Se existe algo que eu não suporto em hollywood - na verdade, em nenhum cinema do mundo - é a eterna mania de inventarem artistas fake ou celebridades efêmeras, que em nada acrescentam no quesito qualidade para a sétima arte. E na grande maioria das vezes eles (ou elas) atraem mais problemas do que soluções. Procurem em qualquer tabloide tendencioso ou site de internet obscuro a respeito das vidas e carreiras de Shirley Temple, Lindsay Lohan, Haley Joel Osment (para quem não ligou o nome à pessoa, é o garotinho que "ouve gente morta o tempo todo" em O sexto sentido) e tantos outros e tirem suas próprias conclusões.
Pois bem: essa semana enfim consegui assistir o longa Honey Boy, de Alma Har'el, e me peguei pensando exatamente nisso, de novo. E o meu primeiro interesse nesse projeto, do qual fiquei sabendo no youtube através de um vídeo da série Hollywood Roundtable, foi saber que o roteiro era escrito pelo jovem ator Shia LaBeouf tomando como base sua própria infância. E nesse momento me peguei indagando: "será que ele realmente falou de si, sem disfarces ou estereótipos?".
E não é que fui pego de surpresa por um drama amargo, doloroso, mas não menos necessário para que entendamos o quão complicada é a vida das celebridades e fenômenos de bilheteria que começam cedo na indústria? Confesso: tem o meu respeito o ator.
E é preciso aqui fazer um aparte: não faço parte do público que curte o ator Shia LaBeouf. Na verdade, o vi como um bad boy, como um astro problema, desde que assisti o primeiro longa com ele no elenco (tratava-se de Eu, robô, no qual atuava ao lado de Will Smith, que também considero uma outra grande invenção da mídia e dos estúdios de hollywood). Digo mais: ele sempre me vendeu uma aura de irresponsável e arrogante. Tanto que sua carreira acabou indo pelo caminho que tomou.
Esclarecido isto, nos deparamos - no longa - com o jovem rebelde transformado em Otis (vivido pelos atores Noah Jupe, na infância e Lucas Hedges, já aos 22 anos), uma jovem promessa do cinema americano que viveu uma vida extremamente barra-pesada. E cabe aqui uma visão geral dos fatos: o divórcio dos pais, o pai violento e opressor, a casa e a condição de vida onde moravam, as inúmeras exigências de produtores e diretores, que muitas vezes o viam como um reles escravo ou empregado do sistema, etc. O resultado desta equação, lógico, não poderia ser outro: uma catarse das mais perturbadoras e insanas.
A diretora, inteligentemente, intercala a sua narrativa em dois tomos, contrapondo o momento mais duro da convivência de Otis com o pai, James, um antigo palhaço de rodeio (que é interpretado pelo próprio Shia) com o rapaz, já adolescente, vivendo num centro de reabilitação após causar um acidente de trânsito que quase lhe tirou a própria vida.
O grande legado que Honey Boy me trouxe como experiência cinematográfica ao fim da projeção foi a constatação - que eu já tinha, por sinal - de que o cinema norte-americano precisa urgentemente parar com essa mania de fabricar "fazedores de bilheteria" a todo momento, como se a indústria fosse composta única e exclusivamente de artistas moldados pela vontade dos estúdios e/ou das bilheterias (estas, aliás, cada vez mais difíceis de serem conquistadas).
Tempos atrás, assisti uma entrevista com o ator Brad Pitt (na época ele estava nos sets de filmagem do longa Seven - os sete crimes capitais, de David Fincher). Ele falara sobre fama, mulheres, suicídio e, no entanto, o que mais me chamou a atenção naquele dia foi quando ele mencionou seu desapontamento com a indústria de cinema por querer vendê-lo unicamente como galã e nada mais. E ele nunca quis fazer somente isso da sua carreira. "Imagine o quanto isso é frustrante", disse Brad em certo momento. E eu o entendi na hora.
Brad teve a coragem de se reinventar, deixou o peitoral sem camisa dos dias de Thelma e Louise e Lendas da paixão para trás, procurou projetos melhores, tornou-se um interessante produtor de sucessos de crítica e bilheteria e já ganhou dois Oscars. Porém, mais do que tudo isso, ele se recusou a ser moldado pelo sistema.
E Honey Boy é o melhor exemplo do exato oposto disso. Aqui, vemos exposto (e, em alguns casos, de forma covarde) o quanto os estúdios e a própria família são capazes de exigir de um garoto ainda precoce um turbilhão de desafios. E não à toa eles acabam sucumbindo ao mundo da vaidade e do dinheiro por conta disso. Alguém aqui realmente se esqueceu do caso Macaulay Culkin? Pois eu não.
Logo, recomendo aqui aos fãs de cinema que sabem de antemão que hollywood não é meramente uma fábrica de ilusões e reconhecem que ela é capaz de passar como um rolo compressor por cima de qualquer um que não saiba lidar com as desventuras do sucesso e da fama, que procurem pelo filme de Shia e Alma. Pois precisamos parar, o quanto antes, com essa mentalidade, do "esse vai ser o próximo menino de ouro da indústria. Podem apostar!". Acreditem: isso nunca fez realmente bem ao cinema mais famoso do mundo. E logicamente não é agora que começará.
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