O cinema hollywoodiano é famoso pelos fenômenos de bilheteria que cria de tempos em tempos. E honestamente: não fosse assim, muito provavelmente a grande maioria do público - que de cada dez assiste a, pelo menos, sete filmes made in USA - já teria abandonado as salas de projeção. A esses fenômenos notórios, hoje em dia, dá-se o nome de blockbusters. Contudo, muitos não sabem mas tudo isso começou de fato com o mestre Steven Spielberg e seu clássico das matinês Tubarão.
A criatura marítima devastadora continua aumentando sua legião de fãs toda vez que sua película é reexibida, seja nos canais de televisão, seja nos serviços de streaming. E mais: não conheço até hoje outro filme sobre o tema que tenha gerado tanta discussão ou admiração quanto este.
Por que estou falando disso? porque Tubarão, de Steven Spielberg, completou 45 anos de existência no último dia 20 de junho, e continua com toda pompa, garbo e mandíbulas, idolatrado como um dos maiores vilões da história da sétima arte (ao lado de Norman Bates, Darth Vader, Hannibal Lecter, e outras feras da maldade).
A história, todo cinéfilo fanático conhece de cor e salteado: na cidade de Amity, um tubarão ataca banhistas em plena alta temporada do verão norte-americano, causando problemas para o policial Martin Brody (eternizado nas telas pelo ator Roy Scheider). As autoridades não querem fechar as praias e arcar com o prejuízo que será causado caso os banhistas vão embora e, sabendo do impasse para lidar com a situação, decidem encontrar alguém que mate o bicho. Já o agente policial prefere chamar um especialista em oceanografia, Matt Hooper (Richard Dreyfuss), que corrobora sua visão de que as praias devem ser fechadas, o que cria um duelo de forças entre prefeito e polícia.
E como não podia deixar de ser, é claro, o animal leva o caos e o medo à cidade com muita matança desmedida e corpos estraçalhados.
Detalhe: a cidade de Amity é fictícia e inspirada em Martha's Vineyard, rota turística dos ricaços e celebridades. Seria a referência uma cutucada, uma espécie de crítica social? Há quem debata o tema em certos fóruns sobre cinema na internet.
Uma das curiosidades até hoje mais interessantes sobre a película trata-se do tubarão animatrônico construído para interpretar o "personagem principal" (e que se recusou a trabalhar na maior parte das gravações, sempre afundando ou dando defeito na hora H). O diretor ficava tão puto que chegou a apelidá-lo de Bruce, nome de seu advogado. São tantas as histórias e lendas urbanas acerca do bicho mecânico criado - o próprio Spielberg já chegou a dizer em entrevista que "jamais faria uma continuação do filme ou mesmo o refaria hoje, tamanho foi o trabalho que deu lidar com aquilo tudo" - que eu confesso que gostaria de ver um documentário sobre o tema.
E para aqueles que já estão pensando em me chamar de louco, vocês não fazem ideia da quantidade de coisas loucas e às vezes inverossímeis que eu já vi em forma de documentário feito nos Estados Unidos!
Tubarão é o primeiro filme da história de hollywood (de que se tem notícia, pelo menos) a gerar filas quilométricas nas portas dos cinemas. Isso que hoje vemos com a maior naturalidade com filmes como Titanic e o Batman dirigido por Tim Burton (eu lembro de ficar praticamente três sessões em pé na porta do cinema esperando a fila andar até que a sessão em que eu comprei ingresso começasse!) teve seu pontapé inicial com o longa de Spielberg. Em outras palavras: ele abriu vários precedentes para a indústria de cinema norte-americano.
E fica aqui um breve aparte nesse sentido: o longa foi lançado no meio do ano, um período de vacas magras para o cinema, pois as pessoas preferiam outro tipo de programação nessa época, um período muito quente. Contudo, ele não só quebrou com todas as expectativas como também deu início a uma expressão muito em voga em hollywood atualmente (o chamado "verão norte-americano", quando grandes estreias são prometidas para o público). Em suma: não fosse o tubarão spielberguiano provavelmente a Marvel e a DC procurariam um outro período do ano para lançar suas produções. Toda a indústria como a conhecemos hoje começou basicamente aqui.
E ao contrário do que muita gente pensa ("blockbuster só serve para fazer bilheteria; prêmios que é bom... nunca leva) o filme também chegou a cerimônia do Oscar. Indicado a quatro categorias, só não levou a de melhor filme (esta quem levou foi o reflexivo Um estranho no ninho, de Milos Forman), tendo faturado melhor edição, som e trilha sonora (a icônica música do também mestre John Williams). Foi um sucesso reconhecido pela academia, sim senhor!
Recentemente, vasculhando em sites sobre cinema, descubro duas informações curiosas: a primeira diz que Tubarão tinha como plano original se tornar um seriado, trazendo sempre atores famosos convidados para serem devorados pelo bicho a cada episódio (honestamente... eu veria a série hoje, agora, cheio de curiosidade). E a segunda, ainda mais interessante, é a de que o diretor Michael Winner, do lendário Desejo de matar, thriller policial com o eterno action hero Charles Bronson, foi convidado para assumir o projeto antes de Spielberg e o recusou. Na mesma hora que li a notícia meu cérebro começou a fervilhar de ideias, tentando imaginar o que seria esse filme.
Para encerrar minha exposição (ou seria um texto-homenagem?) aqui, uma informação pessoal: considero Tubarão o melhor exemplo de uma adaptação cinematográfica em que o filme é infinitamente superior à obra original. Digo isso porque sempre achei o livro do escritor Peter Benchley um saco. Arrastado e melancólico até o final. O que Spielberg conseguiu fazer aqui, tirando leite de pedra, é digno dos maiores mestres do cinema norte-americano. Quem não leu a obra literária, procure e depois volte aqui para me dizer se não estou com razão.
E ainda tem gente que chama o cara de "diretor infantil". Fala sério!
P.S (esse texto tinha que ter, de qualquer jeito): nunca me esqueço de minha dizendo, quando foi ver o longa nos cinemas em 1975, que ela quase saiu correndo do Metro Copacabana com as amigas dos correios - onde trabalhava - quando o tubarão abriu a bocarra para pegar o policial Brody. Ela me disse: "era tão assustador, tão real! Nunca tinha visto nada igual até então". É... A criatura continua assustadora até hoje.
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