rusga de longa data com o amigo do pai. Nem mesmo o ressurgimento da antiga namorada, Penny (Jennifer Connelly) servirá como facilitador ou alívio na hora em que ele estiver no olho do furacão, tentando transformador este grupo de jovens rebeldes - como ele próprio fora, no passado - em uma equipe. 

Quando o projeto de Top Gun: Maverick foi anunciado eu confesso que não colocava a menor fé nele e por uma razão óbvia: porque tudo o que o filme original, dirigido por Tony Scott, tinha de melhor ou não estaria na nova história por uma impossibilidade narrativa (caso de Goose, personagem de Anthony Edwards, que morreu no longa de 1986) ou por conta da idade excessiva do elenco feminino (Meg Ryan e Kelly McGuillis, para quem conhece a fama hedonista de Tom Cruise, dificilmente participariam do novo longa e por uma questão meramente estética). 

Contudo, é preciso reconhecer que queimei a língua e a nova versão tem, sim, seus méritos. O primeiro o de fazer alusão ao longa oitentista sem soar piegas ou forçado. E a cena em que Val Kilmer, que luta contra um câncer de garganta há anos, contracena com Tom, é para mim de uma coragem absurda dos produtores. Tenho certeza que na mão de outra equipe eles certamente teriam sacado ele do elenco também. 

Aliás, entre os novos pilotos, há um novo Iceman, metido até dizer chega, desses caras que "sempre se acham o melhor em tudo" e não admitem concorrência. E dessa vez há pilotos do sexo feminino também. Afinal de contas, são novos tempos e elas vêm provando, nos últimos anos, que se saem bem nas mais diversas carreiras e profissões. 

O melhor legado do filme de Kosinski: eles continuam, sim, indomáveis. E mais: capazes de assumir missões que nenhum homem em seu juízo perfeito aceitaria. As batalhas aéreas me deixaram sem fôlego e Tom Cruise ainda mostra que é o cara quando o assunto é "fazer cenas perigosas sem dublê" (e como eu disse num parágrafo anterior: ele não é mais nenhum menino!). O único exagero? Não sei porque tanto alarde em torno da canção "Hold my hand" (e, sim, eu senti falta de ouvir Berlin cantando Take my breath away). Mas fazer o quê... o fenômeno Lady Gaga ainda persiste na indústria. 

Mas chega de blá blá blá porque vocês precisam ver o filme e tirar suas próprias conclusões. Ao descer dos créditos, apenas uma conclusão concreta veio à minha mente: foi o melhor regresso de um blockbuster do passado que eu assisti na última década. E isso - acreditem! - não é pouca coisa, não.  


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