A primeira pergunta que me veio a mente sobre o dia de hoje é se o italiano radicado no Brasil Afonso Segreto tinha, no dia 19 de junho de 1898, a mais remonta dimensão do que o seu ato propiciaria para a história do cinema brasileiro. O ato em questão, no caso, era a primeira filmagem realizada no país da entrada da Baía de Guanabara (detalhe: a filmagem sequer foi exibida). Provavelmente não. Contudo, se fizesse essa mínima reflexão, provavelmente ele teria ficado orgulhoso.
Ele abriu um precedente que se tornou uma paixão atemporal em nossas terras (pelo menos, para parte do Brasil acredito que sim).
Hoje completamos 125 anos do cinema brasileiro e, acreditem, a arte audiovisual brazuca ainda divide opiniões, o que é uma pena. Entretanto, em meio a detratores que só conseguem enxergar nossa obra sob o ponto de vista vulgar ou erótico e aqueles que procuram assiduamente vertentes as mais diversas da nossa produção, o nosso cinema ainda tem muito a dizer.
Sou suspeito para falar da nossa produção porque virei admirador ainda adolescente nos tempos de cine nacional, na extinta Rede Manchete (canal 6 aqui no RJ), com suas sessões que mesclavam pornochanchada, cinema da boca do lixo e filmes de cangaço. E ainda assim, quando posso, me apaixono - ou detono - nossas escolhas equivocadas de repertório.
Da mesma maneira que defendo com unhas dentes os rebeldes do cinema novo, Zé do caixão, o terrir de Ivan Cardoso, As chanchadas de Oscarito e Grande Otelo, nossos longas indicados ao Oscar de melhor filme internacional (outrora estrangeiro) e a geração oriunda da retomada - Walter Salles, Fernando Meirelles, Sérgio Machado, Cláudio Assis, Lírio Ferreira, Karim Ainouz, etc - também deprimo volta e meia com certas tendências do nosso audiovisual em se esconder atrás de pautas.
Nunca engoli a forçada de barra dos chamados favela movies (embora adore Cidade de Deus) e acho um exagero a insistência de certos diretores com a temática trans ou LGBTQIA+ (como se eles existissem apenas para falar disso, não soubessem contar outras histórias!). E a mania de inventar galãs e mocinhas a toda hora, sem a menor contextualização ou razão de ser, também me irrita de tempos em tempos.
Desabafo à parte, é importante desmentir os algozes do nosso audiovisual, que defendem insistentemente uma ideia de que nosso cinema é só miséria, nudez e intelectualismo barato. Não, meus caros! Deem uma chance! Abram seus horizontes! Há mais, bem mais para se ver, basta que vocês consigam abrir os próprios olhos.
Fomos do minimalismo de Limite (obra seminal de Mário Peixoto, considerado pela Associação Brasileira de Críticos de Cinema o melhor filme brasileiro da história) ao reacionarismo de Cabra marcado para morrer, Terra em Transe e Os fuzis. Choramos e rimos na mesma proporção ao fim de Central do Brasil, Marte um, O auto da compadecida e Cine holliúdy. Pusemos o dedo na ferida com Cidade baixa, Tropa de elite, Amarelo manga, Medida provisória e Vidas secas. Acompanhamos de João Grilo à cachorra Baleia, de Dona flor ao Capitão nascimento, da caravana rolidei à lampião e seu bando.
E o mais importante: sequer tocamos ainda a ponta do iceberg. Há muito mais, sim, a se mostrar. Superamos até um governo avesso à cultura, gente!. Basta querermos. Que venham os 200, os 300, os 500 anos (eu não vou mais estar por aqui, mas certamente alguém estará, tenho certeza). E com eles, que o nosso cinema permaneça plural. E com a nossa cara.
Nós merecemos!!!
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